Christian Cravo retrata em fotografias a degradação causada pelo ser humano

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um homem caminha sozinho sobre uma terra preta e estéril, enquanto a fumaça se desprende do solo e sobe em direção ao céu. Atrás dele, bois tentam encontrar alimento em meio ao lixo e à fuligem. A imagem de ares distópicos retrata o cotidiano de Agbogbloshie, um bairro de Acra, a capital de Gana.

A região abriga há anos um dos maiores lixões de restos eletrônicos do mundo. Foi essa localidade que o fotógrafo Christian Cravo escolheu para fazer as imagens que compõem a mostra “Paisagens Antrópicas”, em cartaz na Casa Seva, localizada nos Jardins, na capital paulista.

São 14 fotografias que documentam os prejuízos sociais e ambientais causados pelo descarte inadequado de produtos, boa parte vindos de países da Europa e da América do Norte.

Essas nações despejam todos os anos toneladas de lixo eletrônico em nações da África, Ásia e América Latina. Como consequência, as paisagens naturais desses países passam por um processo de degradação causado pelos consumos do ser humano.

“A ideia desse trabalho é questionar como nós transformamos determinados espaços”, diz Cravo, que chama essas mudanças de processos movediços.

“Por exemplo, o que deveria ser apenas uma praia em Gana vira um lugar cheio de tecidos. O que deveria ser um deserto virgem acaba completamente coberto

por roupas”, afirma o fotógrafo.

A exposição gira em torno do conceito de antropoceno –termo que se refere ao atual período da história, marcado pelas alterações que o homem tem causado nas condições de vida na Terra. Cravo considera que algumas dessas mudanças podem ser positivas, mas muitas delas têm se mostrado prejudiciais ao meio ambiente.

Em Gana, por exemplo, o lixo dos países ricos fez com que o solo se tornasse tóxico. Em algumas áreas de Agbogbloshie, a concentração de chumbo na terra chega a ser mil vezes superior aos níveis considerados toleráveis. A exposição prolongada a substâncias tóxicas do lixão podem provocar câncer, doenças respiratórias e problemas reprodutivos.

No entanto, em razão da pobreza, parte da população local encontra nesse espaço uma forma de gerar renda. Os trabalhadores queimam os produtos eletrônicos para extrair o cobre e vendê-lo no comércio. Cravo retratou alguns deles nas fotografias da mostra.

“Nesse espaço, existe uma microeconomia e uma relação hierárquica. Há desde o chefe até os ‘soldados’ do lixão, ou seja, os rapazes que queimam os produtos para pegar cobre.”

Cravo é conhecido por fotografias que colocam em primeiro plano a fauna e flora das regiões pelas quais ele passa. No ano passado, lançou o livro “Reino Desse Mundo”, obra que reúne imagens em preto e branco de natureza e animais feitas em países da África.

Desta vez, porém, ele optou por preservar as cores originais das imagens. “Meu objetivo era justamente mostrar de forma realista as alterações que nós criamos nas paisagens naturais.”

Ele diz também ter tentado fazer fotografias que chamassem atenção por seus atributos estéticos. Exemplo disso é a imagem de um rapaz que segura em volta do corpo uma rede cheia de tecidos. Enquanto olha para o lado, as ondas do mar rebentam atrás dele.

O jovem atua num coletivo que tenta despoluir uma praia considerada sagrada para os ganenses. “Minha intenção era que a imagem fosse bonita. Por que o dramático tem que ser feio? Não vejo nenhuma razão para isso.”

É uma discussão ligada à chamada estética da miséria. A expressão foi criada para designar o trabalho de fotógrafos que retratam com esmero plástico grupos vulneráveis. “Acho um termo ultrapassado”, diz Cravo. “Se você quer dar muito ‘tapa na cara’ na hora de apresentar um tema delicado, pode afastar as pessoas.”

Paisagens Antrópicas

Quando: Terç. a Sex., das 11h às 18h. Sáb., das 11h às 15h. Até 21 de dezembro

Onde: Casa Seva – Alameda Lorena, 1257 – Casa 1

Preço: Gratuito

Classificação: Livre

MATHEUS ROCHA / Folhapress

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