SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Não é de modéstia que “Horizon” vai desaparecer. Longe disso: a saga dirigida por Kevin Costner pretende ser uma espécie de resumo da história ou da mitologia do Oeste norte-americano ainda no tempo das diligências. Ou pelo menos é isso que mostra o primeiro capítulo, com três horas de duração.
A ideia é mostrar, através da criação de uma cidade, Horizon, justamente, mais ou menos tudo que já se viu em matéria de faroeste: os homens brancos bons e os maus; os índios que defendem seu território dos invasores (também conhecidos como colonos), a Cavalaria, os órfãos, as prostitutas, as caravanas.
“Horizon” tem até militares sábios, como o coronel que chefia o forte e seu sargento, fatalistas ambos, que em conversas bem sofisticadas nos lembram que, morra quem morrer, haja o que houver, aquele espaço será ocupado, pois depois dos que morrem, outros virão.
Um chefe indígena também recomenda a um jovem e impetuoso guerreiro que se contenha na hora de escalpelar os brancos, pois com isso os transforma em inimigos: conselhos de prudência, mas, como bem diz o sargento do forte, conselhos inúteis, dada a fatalidade da expansão do território pelos brancos.
Terminada a primeira etapa, estamos entre brancos (não o tempo todo, mas quase). Os problemas de uma caravana, as disputas familiares, o idiota armado, o pistoleiro bom sujeito (Kevin Costner, quem mais?).
O fato é que Costner mais uma vez se sai bem na direção. Desde a escolha das ótimas locações à opção por um ritmo que contraria a tendência a uma aceleração quase celerada, o cineasta mostra que tem caráter. Está longe da tendência dos filmes que parecem imitar os games, ou do uso abusivo das lentes grande angulares.
“Horizons” nos mostra momentos pouco ou nada explorados da saga do faroeste: o conserto de uma roda de carroça, por exemplo, com o fortão que fica por baixo, de quatro, segurando a carroça com as costas, enquanto outros ajeitam a roda no eixo.
Costner sabe variar a rudeza que imprime a seus tipos, masculinos em especial, mas nem sempre, com um sentido do glamour clássico que imprime a certas mulheres. Ali existe uma jovem prostituta que faria sucesso nas célebres “maisons closoes” da Paris de outros tempos. Também introduz modernidades, como a jovem viúva que, na maior, dá em cima de um tenente gentil que, caramba, parece um cavalheiro saído de alguma corte, de tão gentil.
Essa alternância e mesmo esses apelos à convenção, tornam o conjunto da saga mais suave e favorecem o correr do filme. Entre a inovação e o conhecido, a curiosidade pela montanha de personagens que mal sabemos até agora quem são ou no que vão dar na sequência, o tempo corre sem dificuldade, até porque Kevin Costner dirige bem.
Esse primeiro capítulo da saga (dois outros, pelo menos, virão: o segundo já está filmado, o terceiro, em produção) alterna os conflitos entre interpessoais e interculturais. Mal houve tempo de desenvolver os personagens, o que pode ou não favorecer a sequência da saga: o espectador pode ficar curioso de saber quem é esse Kevin Costner cuja aparência lembra muito o bandido de “O Grande Assalto ao Trem” (1903), filme inaugural da saga do faroeste.
Talvez Costner tenha plena consciência de estar no crepúsculo do gênero, mas voltar ao Oeste depois que o cinema dos Estados Unidos já visitou tantos planetas e mundos pode significar que o país entra num momento em que retrair-se, voltar a si mesmo, refletir, examinar seu nascimento e expansão pode não ser uma má ideia.
Muita água vai correr embaixo da ponte, ainda. Horizon, que começou a série como um panfleto de anúncio imobiliário, sabemos que se tornará uma cidade. De que proporções? Com quais conflitos? O certo, por ora, é que este primeiro segmento se distancia bastante da vulgaridade e do facilitário do cinema hollywoodiano médio contemporâneo.
Horizon: Uma Saga Americana – Capítulo 1
Onde Max e HBO
Classificação 16 anos
Elenco Kevin Costner, Sienna Miller e Sam Worthington
Produção EUA, 2024
Direção Kevin Costner
Avaliação Bom
INÁCIO ARAUJO / Folhapress