Campeão na temporada 21, LeBron continua fazendo o que aprendeu na infância

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Com a bola do jogo nas mãos, LeBron James atraiu a marcação dos adversários e acionou Cam Reddish, que, livre na zona morta, errou. O Los Angeles Lakers perdeu para o Miami Heat, no mês passado, e mais uma vez o craque ouviu as habituais críticas de que não tem o instinto matador de um Kobe Bryant, de um Michael Jordan, afinal passou, não arremessou.

Reddish recebeu palavras de encorajamento de LeBron. No último sábado (9), recebeu também nova oportunidade para decidir e acertou a bola mais importante da vitória sobre o Indiana Pacers, na final do inaugural In-Season Tournament, campeonato dentro do campeonato criado pela NBA para gerar interesse na parte inicial do calendário da liga norte-americana de basquete.

Não é a maior glória de James, tetra na disputa que vale de verdade. Mas, perto de completar 39 anos, ele é campeão de novo. Em sua 21ª temporada na NBA, vem apresentando desempenho sem precedentes na história da modalidade para alguém com sua rodagem. E sempre do seu jeito, passando a bola.

“Eu faço a jogada certa todas as vezes.”

O livro “LeBron”, lançado recentemente no Brasil pela Objetiva, esmiúça o caminho do ala até esse pensamento. “E tudo leva a Akron, Ohio”, resumiu à reportagem o norte-americano Jeff Benedict, biógrafo (não autorizado) daquele que, mesmo com tanta vontade de passar a bola, é o maior pontuador da história da NBA.

“Ele sempre foi capaz de pontuar como quisesse”, observou Benedict. “Mas, antes mesmo do ensino médio, ele aprendeu o valor de distribuir a bola aos companheiros que não são tão bons quanto ele, ou seja, basicamente todos. Ele percebeu que poderia elevar o nível dos colegas distribuindo o jogo e lhes dando oportunidade de pontuar, às vezes com facilidade. É uma lição incrível, uma lição de maturidade para se aprender como um adolescente. Muitos jogadores profissionais ainda não perceberam isso.”

Essa lição foi passada por Dru Joyce II, o técnico mais influente no desenvolvimento de James. “Bron, se você passar a bola, todos vão querer jogar com você”, disse o treinador. Chamado de Coach Dru, ele “tirou proveito da fome que LeBron sentia de amizade e de aceitação”, relata Benedict em seu livro. “O que LeBron desejava com todas as forças era ser desejado.”

É nesse ponto que a biografia, aclamada pela crítica nos Estados Unidos, mostra-se particularmente reveladora. Não por apresentar informações bombásticas e inéditas -o autor tomou a decisão de não tentar descobrir a identidade do pai do craque, até hoje um mistério. Mas por desenhar de maneira clara e rica em detalhes como se formou a personalidade de James.

De novo, tudo leva a Akron, no estado norte-americano de Ohio, onde Gloria deu à luz LeBron Raymone James e se tornou mãe aos 16 anos. Era uma adolescente pobre, com seus problemas, apesar dos quais seu filho lhe é extremamente grato. Quando lançou um livro de memórias sobre o período no ensino médio, o jogador escreveu a seguinte dedicatória: “Para minha mãe, sem a qual eu não estaria aqui hoje”.

A biografia assinada por Benedict tem no segundo capítulo, “Glo e Bron”, seu conteúdo mais denso. O pequeno LeBron ficava sozinho com frequência, às vezes por noites seguidas.

“Rezando para que a mãe voltasse logo, o menino enfim adormeceu, até que foi despertado por sons com os quais estava familiarizado. Homens gritando. Uma mulher implorando. Tiros. Pessoas correndo. Sirenes. Portas batendo. Mais gritaria. Mais sirenes. O menino não precisava de imaginação fértil para visualizar o perigo ao seu redor. Em muitas ocasiões ele já tinha visto coisas que nenhuma criança deveria ver.”

Foi a impressionante capacidade atlética que deu a James a possibilidade de deixar esse cenário, chamando a atenção inicialmente no futebol americano, depois no basquetebol. A ponto de um treinador, Frank Walker, convidá-lo a morar com sua família. Uma família estruturada, com regras, deveres. E companhia.

Gloria, com dor no coração, disse sim. E o garoto adorou.

“O LeBron teve um ambiente incrivelmente instável quando era pequeno. Ele e a mãe dele mudavam de um lugar para outro, dormiam no sofá dos outros”, disse Benedict. “E, como um subproduto de ter um dom atlético excepcional, ele foi apresentado a alguns homens muito bons na comunidade, envolvidos com esporte. Ele teve sorte, porque não necessariamente os treinadores de juvenis são grandes exemplos de bons pais, bons maridos.”

Frank Walker, o Big Frankie, era. Coach Dru, em cuja casa James passava cada vez mais tempo, também. O menino se enxergava em uma de suas séries favoritas, “Fresh Prince of Bel-Air” (no Brasil, “Um Maluco no Pedaço”), finalmente incluído dentro do que se considerava uma boa estrutura familiar.

Nenhuma palavra é tão importante no léxico de LeBron quanto “confiança”. Ela ajuda a explicar por que seu círculo íntimo é tão restrito, formado por amigos do ensino médio que são também seus principais parceiros comerciais. Por que está até hoje com Savannah, sua namorada desde os 16 anos. Por que é desconfiado com jornalistas, especialmente por reportagens que retrataram sua mãe de maneira pouco sensível.

Explica também por que ele continua a passar a bola para Cam Reddish. Por que, em sua 21ª temporada, aparece como real candidato ao prêmio de melhor jogador da NBA. Por que é grato a Gloria, até mesmo pelo doloroso gesto de entregá-lo a outra família.

“Tudo leva a Akron, Ohio.”

MARCOS GUEDES / Folhapress

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