SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Tido como termômetro dos dias oficiais de folia, o fim de semana de pré-Carnaval em São Paulo sinalizou uma mudança no comportamento dos foliões, que neste ano preferiram seguir megablocos, com atrações famosas, e desfiles organizados nos circuitos criados nas zonas sul e oeste. Blocos menores, que ocuparam ruas do centro, ficaram quase vazios.
A sucessão de apresentações de nomes consolidados do Carnaval, como Alceu Valença, Chico César e Monoboloco, mantiveram a alta frequência de foliões durante todo o final de semana passado na região do parque Ibirapuera, na zona sul.
A alta expectativa em relação à programação fez os ambulantes disputarem espaço ainda de madrugada, quando uma fila de carrinhos de bebidas se formou na entrada do complexo. Vendedores cadastrados que chegaram perto do horário de início das atrações, no começo da tarde, foram barrados devido à superlotação.
“Isso mostra que o Carnaval de rua de São Paulo prioriza o entretenimento. Os blocos orgânicos têm dificuldade em atrair muita gente”, diz José Cury, representante do Fórum de Blocos de São Paulo.
Neste ano, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) registrou 118 cancelamentos de desfiles até a última quarta (31). A maioria das desistências ocorreu entre aqueles que não conseguiram patrocínio suficiente diante do aumento dos preços para colocar o bloco na rua. As marcas priorizaram produções de peso que são garantia de atrair multidões.
O secretário de Governo do município, Edson Aparecido, que comanda a comissão criada para organizar os desfiles, avalia que o público que costuma frequentar blocos preferiu ir a festas e bares no último fim de semana. Esta é a razão, segundo ele, pela qual as marcas destinaram menos verba ao Carnaval de rua.
Para entrar no espaço na avenida Pedro Álvares Cabral, onde os trios elétricos ficam parados e não chegam a cumprir um trajeto, o público é revistado. Apreensões de sombrinhas coloridas do frevo, levadas pelos fãs da dança pernambucana, causaram indignação entre o público.
Além dos ambulantes que têm autorização para vender apenas bebidas do patrocinador oficial, os foliões no circuito Ibirapuera são abordados por promotores de outras marcas que aproveitam a concentração de público para distribuir brindes como mochilas e viseiras. A iniciativa é conhecida no meio publicitário como ativação de marca, uma estratégia de marketing que visa atrelar a experiência do Carnaval ao consumo do produto.
Na avenida Sumaré, na zona oeste, o circuito delimitado por gradis também atraiu bastante gente. A organização da principal atração, o bloco Ritaleena, diz ter notado aumento de público em relação ao desfile do ano passado, organizado na rua dos Pinheiros. “Já era esperado por ser o primeiro Carnaval após a morte de Rita Lee”, diz Alessa Camarinha, uma das fundadoras do bloco que toca repertório da roqueira.
Além disso, a cantora avalia que blocos médios (a partir de 150 mil pessoas) que surgiram na primeira leva da retomada do Carnaval de rua, há dez anos, adquiriram experiência ao longo do tempo e, agora, fazem desfiles mais elaborados, que caem no gosto do público. O Ritaleena, por exemplo, completou nove anos.
Segundo Diego Leporati, fundador do bloco Cecílias e Buarques, não houve divulgação dos desfiles por parte da prefeitura, o que afetou a frequência de blocos menores, principalmente na região central. “As informações estão mega confusas, e há também o abandono do centro da cidade”, afirma.
De acordo com a gestão Nunes, para o Carnaval deste ano é esperado público recorde em São Paulo, superior aos 15 milhões registrados nas três semanas de folia em 2023.
Há consenso entre os organizadores de blocos que a previsão de tempestades para o fim de semana pode ter desanimado boa parte do público. Na sexta-feira (2), um dia antes da programação, temporal deixou a cidade em estado de atenção para alagamentos.
Mas a previsão não se confirmou, e o fim de semana teve apenas períodos isolados de chuva, nada que estragasse a festa de quem estava na rua.
A menor adesão a fantasias, em comparação a carnavais anteriores, também ficou evidente nos blocos com atrações famosas. Foi essa a percepção de José Cury, do Fórum de Blocos de São Paulo, por exemplo. Ele conta que passou pela Vila Madalena no sábado (3) e notou que havia pouca gente fantasiada na rua.
O pré-Carnaval também frustrou quem esperava faturar, como os ambulantes Michelle, Rodrigo e William Santana de Souza. Na tarde de domingo (4), após mais de três horas na rua Henrique Schaumann, na zona oeste, as vendas de latas de bebidas estavam no zero.
Este é o terceiro ano em que a família se cadastra para trabalhar com venda de bebida na folia e o primeiro de vendas tão fracas, eles dizem. No sábado, tinham vendido apenas R$ 100 na Fradique Coutinho, também em Pinheiros. “No ano passado, o faturamento foi de R$ 400 a R$ 600 no pré-Carnaval”, comparou Rodrigo, 28.
Para Michelle, 31, os cancelamentos de desfiles podem ter contribuído para a queda no movimento de foliões. “Acaba concentrando mais gente em menos lugares.”
A gestão Nunes afirma que cabe à empresa patrocinadora o treinamento, a orientação e o apoio aos vendedores nos blocos de rua. A Ambev, patrocinadora oficial do Carnaval de São Paulo, foi procurada pela reportagem, mas não se pronunciou.
A maior concentração de foliões no pré-Carnaval foi observada na rua da Consolação, que recebeu no domingo, para o desfile de 15 anos do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, 1 milhão de pessoas, mesmo público registrado no ano passado.
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Colaboraram Bruno Lucca, Stefhanie Piovezan e Clayton Castelani
MARIANA ZYLBERKAN / Folhapress