SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo brasileiro suspendeu nesta sexta-feira (27) a emissão de vistos de trabalho temporários para a montadora chinesa BYD dias depois de uma força-tarefa afirmar ter resgatado 163 trabalhadores chineses em condições análogas à escravidão nas obras da fábrica da empresa em Camaçari, na Bahia (50 km de Salvador).
De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, os empregados entraram no Brasil com vistos de trabalho temporários, chamados Vitem 5, destinados a profissionais estrangeiros cujas qualificações e/ou experiência sejam compatíveis com as atividades a serem realizadas no Brasil.
Os trabalhadores foram contratados pela empreiteira terceirizada JinJiang, que nega a acusação de condição análoga à escravidão e fala em rótulo injusto. Já a BYD Auto do Brasil disse nesta semana que não tolera desrespeito à lei e à dignidade humana e que encerrou o contrato com a Jinjiang.
Em nota, o Ministério da Justiça informou que acompanha as investigações do Ministério Público do Trabalho e, comprovado o desrespeito à legislação migratória do país, as autorizações de residência concedidas à empresa serão canceladas, conforme a legislação brasileira.
A lei de imigração do país permite a emissão de vistos temporários de trabalho a serem pedidos pela empresa que trará o trabalhador ao Brasil, mas fica pendente de aprovação pelo Ministério do Trabalho.
Entre os requisitos, está a exigência de formação ou experiência específica para desempenhar aquela posição, normalmente onde há dificuldade de encontrar mão de obra no Brasil –o que não seria o caso dos operários contratados pela Jinjiang. A empresa teria alegado que os operários seriam “consultores” para trazê-los da China.
Em uma postagem nas redes sociais na quinta-feira (26) republicada por um porta-voz da BYD, o grupo Jinjiang rejeitou a avaliação das autoridades brasileiras de que os trabalhadores na unidade da Bahia estavam operando em condições análogas à escravidão. A empresa afirmou que a descrição dos trabalhadores como “escravizados” era imprecisa e que havia mal-entendidos na tradução.
Ao menos sete dos 163 operários resgatados têm retorno previsto para a China para o dia 1º de janeiro. As passagens para a viagem de volta serão custeadas pela montadora de carros elétricos, que também deverá arcar com ajuda de custo no valor de US$ 120 (R$ 740).
Todos os trabalhadores ficarão hospedados em hotéis da região de Camaçari até que sejam finalizadas as negociações para a rescisão dos contratos de trabalho.
As medidas foram definidas nesta quinta-feira (26) pela BYD e a Jinjiang durante uma audiência virtual conjunta entre o Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Defensoria Pública da União, Ministério Público Federal e Ministério da Justiça e Segurança Pública.
As duas empresas também se comprometeram a apresentar ao MPT todos os documentos relativos aos trabalhadores resgatados e as informações detalhadas de onde estão alojados. Uma nova audiência foi agendada para dia 7 de janeiro para que seja apresentada uma proposta de termo de ajuste de conduta para avaliação das empresas investigadas.
A investigação da força-tarefa apontou que operários estavam distribuídos em cinco alojamentos em Camaçari. Em apenas um deles, destinado a funcionários administrativos, não houve resgate de trabalhadores.
Em um dos alojamentos, os operários dormiam em camas sem colchões e não tinham armários para seus pertences, que ficavam misturados com materiais de alimentação. Havia apenas um banheiro para cada 31 trabalhadores, o que os forçava a acordar às 4h para se preparar para sair para trabalho às 5h30.
Além de insuficientes, segundo a investigação, os banheiros não eram separados por sexo e apresentavam condições precárias de higiene. Sem local apropriado para lavar roupas, os trabalhadores usavam os banheiros para esta finalidade.
Redação / Folhapress