NOVA YORK, EUA (FOLHAPRESS) – A lista final de convidados para a reunião que Celso Amorim, assessor internacional do presidente Lula (PT), está organizando com a China para discutir um processo de paz no Leste Europeu tem 19 países, todos do chamado Sul Global, termo não oficial para se referir a nações em desenvolvimento. Nem Rússia nem Ucrânia, as partes diretamente envolvidas na guerra, foram convidadas.
A reunião está prevista para a próxima sexta-feira (27), pouco depois da Assembleia-Geral da ONU em Nova York.
A Folha de S.Paulo teve acesso à lista, que tem duas categorias de países. A primeira reúne Estados que se engajaram mais de perto no processo e passaram a participar dos preparativos. São eles: África do Sul, Arábia Saudita, Egito e Indonésia. Os sauditas já se envolveram em negociações sobre a Guerra da Ucrânia no passado, enquanto o Egito tem expertise como mediador na guerra Israel-Hamas.
A partir dessa atuação conjunta, os organizadores chegaram a um grupo de países que, segundo eles, sinalizaram disposição de enviar um representante para o encontro em Nova York.
Aém do primeiro grupo, mais ativo, a lista final de convidados é composta por Emirados Árabes Unidos, Tailândia, Vietnã, Etiópia, Zâmbia, Nigéria, Senegal, Bolívia, Colômbia, México, Argélia, Cazaquistão, Malásia, Quênia e Azerbaijão.
A presença dos nomes na lista não significa necessariamente que esses países vão participar do encontro nem em qual nível -se representado por um ministro ou por um funcionário de escalão inferior. Mas mostra que os organizadores os consideram inclinados a apoiar a proposta sino-brasileira.
Um interlocutor ouvido pela reportagem sob anonimato ressaltou que alguns dos participantes tendem a enviar seus embaixadores na ONU, uma vez que seus chanceleres podem já ter deixado Nova York na data do encontro.
Como a Folha mostrou, Brasil e China estão organizando a reunião para divulgar a proposta conjunta de um plano de paz para Ucrânia e Rússia. O documento foi anunciado em maio, durante uma visita de Celso Amorim a Pequim, e assinado por ele e por Wang Yi, ministro das Relações Exteriores da China.
O plano consiste em seis pontos, entre os quais a realização de uma conferência internacional de paz “que seja reconhecida tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia, com participação igualitária de todas as partes relevantes”.
A proposta também engloba a rejeição ao uso de armas de destruição em massa e aos ataques contra usinas nucleares -e rechaça a “divisão do mundo em grupos políticos ou econômicos isolados”.
Os termos do documento, no entanto, foram rejeitados pelo presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski -que chamou a proposta de destrutiva- e por aliados de Kiev no Ocidente. Em linhas gerais, estes consideram que a abordagem sino-brasileira premia a Rússia e autorizaria o governo de Vladimir Putin a anexar territórios ocupados.
A posição de Lula sobre a guerra no Leste Europeu já foi alvo de críticas tanto da Ucrânia quanto de seus aliados ocidentais, Estados Unidos inclusos -de quem ele já cobrou que “parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz”, em referência ao envio de armas a Kiev.
Ainda quando era pré-candidato à Presidência, o brasileiro chegou a dizer que Zelenski era tão culpado quando Putin pela conflito. Já no cargo, Lula disse que o ucraniano “não pode ter tudo o que ele pensa que vai querer” e sugeriu que talvez Kiev tivesse de ceder território para chegar a um acordo com a Rússia.
Na quarta-feira (18), Lula conversou por telefone com Putin. De acordo com o Palácio do Planalto, ambos discutiram a proposta de paz. Não está claro o que o presidente russo diz sobre o plano, mas ele já defendeu publicamente que países como Brasil, China e Índia teriam condições de mediar o conflito no Leste Europeu -a Índia não consta na lista de convidados para o encontro em Nova York.
Amorim, ex-chanceler e principal conselheiro de Lula para temas internacionais, está pessoalmente envolvido na iniciativa. O presidente já não estará em Nova York no dia da reunião, de modo que Amorim deve conduzir o encontro ao lado chanceler chinês. O Brasil pode ser representado ainda pelo ministro Mauro Vieira, mas sua participação ainda não está confirmada.
Ao anunciar um plano conjunto com a China, na prática o governo Lula também marcou distância de uma conferência de paz realizada na Suíça em junho. Nos meses que antecederam o encontro, houve intensa pressão do lado suíço para que o Brasil participasse ao menos no nível de chanceler.
No final, Lula escalou apenas uma observadora para o encontro, a embaixadora do país na Suíça, Cláudia Fonseca Buzzi. O governo tampouco endossou a declaração final da conferência de paz.
RICARDO DELLA COLETTA / Folhapress