BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Caixa Econômica Federal lançou consulta pública para contratação de empresa que forneça detalhado banco de dados de pessoas expostas politicamente (PEPs), incluindo familiares e colaboradores próximos, além de monitoramento na mídia nacional e internacional de pessoas citadas em notícias envolvendo diversos crimes.
O banco público é comandado atualmente pela servidora de carreira Rita Serrano, mas ela está com o cargo ameaçado devido às negociações do presidente Lula (PT) para atrair o centrão para sua base de apoio.
O grupo pretende emplacar na vaga a ex-deputada Margarete Coelho (PP-PI), uma das principais aliadas do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Além da possível dança de cadeiras, a tentativa da Caixa de incrementar o monitoramento e controle sobre PEPs cujos nomes estejam associados a casos de corrupção vai na contramão de projeto de lei recentemente aprovado pela Câmara, sob a liderança do centrão.
O projeto criminaliza o que classifica de preconceito de instituições financeiras contra PEPS, familiares e colaboradores ao não autorizar abertura de contas ou ao negar crédito, entre outros pontos.
E estabelece pena de até 4 anos de prisão para “discriminação contra pessoas expostas politicamente, contra pessoas que estejam respondendo a investigação preliminar, a termo circunstanciado, a inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa ou contra pessoas que figurem como parte ré de processo judicial em curso”.
O texto foi apresentado pela deputada Dani Cunha (União Brasil-RJ) em 25 de maio. Ela é filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que deixou a Casa após ter o mandato cassado em 2016, tendo sido preso posteriormente no bojo da Operação Lava Jato.
Sob relatoria do deputado Claudio Cajado (PP-BA), outro aliado de Lira, o projeto foi aprovado em plenário apenas 22 dias depois, em 14 de junho.
A tramitação a jato ocorreu mediante aprovação de requerimento de urgência assinado pelo líder da União Brasil, Elmar Nascimento (BA), também do grupo de Lira, pelo então líder do bloco do presidente da Câmara, Felipe Carreras (PSB-PE), e pelo líder do oposicionista PL, Altineu Côrtes (RJ).
Desde o fim de junho o projeto está no Senado, comandado por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), mas até agora aguarda despacho que dê início à tramitação.
O texto chancelado pelo centrão traz ainda artigo estabelecendo que “os familiares e os estreitos colaboradores da pessoa exposta politicamente, bem como as pessoas jurídicas das quais ela participe, também serão alcançados pela proteção desta lei”.
O centrão tem dominado a política congressual desde que se colocou como suporte do governo Jair Bolsonaro, em 2020. Em várias ocasiões liderou o afrouxamento da legislação anticorrupção, como no caso do abrandamento da Lei de Improbidade Administrativa, em 2021.
Já o termo de referência elaborado pela Caixa em preparação da licitação não menciona em nenhum momento a necessidade de ter havido condenação do político, que é o cerne do projeto elaborado e aprovado pelo centrão na Câmara.
O monitoramento das PEPs, familiares e colaboradores pelas instituições financeiras segue padrões internacionais de combate à corrupção, à lavagem de dinheiro e ao terrorismo.
A vigilância mais acurada sobre movimentação bancária dessas pessoas tem por objetivo auxiliar na identificação de crimes que envolvam desvios de verbas do setor público.
O documento da Caixa diz que a empresa contratada deve fornecer base de dados de atualização diária com “notícias do monitoramento da mídia nacional e internacional, listas de sanções/embargos e mídia negativa, de maneira a identificar pessoas físicas e jurídicas citadas em notícias envolvendo crimes relacionados à corrupção, lavagem de dinheiro, financiamento do terrorismo e crimes correlatos”.
Em outro ponto, estabelece que a busca pelas notícias “deve ser realizada em matérias pagas e não pagas, nas versões impressas e web, em todos os sítios de notícias na Internet e nos jornais e revistas de maior circulação do país”.
O documento, então, lista uma série de crimes, como lavagem de dinheiro, corrupção, desvio de recursos públicos, tráfico de drogas, financiamento do terrorismo, estelionato, caixa dois, peculato, milícia e sonegação.
A Caixa e as demais instituições financeiras seguem as diretrizes da circular 3.978/2020, do Banco Central, que dispõe sobre as regras a serem adotadas com o objetivo de evitar que o sistema seja usado para a prática dos crimes de lavagem de dinheiro, terrorismo e correlatos.
Em 2019, a autoridade monetária chegou a ensaiar a tentativa de afrouxar as regras e retirar da lista de monitoramento os familiares das pessoas expostas politicamente, mas a medida não prosperou.
Em nota, a Caixa afirmou estar obrigada ao cumprimento da lei 9.613/1998 (que trata dos crimes de lavagem e que criou o Coaf, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras), além da circular do Banco Central.
Nesse contexto, diz o banco, foi realizada consulta pública para pesquisa de preços no mercado de empresas fornecedoras de dados de PEPs e mídias, etapa que antecede o processo licitatório em si, que o banco não informou quando exatamente pretende lançar.
A Caixa disse ainda que já possui sistema interno para monitoramento e prevenção à lavagem de dinheiro, que contempla as informações sobre pessoas expostas politicamente.
“Os monitoramentos contam com inteligência desenvolvida pela própria instituição, realizados internamente, fazendo uso de bases de dados externas, em estrito cumprimento à legislação e à regulamentação vigentes.”
A licitação faz parte, afirma, de um constante processo de aprimoramento do modelo, “buscando a maior mitigação dos riscos associados à prática de ilícitos”.
RANIER BRAGON / Folhapress