SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Reforma Tributária modifica os principais impostos e contribuições sobre o consumo. Uma nova versão do texto foi apresentada pelo relator Eduardo Braga (MDB-AM) no Senado.
Veja quais as principais mudanças para consumidores, empresas e entes públicos.
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Vou pagar mais impostos depois da reforma?
Não. A reforma prevê a manutenção da carga tributária atual sobre o consumo. Mas essa tributação será redistribuída: alguns bens e serviços terão redução de carga, e outros terão aumento.
Cálculo do Ipea e do Banco Mundial apontam que os 10% mais ricos vão pagar mais tributos. Os outros 90% da população terão uma carga tributária menor.
O preço de remédios, alimentos, escolas e transporte público vai subir?
Não. Esses quatro tipos de bens e serviços estão na lista dos que terão tributação 60% menor ou isenção. O governo calcula que, com isso, a carga desses itens fica igual à atual ou pode ser reduzida.
O que vai acontecer com o preço dos produtos da cesta básica?
O relator da Reforma Tributária no Senado decidiu criar duas categorias de tributação da cesta básica, uma delas totalmente isenta do novo tributo e a outra com uma alíquota reduzida em relação à cobrança integral.
Segundo Braga, a alíquota zero valerá para a chamada Cesta Básica Nacional. Já a cobrança reduzida será aplicada sobre a cesta básica estendida, que poderá incluir uma lista maior de produtos.
Como vai funcionar o cashback? Quem terá direito à devolução dos créditos?
A proposta prevê a “hipótese” de devolução de parte dos dois novos tributos sobre o consumo a pessoas físicas, o “cashback do povo”. Os limites e beneficiários são definidos no momento de regulamentação da reforma, o que deve ocorrer em 2024.
O Devolve ICMS do Rio Grande do Sul prevê o mínimo de R$ 100 por trimestre a todas as famílias do Bolsa Família, mais um complemento que varia de acordo com os gastos no período. Isso representa um acréscimo de 17% na renda de 95% dos 618 mil beneficiários.
Como será a tributação de planos de saúde, imóveis, turismo, restaurantes e aviação?
Alguns setores e produtos terão regras específicas para recolher os novos tributos, com objetivo de manter a tributação atual. A forma de cobrança ainda não está definida.
Entre eles: combustíveis e lubrificantes, serviços financeiros, imóveis, planos de saúde, loterias, cooperativas, serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, restaurantes e aviação regional.
O preço dos combustíveis vai aumentar?
Entidades empresariais chegaram a manifestar temor de alta dos combustíveis, mas especialistas dizem que o comportamento dos preços ainda é incerto a partir das possíveis mudanças na legislação.
O setor terá um sistema próprio de tributação, com objetivo de manter a carga atual. A tributação será a mesma em todo o território nacional.
Quais os benefícios fiscais que serão mantidos?
Estão mantidos o Prouni (bolsas para educação), a Zona Franca de Manaus e o Simples Nacional.
Como fica o imposto de energia e telecomunicações?
Para as empresas, esses insumos passam a gerar crédito tributário, reduzindo a carga final dos seus produtos e serviços. Esses setores também poderão usar crédito para eliminar a tributação em cascata.
Como fica a tributação dos serviços de streaming?
O serviço de streaming tem hoje uma tributação menor que TV a cabo, energia e internet. Agora, será a mesma.
Qual a redução de imposto para os mais pobres?
O Ipea estimou que uma alíquota única já diminui a carga dos mais pobres sobre os tributos da reforma. Com o cashback (devolução do imposto), é possível reduzi-la pela metade.
Produtos como cerveja e cigarro vão ficar mais caros?
Eles serão mais tributados que outros itens, como já acontece hoje. Será criado um imposto seletivo, que será aplicado sobre produtos considerados prejudiciais à saúde, como cigarros e bebidas alcoólicas, além de itens prejudiciais ao ambiente.
A Reforma Tributária vai gerar inflação?
O Ministério da Fazenda calcula que, na média, a reforma tem efeito desinflacionário. Ao eliminar distorções e possibilitar uma melhor organização da atividade econômica, reduzirá custos dos empresários e, com isso, permitirá a redução de preços ao consumidor final.
A Reforma Tributária vai acabar com os empregos?
Segundo o Ministério da Fazenda, a reforma vai gerar um crescimento adicional da economia estimado entre 12% e 20%, num período de 10 a 15 anos. Isso significa em média R$ 470 de renda a mais por mês para cada brasileiro, além de 12 milhões de novos empregos.
A reforma prejudica as empresas do Simples Nacional e os MEI, como manicures e cabeleireiros?
Não. O Simples Nacional e o MEI serão mantidos. As micro e pequenas empresas podem adotar o novo sistema da reforma apenas para recolhimentos dos novos tributos, aproveitando créditos de insumos. Essa é uma boa opção para quem tem clientes que também são pessoas jurídicas.
A outra opção é continuar a recolher tudo dentro do Simples no sistema cumulativo, o que pode se aplicar a pequenos comércios e prestadores de serviços.
Nos dois casos, o imposto recolhido na venda para outra empresa vira crédito para esse cliente, o que pode reduzir o preço de alguns serviços.
A Reforma Tributária vai prejudicar o agronegócio?
Não. O setor deve estar entre os mais beneficiados. Pequenos produtores rurais, que representam quase 99% dos estabelecimentos agropecuários, estarão isentos, assim como as cooperativas.
O exportador agropecuário terá a devolução do tributo quando o produto for vendido para outro país. Hoje, nem todo o dinheiro é devolvido.
Além disso, há resíduos tributários embutidos no preço dos insumos que representam cerca de 12% do preço.
A Reforma Tributária vai prejudicar o setor de serviços?
Estima-se que o impacto de aumento da carga fique restrito a cerca de 1% das empresas do setor, mas que os benefícios econômicos da reforma aumentem a demanda por serviços.
Para os prestadores que fazem parte do Simples (cerca de 90%) a adesão ao novo sistema é opcional e pode até reduzir sua carga.
Os serviços de meio de cadeia, aqueles prestados a empresas, terão redução de custo, pois os prestadores desses serviços passarão a se creditar dos impostos pagos por seus fornecedores e transferir integralmente o crédito para os tomadores de seus serviços.
Serviços como saúde, educação e transporte público receberam tratamento favorecido.
A reforma tira a autonomia dos estados e municípios?
Estados e municípios vão gerir um tributo compartilhado (IBS), que é a fusão do ICMS com o ISS.
Cada governador e prefeito terá liberdade para reduzir a alíquota geral, mas não poderá discriminar o setor que será beneficiado. Estímulos ao desenvolvimento terão de ser feitos agora via orçamento, de forma transparente, não com distorções no sistema tributário.
Produtos que têm uma cadeia de produção mais longa e empresas que compram mais insumos vão pagar menos tributos?
Não. A reforma acaba com a cumulatividade e faz com que a tributação seja a mesma, independentemente do tamanho da cadeia e da quantidade de insumo. Terá mais crédito tributário a empresa que pagou mais imposto na etapa anterior de produção.
Há quanto tempo a Reforma Tributária do consumo está em discussão?
Desde e a Constituinte de 1988 já houve várias tentativas de implementar no Brasil um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) nesse formato.
A proposta atual (PEC 45) foi apresentada em 2019 pela Câmara dos Deputados. O texto atual também incorpora parte da proposta do Senado de 2019 e do projeto de governo Jair Bolsonaro de 2020.
Quando a reforma entra em vigor?
A transição para o novo sistema tributário deve começar em 2026 e estará completa em 2033. Veja a previsão para os próximos passos:
– 2023: aprovação das mudanças na Constituição
– 2024: votação das leis que vão regulamentar a reforma
– 2025: montagem da infraestrutura do novo sistema
– 2026: cobrança de alíquota teste de 0,9% para a CBS (contribuição federal) e de 0,1% para o IBS (imposto de estados e municípios), com redução equivalente do PIS/Cofins
– 2027: substituição do PIS/Cofins pela nova CBS; extinção do IPI (exceto para produtos que tenham industrialização na Zona Franca de Manaus, cigarros e bebidas)
– 2029 a 2032: redução de 1/10 por ano nas alíquotas do ICMS e ISS, com elevação gradual do IBS
– 2033: extinção do ICMS e do ISS; substituição do IPI pelo Imposto Seletivo
Quais países utilizam esse sistema?
O modelo de IVA proposto está presente em mais de 170 dos 193 países do mundo.
Por que todos os países da União Europeia usam o IVA?
A maioria dos seis países originais da União Europeia usava diferentes formas de tributação indireta, com impostos em cascata. Isso criava um entrave à ideia de ter um mercado único.
Quando há impostos em cascata (tributo incidindo sobre tributo) é impossível determinar o valor real do imposto efetivamente incluído no preço final do produto.
Com isso, há o risco de um país subsidiar (deliberada ou acidentalmente) suas exportações, superestimando os impostos reembolsáveis. Normalmente, a venda a outros países é desonerada com a devolução do tributo recolhido na cadeia de produção.
Para criar um mercado único e eficiente, segundo a União Europeia, era necessário um sistema tributário transparente, que garantisse a neutralidade tributária e permitisse o desconto do valor exato do imposto de exportação.
Como são as alíquotas na União Europeia?
A legislação da UE exige que a taxa geral do IVA seja de pelo menos 15%. A alíquota reduzida deve ser de pelo menos 5%, aplicada a uma lista de bens e serviços (não de setores) definida pelos países.
Alguns países mantiveram outras taxas para produtos específicos. A Comissão Europeia é responsável por assegurar a correta aplicação das regras.
EDUARDO CUCOLO / Folhapress