Brasileiro trocou COB por desafio de levar Arábia Saudita às Olimpíadas

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – Marcelo Braga adiou enquanto pôde o convite que mudaria sua carreira. Coordenador da Academia Brasileiras de Treinadores, um órgão interno do Comitê Olímpico do Brasil (COB) voltado à formação de técnicos, levou cinco anos para aceitar que seu futuro estava no país que hoje concentra as atenções do mundo da bola. Pediu demissão antes das Olimpíadas de Tóquio, mudou-se para a Arábia Saudita, e hoje comanda um orçamento com potencial de superar o de todo o movimento olímpico brasileiro.

No cartão de visitas, este carioca de 38 anos é “games director” (diretor de Jogos) do Comitê Olímpico e Paralímpico Saudita. Na prática, Marcelo é o responsável por levar a representação saudita para torneios poliesportivos como os Jogos Olímpicos, o que inclui a delegação esportiva, mas não só. Os grandes eventos são, também, a chance de a ‘nova’ Arábia Saudita se apresentar para o mundo, e é papel dele garantir o conforto de toda a comitiva de príncipes, princesas e os mais variados VIPs.

“Para você tem uma ideia, na Copa do Mundo, quando eu trabalhei emprestado para a federação de futebol, nós tínhamos 730 carros alugados para atender a toda nossa estrutura, incluindo os convidados VIP. Não tinha carro suficiente no Qatar. Tivemos que levar de Riad e da Turquia. E os carros mais vagabundos eram uns BMW Serie 5”, detalha ele.

Marcelo começou a se aproximar da Arábia Saudita quando cursou uma espécie de MBA do Comitê Olímpico Internacional (COI), o Memos, entre 2014 e 2015. Ali, ficou amigo de um príncipe saudita, que trabalhava para o comitê olímpico, e chegou a ir ao Rio para seu casamento. Ao retribuir a visita em Riad, já com oferta para trabalhar no comitê olímpico saudita, encontrou uma cultura muito diferente.

“As mulheres não podiam dirigir. Minha esposa fuma e não podia nem fumar em lugares públicos. Se eu fosse com um amigo, também casado, no shopping, a gente só podia frequentar a área destinada às pessoas solteiras. A área de ‘família’ era só para quem estava com a esposa”, relembra.

Em cinco anos, porém, a Arábia Saudita passou uma transformação radical, segundo Marcelo. “É outro país”, opina. Em 2016, o príncipe herdeiro Mohammad bin Salman anunciou a criação da ‘Visão 2030″, um plano estratégico para reduzir a dependência do país em petróleo, diversificando sua economia. Isso passa pelo investimento em esporte, o incentivo ao turismo, e a promoção de uma imagem de um país mais moderno.

“Hoje eu tenho uma equipe de 12 pessoas das quais cinco são mulheres. Isso era impensável até pouco tempo atrás porque uma mulher não podia viajar sozinha, por exemplo, e nosso trabalho depende muito de viajar. E não é que as mulheres são aceitas. Há um incentivo para que as federações criem equipes femininas. Quem tem o feminino recebe mais dinheiro do comitê olímpico. Não é que o que eles fazem é maneiríssimo, é o normal. Mas isso não existia há cinco anos, e hoje existe”, ele conta.

Ao encontrar essa Arábia Saudita mais ‘moderna’, Marcelo topou levar para o Golfo Pérsico o modelo da Academia Brasileira de Treinadores. Faltavam sete meses para os Jogos Olímpicos de Tóquio, cuja realização ainda era incerta, quando ele pediu as contas do COB e se mudou com a esposa e a filha para Riad.

Por um ano, tentou implementar a escola de técnicos, um projeto que não deu certo, por falta de mão de obra. Logo passou a cuidar da área de Jogos, estratégica para os sauditas, que disputam em média sete competições poliesportivas por ano —o Brasil, como comparação, só disputa dois em 2023.

Em Paris, o brasileiro será também vice-chefe de missão da Arábia Saudita. No papel, já que o posto de chefe precisa ser ocupado por um saudita. Na prática, será ele o “ponto de contato”, a pessoa responsável por que os atletas do país tenham tudo do bom e do melhor para entregar os melhores resultados possíveis.

Há dois anos, em Tóquio, a Arábia Saudita levou 33 atletas à Olimpíada, sendo a maioria deles do time de futebol masculino que terminou em último no grupo do Brasil, com três derrotas. Só duas eram mulheres, convidadas pelo COI. Para Paris, o objetivo é, pela primeira vez, classificar uma mulher.

DEMÉTRIO VECCHIOLI / Folhapress

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