Cemig precisa virar corporação mesmo se ativo for transferido para União, diz Zema

NOVA YORK, EUA (FOLHAPRESS) – A proposta de federalização de estatais de Minas Gerais em troca de abatimento da dívida do estado com a União está em banho-maria, mas, ainda assim, o governador Romeu Zema mantém a defesa de transformar a estatal Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) numa corporação, ou seja, numa empresa sem controlador.

“Eu diria até que nem é federalização: é transferência de ativos. Mas antes da federalização, nós vamos querer que a empresa se transforme numa corporation [corporação em inglês]”, afirmou Zema à reportagem.

“Isso vai otimizar o seu valor e melhorar em muito a governança, fazendo com que ela não fique mais sujeita a intervenções da politicagem, como aconteceu no passado e prejudicou muito o estado.”

Atualmente, um terço das ações da Cemig são ordinárias, com direito a voto, e dois terços, preferenciais, que não dão direito a voto, mas prioridade para receber dividendos. O estado de Minas Gerais tem 50,97% das ações ordinárias, nenhuma preferencial e 17,04% do total de ações, o que lhe garante o controle da companhia.

A proposta é converter todas as ações preferenciais em ordinárias. O estado de Minas receberia dividendos como os demais acionistas e deixaria de ser o controlador. No entanto, continuaria como acionista principal e também acionista de referência, com direito a veto em temas mais sensíveis por meio de uma golden share.

Seriam estabelecidas travas societárias para que nenhum acionista tivesse mais direitos de voto que o governo do estado.

Segundo Zema, por isso, “não será preciso vender nada”, o que configuraria privatização no sentido tradicional, mas apenas mudar a governança da Cemig.

“O estado tem hoje 17% da empresa e, com esse percentual, detém o controle. Ele vai continuar com esse percentual, só que não vai deter o controle, e [com essa operação], esses 17% vão ter o dobro do valor que têm hoje.” Nesta segunda (20), o valor de mercado da Cemig na B3, a Bolsa brasileira, era de R$ 32,5 bilhões.

A gestão Zema lembra ainda que, pela regra atual, como estatal, a Cemig não poderá renovar, em 2026 e 2027, a concessão de hidrelétricas que representam quase 60% de sua capacidade de geração.

Com o novo modelo, deixaria de ser estatal e poderia manter todas as usinas, o que preservaria a sua musculatura para estar entre os líderes do setor, cada vez mais competitivo diante da abertura do mercado de energia.

Zema conversou com a reportagem em Nova York, onde esteve nesta semana para acompanhar os eventos dedicados ao Brasil. Além da agenda de palestras, é de praxe que se aproveite a viagem para encontros com investidores.

O presidente da Cemig, Reynaldo Passanezi Filho, integrou a comitiva do governo mineiro nos Estados Unidos, reforçando o grupo dedicado à atração de investidores.

“Viemos mostrar o potencial do Brasil, e sobretudo de Minas, na área de transição energética, detalhando as vantagens para quem quiser investir na geração de energia limpa ou fabricar com base em energia limpa, para certificar os seus produtos, pois temos um programa sustentado por energia renovável”, disse Passanezi.

Segundo o executivo, é importante apresentar para o mundo que 90% da matriz de energia elétrica do Brasil é renovável, e que, no caso de Minas Gerais, essa participação sobe para 93%. Posições sem paralelo.

CEMIG PROJETA R$ 50 BI DE INVESTIMENTOS EM DEZ ANOS

A Cemig é 100% dedicada às chamadas fontes verdes, reforça o executivo. A empresa conta com 75 unidades para a geração de energia renovável, incluindo hidrelétricas, parques eólicos e fotovoltaicos, não apenas em Minas, mas também no Rio de Janeiro, Espírito Santo, Goiás e Ceará.

“Na atração de investimentos, focamos ser o fornecedor da infraestrutura. Quem tiver bons projetos para produzir ou consumir, conte com a rede, porque a Cemig vai prover”, disse Passanezi.

Segundo ele, a companhia está realizando um programa recorde de investimentos. De 2019 a 2028, serão R$ 50 bilhões, R$ 40 bilhões especificamente para fortalecer a infraestrutura. Do total, até 2023, já foram desembolsados R$ 13,5 bilhões. Há duas linhas de ações, explica o presidente da companhia.

O Mais Energia canaliza recursos para reforçar a rede, com a construção de subestações. “Quando eu assumi [em janeiro de 2020], a Cemig tinha 414 subestações. Como o Mais Energia, vamos reforçar a capacidade de transportar energia, com um adicional de 200 subestações —ou seja, um crescimento de cerca de 50%. Em junho, vamos entregar a 100ª”, afirma o executivo.

O outro programa em desenvolvimento é o Minas Trifásico, que reforça a capacidade da rede na área rural, que essencialmente ainda é monofásica.

“O setor rural mudou muito, e o agronegócio precisa de capacidade e muita energia. Com o programa serão convertidos 30 mil km (quilômetros) de rede monofásica em rede trifásica. Para dar uma ideia do que é isso, essa distância é quase o perímetro da terra, que tem 40 mil km”, afirma.

Segundo Passanezi, a agenda de encontros organizados por bancos e consultorias foi extensa. Foram mais de 15 encontros com grupos de investidores da NYSE (Bolsa de Valores de Nova Iorque) e da Nasdaq (Bolsa mais focada em tecnologia). Ocorreram reuniões com executivos do Bank of America, empresas de infraestrutura, em evento organizado pela Ernst & Young, e do setor de lítio, na comemoração de um ano de lançamento do Lithium Valley.

O executivo preferiu não fazer comentários sobre como o estado pretende conduzir o destino acionário da Cemig.

Zema apresentou a proposta para transformar a estatal de energia mineira numa corporação em outubro do ano passado, em um encontro com deputados da base de governo. Operações como essa, incluindo a privatização, precisam ser aprovadas pela Assembleia Legislativa. Um mês depois, ganhou força fora do governo estadual a proposta de federalização.

Ela já vinha sendo discutida em alguns segmentos do setor de energia, mas passou a ser encampada e defendida formalmente pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), conforme foi detalhado pelo jornal Folha de S.Paulo na época.

O pacote apresentado à União, inclusive em reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), também incluiu a transferência da Codemig (estatal mineração de nióbio) e da Copasa (da área de água e saneamento).

A proposta apresentada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no entanto, esfriou a discussão. Haddad atrelou a redução dos juros cobrados à contrapartida de o estado fazer investimentos em ensino médio técnico.

O programa proposto pela Fazenda, batizado de “Juros Por Educação”, permite amortização de 10% a 20% da dívida dos estados em troca de ativos, incluindo participações em empresas públicas e sociedades de economia mista —caso de Cemig, Copasa e Codemig.

Zema afirmou que aguarda a versão final da proposta de negociação da dívida.

“O ajuste do regime de recuperação está com a Secretaria do Tesouro Nacional, no Ministério da Fazenda, que vai enviar um projeto de lei ao Congresso. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, vai aguardar esse projeto e, segundo ele, fará alguns aperfeiçoamentos, caso a Fazenda não inclua alguns mecanismos nesse PL.”

“Eu adianto que é extremamente necessário [fazer esses ajustes]. Com o que o governo cobra hoje dos estados pelo serviço da dívida, a conta não fecha. É uma boca de jacaré o IPCA mais 4%. IPCA é a inflação e a economia não cresce 4%. Cresce menos. O que tivemos em 2015 e 2026 foi até o oposto, queda na economia.”

Segundo Zema, foi a partir daquele momento que a situação se tornou inviável, e os estados passaram a ter uma dificuldade tremenda.

“O que esperamos do governo é que a Receita Federal faça para os estados o que já faz para o setor privado. Quando uma empresa adere a um Refis, ela tem desconto nos juros e na correção. Por que os estados não podem ter?”

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A repórter viajou a convite da Ema Conteúdo

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RAIO X DA CEMIG

A empresa encerrou 2023 com:

Lucro

R$ 5,8 bi

Receita Líquida

R$ 36, 9 bi

Empregados

4.918

Fonte: Cemig

ALEXA SALOMÃO / Folhapress

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