Brasil cogita transportar forças do Caribe ao Haiti se missão da ONU sair do papel

BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – O governo brasileiro cogita auxiliar no transporte aéreo de policiais ofertados por países do Caribe para ajudar o Haiti, que vive uma nova onda de violência em meio a uma crise institucional, agravada pela renúncia do premiê Ariel Henry, há um mês.

Diante do cenário de incerteza, a diplomacia brasileira se viu obrigada a recalcular a proposta que havia feito para treinamento de agentes haitianos. A avaliação é a de que é impossível colocar essa ideia em prática, ainda que na Polícia Federal o plano já se desenrolasse.

Pesam diversos fatores. Enviar forças do Brasil a Porto Príncipe para conduzir essa preparação seria inviável dado o nível de violência, que poria em risco a integridade física dos agentes. Retirar esses policiais do país e trazê-los ao Brasil, em um momento em que a força já enfrenta altas taxas de deserção, tampouco é uma opção.

Um demonstrativo do grau de insegurança foi dado nesta quarta-feira (10), quando Brasília viabilizou a retirada de oito cidadãos, sendo sete deles brasileiros, do Haiti, por helicóptero, até a vizinha República Dominicana. Em sua maioria missionários religiosos, eles manifestaram vontade de abandonar o país.

Países como Antígua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Jamaica e Suriname já manifestaram intenção de ceder policiais para ajudarem a limitada Polícia Nacional Haitiana (cerca de 10 mil membros, numa conta superestimada) a combater as gangues armadas, reunidas em especial na coalizão intitulada G9, que domina Porto Príncipe.

A iniciativa dos caribenhos se deu após a aprovação em outubro passado, pelo Conselho de Segurança da ONU, de uma missão multinacional para ajudar o Haiti. Diferentemente da antiga Minustah, protagonizada pelo Brasil, o projeto não seria liderado diretamente pelas Nações Unidas, mas sim pelo Quênia, que se colocou à frente.

Passados seis meses do aval para a missão, nenhum policial foi enviado ao Haiti. A situação só piorou com a renúncia do impopular Henry.

O Quênia, que já enfrentava oposição de seu Supremo para enviar os policiais, disse que mantém sua oferta de liderança, mas que somente a colocará em prática quando houver algum governo provisório no Haiti com quem dialogar. Os demais países que haviam proposto enviar seus homens seguiram a mesma linha.

Com isso, a ajuda do Brasil para transporte dos policiais caribenhos teria um longo caminho para se concretizar. Além da necessidade de a missão da ONU começar de fato, haveria o alto custo da empreitada —há expectativa, mas não confirmação, de financiamento de países como os EUA— e o dilema de como fazer o pouso no Haiti.

Os aeroportos estão fechados, assim como os portos, pela violência das gangues. A logística para desembarcar agentes exigiria uma operação com participação militar —e tropas são justamente o que a maioria dos países, entre eles o Brasil, quer evitar no Haiti dado o histórico de missões que fracassaram ante os problemas crônicos.

Há também a pouca expectativa de os políticos haitianos entrarem em um acordo para um governo de transição convocar eleições e dialogar com parceiros externos.

Com mais de cem partidos, o país de 11 milhões de pessoas tem hoje um Conselho de Ministros formado após a indicação de diferentes forças políticas. No último dia 8, seus membros aprovaram a formação de um Conselho Presidencial de nove membros que até fevereiro de 2026 ocupará o poder. Eles devem agora nomear um novo primeiro-ministro e começar a pavimentar o caminho para novas eleições.

Enquanto isso, qualquer ajuda internacional continua estagnada.

Segundo o Binuh, o escritório da ONU no Haiti comandado pela equatoriana María Isabel Salvador, 1.600 policiais abandonaram seus postos e seu país para fugir da crise em 2023.

Só nos dois primeiros meses deste ano, mais de 680 pessoas não envolvidas em confrontos foram mortas em consequência direta da violência das gangues. Outras 380 foram sequestradas, uma prática comum dos grupos armados para ganhar dinheiro com extorsões.

Mesmo áreas antes consideradas relativamente seguras, onde uma pequena classe média alta se vale de vigilância privada, começam a sucumbir. É o caso de Pétionville, onde estão diversas embaixadas, entre elas a do Brasil. Nas últimas semanas, essa região registrou mais de uma dezena de mortos. Até o momento, diferentemente de outros serviços diplomáticos, Brasília não pretende retirar seu pessoal, composto por 4 brasileiros e 27 funcionários haitianos.

MAYARA PAIXÃO / Folhapress

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