Brasil se abstém em votação sobre Venezuela no Conselho de Direitos Humanos da ONU

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou nesta sexta-feira (11) uma resolução que renova o mandato de uma missão de investigação de violações de direitos humanos na Venezuela por mais dois anos e dá continuidade à atuação do Alto-Comissariado de Direitos Humanos no país.

Havia um grande temor nos bastidores de que a missão não fosse renovada devido a algumas propostas de emendas ao texto da resolução. Uma delas, sugerida por Cuba, buscava incluir passagens condenando “medidas coercitivas unilaterais” contra o regime de Nicolás Maduro, o que faria com que países como Estados Unidos, que mantêm sanções contra Caracas, deixassem de apoiar o documento.

Ao final, porém, as propostas de emenda foram todas rechaçadas, e a resolução foi aprovada com 23 votos a favor, 6 contra e 18 abstenções —o Brasil foi um dos que se abstiveram.

O resultado espelha as posições nas nações que hoje compõem o Conselho quanto ao regime de Maduro. Entre os que votaram em apoio da resolução estavam, por exemplo, Costa Rica e Chile, que não só condenaram a falta de transparência das últimas eleições presidenciais na Venezuela como reconheceram como presidente eleito o candidato da oposição, Edmundo González.

Já aliados tradicionais do regime chavista e países sob a influência deles foram contra o documento: Argélia, China, Cuba, Eritreia, Vietnã e Sudão.

A decisão do Brasil de se abster também se alinha com a postura cautelosa que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem adotado em relação à ditadura, com que o petista tem laços históricos, apesar dos atritos mais recentes.

“O Brasil apoia a renovação do mandato do Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos em Caracas e da Missão de Investigação na Venezuela”, disse o representante brasileiro na sessão, o embaixador Tovar da Silva Nunes. Ele se referia à missão responsável por investigar acusações de violações de direitos humanos no país de Nicolás Maduro.

Nunes também agradeceu pelo acolhimento de algumas sugestões brasileiras ao texto, mas argumentou que “a resolução final continua tendenciosa e desequilibrada”.

“Portanto, o Brasil decidiu se abster. Uma resolução excessivamente condenatória e prescritiva não contribuirá para melhorar as condições no terreno ou promover o diálogo com todas as partes relevantes”, afirmou o embaixador.

“Acho lamentável que o Brasil não tenha votado a favor”, disse à Folha César Muñoz, diretor do braço brasileiro da ONG Human Rights Watch. Ele destacou que um dos parágrafos do texto votado tinha sido sugerido pelo Brasil, fazendo da abstenção do país na votação um paradoxo. “Cuba claramente tinha intenção de impedir a resolução, e acho que o Brasil caiu nessa armadilha.”

Muñoz comemorou, porém, a manutenção da missão em Caracas. “A Venezuela não tem órgãos confiáveis, eles são cooptados pelo governo. Então é fundamental que ela tenha vigilância internacional quanto à violação dos direitos humanos, especialmente agora.”

O diretor fazia referência à onda de repressão promovida pelo regime desde as eleições presidenciais, em julho.

Maduro teve a sua reeleição proclamada pelas autoridades locais, mas se recusou a tornar públicos os documentos que comprovariam esse resultado. A oposição, por sua vez, disponibilizou esses documentos na internet, e, ao anunciar sua vitória, teve o respaldo de uma série de organizações independentes que verificaram a autenticidade deles.

Quando a população venezuelana foi às ruas para denunciar fraude, a ditadura reagiu aumentando a perseguição contra oponentes, extinguindo garantias judiciais e aumentando a censura.

A ONG Foro Penal calcula que, desde o pleito, ao menos 1.916 pessoas tenham sido detidas por motivações políticas. Ameaças de prisão foram feitas até o rival de Maduro nas urnas, González. Acusado de “conspiração, usurpação de funções, incitação à rebelião e sabotagem”, ele acabou buscando asilo político na Espanha no mês passado. Enquanto isso, a líder de facto da oposição, María Corína Machado, segue em Caracas, mas escondida, sob o temor de retaliações.

Em paralelo a isso, multiplicam-se os temores de um novo êxodo massivo venezuelano, em especial nos países da América Latina e do Caribe, que abrigam 6,5 milhões do total de 7,7 milhões de venezuelanos que deixaram o país desde 2014.

Ao longo do mês, 25,1 mil imigrantes cruzaram o estreito de Darién, a chamada “selva da morte” entre a Colômbia e o Panamá usada como trecho da rota terrestre para chegar aos Estados Unidos. Destes, 19,8 mil (75%) são venezuelanos. Houve um aumento de 50% em relação ao registrado em agosto.

CLARA BALBI / Folhapress

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