SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Quase dois anos após o início da Guerra da Ucrânia, o chefe das Forças Armadas do país invadido, o general Valeri Zalujni, disse nesta terça-feira (26) que não estava satisfeito com o trabalho dos escritórios responsáveis pela mobilização de tropas para manter os esforços contra as ofensivas da Rússia.
Foi a primeira entrevista coletiva de Zalujni durante a guerra, um dia depois de o Parlamento ucraniano publicar o texto de um projeto de lei que reforma o programa de recrutamento militar obrigatório. Dentre as medidas propostas está a redução da idade dos homens que podem ser mobilizados, de 27 para 25 anos.
A publicação do projeto provocou polêmica nas redes sociais, o que teria motivado o general, discreto em termos de propaganda, a se pronunciar. “Atualmente não estou satisfeito com o trabalho [de mobilização]”, disse ele. “Se eu estivesse satisfeito, não estaríamos discutindo este projeto de lei.”
As reformas são sensíveis para uma população cansada da guerra que já dura 22 meses e não tem fim à vista. Na semana passada, o presidente Volodimir Zelenski disse que os militares propuseram mobilizar de 450 mil a 500 mil soldados extras para o Exército.
Zalujni confirmou o número, mas disse a jornalistas que nunca teria revelado a cifra publicamente, uma observação que pode renovar a especulação pública sobre os atritos políticos entre ele e o presidente ucraniano durante o conflito.
Neste ano, Zalujni foi o responsável por supervisionar uma contraofensiva da Ucrânia que não conseguiu retomar quantidades significativas de terras ocupadas pela Rússia.
No entanto, ele ainda é bastante popular entre os ucranianos depois de repelir as forças russas da capital, Kiev, no início da guerra, e de planejar duas ofensivas bem-sucedidas, no outono de 2022, que retomaram grandes extensões do território ucraniano.
“Tínhamos objetivos bastante ambiciosos em 2023. Não fiquei desapontado com o nível [de assistência externa] em 2023. É claro que não foi o total [do montante solicitado], mas nos permitiu conduzir operações militares confiantes”, disse ele.
As tensões entre Zalujni e Zelenski vieram à tona em novembro, depois que o general foi citado como tendo dito que a guerra estava caminhando para um impasse devido à situação tecnológica no campo de batalha o comentário foi repreendido pelo gabinete do presidente.
Zelenski e os seus aliados têm reportado com frequência uma visão menos sombria da guerra, na qual afirmam que a Ucrânia pode e irá expulsar as forças russas de cada centímetro do território ocupado.
O general, contudo, afirmou que o desenrolar da guerra havia justificado os seus comentários. “Recebi muitas críticas por isso, mas com o tempo as pessoas perceberam que eu estava absolutamente certo”. Ele acrescentou que a Ucrânia e os seus aliados já tinham identificado soluções para a maioria das questões e problemas que levantou nas suas falas em novembro sobre o campo de batalha.
Acerca do projeto de lei, ele informou que apoiaria a introdução de convocações eletrônicas de reservistas, uma medida que substituiria ou reforçaria o modelo atual, em que os oficiais de recrutamento distribuem convocações às pessoas na rua ou em locais de controle. “Estamos satisfeitos com qualquer meio que garanta a nossa demanda por pessoas”, disse ele.
Os militares da Ucrânia ficaram muito aquém dos seus objetivos em uma contraofensiva durante o verão no país, de junho a agosto, mas Zelenski insiste que reforçou as suas defesas aéreas com ajuda de parceiros internacionais, em especial os Estados Unidos, e que obteve sucessos navais no mar Negro.
Kiev vive um de seus piores momentos desde o início do atual conflito no Leste Europeu. O governo de Zelenski aguarda que um novo pacote de ajuda militar emergencial seja aprovado pelo Congresso dos EUA, mas os planos estão travados, ao menos por ora.
A expectativa de que a ajuda viesse ainda neste 2023 fracassou na última semana, quando republicanos e democratas falharam em acordar sobre uma nova política migratória para a fronteira sul do país. A região assiste a níveis recortes de migração ao longo dos últimos meses, e republicanos afirmam que qualquer ajuda adicional à Ucrânia vira apenas quando os democratas cederem na agenda migratória.
Enquanto isso, as tropas de Zelenski estão tendo de reduzir o ritmo de suas operações contra a invasão russa devido à falta de auxílio militar do Ocidente, particularmente munição de artilharia o item mais precioso ao longo dos 1.000 km de frente de batalha no país.
Do início da guerra até 31 de outubro, segundo estimativa do Instituto para a Economia Mundial de Kiel, baseado na Alemanha, R$ 1,2 trilhão foi despejado nos cofres e arsenais de Kiev. Só que, de agosto em diante, o ritmo de ajuda despencou, sendo 90% menor do que o registrado no mesmo período de 2022.
Redação / Folhapress