CAMPO GRANDE, MS (FOLHAPRESS) – Guariroba é uma palmeira típica do Pantanal, presente sobretudo na fronteira do Brasil com o Paraguai e a Bolívia. Dá um fruto amargoso, uma espécie de primo do palmito, parte da cultura alimentar indígena e de outras comunidades do cerrado como um todo.
Ela é uma das estrelas da gastronomia pantaneira, cada vez mais em evidência nos cardápios e também no dia a dia dos moradores de Mato Grosso do Sul, estado que vem se esforçando para promover atrativos para além dos rios de coloração translúcida de Bonito. Isso é evidente sobretudo em Campo Grande, onde chefs e donos de bares e restaurantes se unem para promover a identidade da mesa local.
Baru, queijo nicola, linguiça de Maracaju, peixes pintado e pacu, mel de abelhas nativas do Pantanal (sem ferrão), molho de urucum e carne de jacaré -alguns desse ingredientes não são novidade, mas estão cada vez mais presente nos cardápios da capital.
A primeira edição do Circuito Gastronômico de Campo Grande, que ocorreu no primeiro semestre, é um exemplo desse processo. Ao todo, 67 bares, restaurantes, cafés, padarias e até sorveteria puderam participar desde que oferecessem, ao menos, um prato típico de Mato Grosso do Sul.
“Até o fim do ano passado, contavam-se nos dedos as casas com comida regional, que hoje já ultrapassam 60”, diz José Marques, um dos idealizadores do evento, que deixou frutos.
“A maior parte desta turma se organizou e se juntou para fortalecer os ingredientes regionais em versões surpreendentes, como fez o estado do Pará anos atrás, mostrando que Mato Grosso do Sul vai além de cenário de novela”, afirma a produtora Marica Marinha, sócia de Marques na empreitada.
Essa movimentação é acompanhada pelo chef Paulo Machado, que atua como uma espécie de embaixador da comida pantaneira. Radicado na Espanha, ele diz que assinou a curadoria do circuito depois de provar todas as receitas.
“A comida pantaneira está ganhando não só atenção no Brasil, mas também em outros países, e num passo rápido”, diz Machado, que serviu, num jantar na Embaixada Brasileira em Tóquio, comidas típicas como chipa, macarrão de comitiva e pudim de mandioca.
Ele é também autor de livros como “Cozinha Pantaneira: Comitiva de Sabores” e idealizador da Rota Gastronômica Pantaneira, lançada em dezembro, com o objetivo de divulgar a gastronomia, o turismo e a cultura locais. No projeto, participam nove hotéis e pousadas, além de uma vinícola, com receitas típicas e intervenções que valorizem os insumos e temperos locais.
Com pouco mais de 40 anos, o estado de Mato Grosso do Sul detém 65% do Pantanal. O forte à mesa é a carne bovina, tanto é que até a linguiça local -a de Maracaju- é feita com bifes de boi picados na ponta da faca. É o steak tartare pantaneiro. Com fama de ter sido o inventor da técnica, Antônio Horácio serve a iguaria no seu restaurante, o Linguiça de Maracaju, acompanhada por arroz, farofa, mandioca e vinagrete.
Basta um giro por Campo Grande para encontrar outras receitas locais. Caso do risoto pantaneiro servido no Território do Vinho, com carne-seca desfiada. Ou do bife ancho ao modo de Mato Grosso do Sul, preparado na parrilla do Boi de Capim, que chega com espaguete de guariroba.
Também é possível saborear uma coxinha recheada de carne de jacaré. O restaurante 067 aposta no réptil para harmonizar a experiência com alguns dos rótulos de vinhos nacionais servidos em taça ou garrafa.
No bistrô Les Amis, o pintado (peixe da região) é servido coberto de farofa de baru e servido sobre molho cremoso de urucum, escoltado por mil folhas de mandioca.
A chef, Ana Paula Seemann, é membro de uma associação de agricultores orgânicos do estado e procura trabalhar com ingredientes sazonais. É de uma agrofloresta que ela leva para o salão insumos que resultam em opções como bolinho de taioba com muçarela de búfala e entradas servidas com mel de jataí e mandaçaia, duas abelhas nativas do Brasil, sem ferrão, donas de um mel azedo, menos doce que o convencional.
A região também quer se firmar com a produção de vinhos. A colheita é agora no inverno, mas a primeira safra sairá só em 2024. Shiraz, cabernet sauvignon, sauvignon blanc, marcelan e chenin blanc serão as primeiras uvas transformadas em vinhos no Pantanal. “Ainda falta plantar a chardonnay”, diz Gilmar França, dono da Terroir Pantanal, vinícola que ocupa 40 hectares do município de Piraputanga, numa bacia onde começa o Pantanal. Inaugurada há um ano, a propriedade está emparedada entre a Serra de Santa Bárbara e o Morro Azul.
França era do ramo de joias em Campo Grande, foi passar uma temporada na Europa e voltou com uma ideia. “A uva precisa destes dois fatores: amplitude térmica e a ausência de chuvas. Tudo o que temos aqui.”
A vinícola recebe até 120 turistas por dia do Brasil e do mundo, em busca de diversão longe das onças e capivaras. Há opções de piqueniques, menu harmonizado com vinhos nacionais (em breve, os dela), passeio pelas vinhas e até passeio a cavalo. Um menu degustação harmonizado pode chegar a R$ 240, incluindo três entradas, prato principal e sobremesa.
A Terroir Pantanal é o primeiro de dez pontos da Rota Gastronômica Pantaneira de Paulo Machado. O manejo das uvas respeitará o método da dupla poda, que vem dando certo em lugares como o interior de São Paulo, cuja produção ganhou até selo de origem. A primeira leva será de 20 mil garrafas.
**Linguiça de Maracaju**
R. Espírito Santo, 1.443, centro. Mais informações no site.
**Território do Vinho**
R. Euclides da Cunha, 485, centro. Mais informações no site.
**067**
Aeroporto Internacional de Campo Grande – G8VJ+32 – Vila Taveiropolis
**Les Amis**
R. José Antônio, 644, centro. Mais informações no site.
**Pizza do Jorge**
R. Vitório Zeola, 52, Carandá Bosque. Mais informações no site.
BRUNO CALIXTO / Folhapress