SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ainda incipiente no Brasil, o mercado de captura, estocagem e uso de carbono tem potencial para crescer e contribuir para a descarbonização e a transição energética no país. É fundamental que a solução seja, porém, combinada a outras medidas de redução das emissões dos gases de efeito estufa, como eletrificação por meio de fontes renováveis e uso de biocombustíveis.
A captura e a estocagem de carbono foram debatidas pelas especialistas do segundo painel do seminário Energia Limpa, realizado na quarta-feira (6) pela Folha de S.Paulo. Em sua terceira edição, o evento teve patrocínio da Apex, entidade que promove a competitividade global das empresas brasileiras, além do apoio da siderúrgica ArcelorMittal e das montadoras BYD e Toyota. A mediação foi feita pela repórter especial Alexa Salomão.
O marco legal da CCS, sigla em inglês para captura e armazenamento de carbono, e da CCUS estratégia em que o CO2 coletado é utilizado para dar origem a outros produtos, como os combustíveis sintéticos foi criado há um mês, com a sanção da lei do Combustível do Futuro pelo presidente Lula (PT).
Embora o Brasil seja o primeiro país da América Latina a ter legislação na área, ainda falta a regulamentação da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) para que um modelo de negócio possa ser estruturado, diz Ana Zettel, assessora do gabinete da presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social)
Como vantagem do país nesta frente, Zettel destaca o conhecimento da captura e estocagem de CO2, inclusive com a Petrobras adotando a estratégia em campos de pré-sal.
“Já dominamos a técnica há muito tempo. Para que chegássemos nesse momento, a indústria de óleo e gás precisou anteceder a discussão de descarbonização, conhecer materiais que suportam a corrosão [provocada pelo carbono], aprender a comprimir o gás nas plataformas e descobrir os reservatórios, então já temos estrutura instalada e podemos utilizar.” Os espaços para estoque de CO2 costumam ser, explica a especialista, aquíferos ou reservatórios de petróleo depletados (ou seja, com recursos esgotados).
Questionadas sobre as críticas ao setor, que dizem que investir em captura e estocagem de carbono serviria para prolongar o uso de petróleo, as especialistas do painel defendem que o método complementa outras estratégias de energia limpa e que pode ajudar a neutralizar não zerar as emissões de CO2. O principal benefício ocorre em segmentos nos quais a descarbonização é mais difícil, como a siderurgia e a indústria do cimento.
“O futuro energético é diverso em fontes e tecnologias. Soluções como eletricidade renovável, eletrificação, biocombustíveis para setores de difícil descarbonização e captura e estocagem de carbono são complementares. Vamos precisar de todas se estamos falando sério em combate à mudança climática”, afirma Heloisa Esteves, diretora de estudos do petróleo, gás natural e biocombustíveis da EPE (Empresa de Pesquisa Energética).
Luana Gaspar, gerente de descarbonização da PSR Energy Consulting, ressalta que também é preciso pensar na captação de recursos para viabilizar os projetos de captura e estocagem de CO2 para além da venda dos créditos de carbono.
Como exemplo, ela menciona a produção de combustíveis sintéticos a partir do carbono coletado, já que, além de contribuir com o financiamento de iniciativas de captura e estoque, produtos como o metanol podem ajudar na descarbonização de outros setores, como o marítimo. No futuro, ela afirma, é possível avançar no uso do CO2 além do segmento de combustíveis.
Para Esteves, da EPE, um ramo da captura e do armazenamento de carbono com potencial para crescer nos próximos dez anos é o da BECCS, sigla em inglês para bioenergia com captura e armazenamento de carbono. Nesta técnica, resíduos orgânicos poderiam ser convertidos em biocombustíveis ou ser utilizados para gerar energia.
Já a captura de carbono da própria atmosfera, técnica chamada de DAC (direct air capture), que tenta reproduzir o processo feito pelas plantas para a fotossíntese, deve avançar apenas a longo prazo, na avaliação da especialista.
MARINA COSTA / Folhapress