LOS ANGELES, EUA (FOLHAPRESS) – Os motores foram ligados pela quinta vez, e a saga “Mad Max” retorna aos cinemas nesta quinta-feira, quase dez anos após “Estrada da Fúria”, o último filme da série. Mas, dessa vez, ela está mais introspectiva.
Há, sim, veículos monstruosos cruzando um deserto imenso, sequências de ação perfeitamente coreografadas, e explosões que jogam toneladas de gasolina pelos ares, mas também há silêncios e um tempo de reflexão que não se via na série pós-apocalíptica criada por George Miller desde “Mad Max 2: A Caçada Continua”, de 1981.
Diferente de “Estrada da Fúria”, o celebrado filme que levou seis Oscar em 2015 pela sua adrenalina incansável, a quietude dos personagens de “Furiosa: Uma Saga Mad Max” também exibido durante o Festival de Cannes contrasta com o ronco ensurdecedor dos carros, motos e caminhões envenenados.
É um silêncio que emana da protagonista, papel de Anya Taylor-Joy. A atriz, a cargo de viver uma versão mais jovem da personagem crua e feminista que Charlize Theron encarnou há nove anos, tem só 30 linhas de diálogo no filme de duas horas e vinte minutos.
“Quando conhecemos a Furiosa que eu interpreto, ela está fingindo ser um menino, está tentando ser invisível”, diz Taylor-Joy. “Ao mesmo tempo, ela sempre soube do que era capaz, inclusive fisicamente.”
A violência é quem conduz a narrativa, enquanto várias pequenas sociedades desse mundo tentam obter recursos básicos como água, combustível e armamento, além de defender seus semelhantes. O tema acompanha a saga desde o seu início em 1979.
O Max original, eternizado por Mel Gibson, enlouquece ao ver sua família ser morta por saqueadores. Da mesma forma, Furiosa vai em busca de vingança após ver sua mãe ser crucificada pela gangue de Dementus, o vilão interpretado por Chris Hemsworth.
Acompanhamos a personagem desde a infância vivida pela jovem Alyla Browne, quando é raptada e sua mãe tenta resgatá-la. Pequena e aparentemente frágil, seu corpo enrijece conforme aumenta sua sede de vingança, se traduzindo em gestos mais firmes e violentos quando Taylor-Joy assume o papel, pela metade do filme.
É um caminho oposto ao tomado pelo seu nêmesis e sequestrador, Dementus, cujo corpo bombado vai minguando ao longo da história, conforme é corroído por sua ambição.
“Meu personagem tem essa aura de imperador, ele se apresenta como uma solução para os problemas que seus seguidores estão enfrentando”, diz o ator. “Ele quer atenção como um pavão”.
Essa busca pela sobrevivência a qualquer custo é embalada pela aridez do deserto da Austrália, como confirma a cena inicial, com uma tomada ampla desse território.
“O filme começa no centro da Austrália pela questão do isolamento”, diz o diretor George Miller. “Os personagens não sabem se sobrou mais alguém no resto do mundo 45 anos depois do apocalipse, não sabem nem se as pessoas no litoral estão vivas.”
Além da gangue de Dementus, Furiosa vai se envolver com a sociedade liderada por Immortan Joe, o grotesco vilão introduzido em “Estrada da Fúria”, de cabeleira platinada e uma máscara de ar dentuça.
Dentre as tribos desse mundo, a dele é que controla os principais postos de refino e de produção de munição, além de ter um vasto exército de guerreiros suicidas e tecnologia para tratar as mulheres como reprodutoras e produzir leite.
“Immortan Joe está sempre acima de todos em sua cidadela e, por outro lado, Dementus é um nômade que tem motos em vez de cavalos, e atravessa o deserto à base de saques”, afirma Miller.
No meio do caminho, Furiosa cria uma relação com um dos guardas-motoristas de Immortan Joe, Jack Tom Burke, que lhe instrui a como sobreviver em meio ao caos. É uma conexão de cuidado e sacrifício, mas é quase meditativa, com afetos que se resumem apenas à marca registrada do povo de Furiosa o encostar de testas.
“Isso foi algo que discutimos nas nossas duas primeiras semanas de ensaios porque, originalmente, a cena entre mim e Tom Burke tinha sido roteirizada de forma diferente”, diz Taylor-Joy. “Foi aí que percebemos que, nesse apocalipse, o toque físico é muito associado à violência, por isso que pressionar as testas tem um peso tão grande, você começa a entender o que significa para essas pessoas se tocarem desse jeito”.
Miller afirma ainda que as ações dos personagens da saga têm sempre uma conotação de esperança, por mais que eles mesmos digam o contrário. “A esperança é a única coisa que nos mantém vivos. Neste filme, Dementus diz que não há esperança, mas sempre há um tipo dela que é muito frágil e implacável. É quem somos como seres humanos.”
As diferenças de “Furiosa” em relação ao longa anterior, porém, não se resumem apenas a maiores respiros entre as cenas de ação. O uso de computação gráfica no novo filme é maior, uma resposta aos problemas de produção que “Estrada da Fúria” enfrentou.
Miller disse em 2015 que 90% das cenas de ação foram rodadas de efeitos práticos, deixando a computação gráfica funcionando como um retoque final.
Diante da dificuldade que é dirigir cenas de ação com explosões reais e coordenação de dublês, a quantidade de efeitos práticos em Furiosa diminuiu consideravelmente e as críticas surgiram desde a divulgação do primeiro trailer. Mas não diminuem o resultado.
Atingindo o equilíbrio entre ação, existencialismo e um bom uso de efeitos digitais, a “prequel” de “Estrada da Fúria” desperta em George Miller o que ele tem de melhor a habilidade de contar histórias tão diferentes.
“Qual é o cerne do personagem heroico? A pessoa que renuncia aos seus próprios interesses em prol de um bem maior. É o que acontece com Babe [do filme “O Porquinho Atrapalhado”, de 1995], é o que acontece com Mumble em “Happy Feet” [animação de 2006]. É o que acontece com Furiosa nesta história”, diz. “Ela passa por grandes provações, cai em desespero, mas emerge do outro lado, não tanto para seu próprio benefício, mas para o dos outros. Furiosa entrega às pessoas a chance da esperança.”
A jornalista viajou a convite da Warner Bros.
FURIOSA: UMA SAGA MAD MAX
Quando Estreia nesta quinta (23) nos cinemas
Classificação 12 anos
Elenco Anya Taylor-Joy, Chris Hemsworth, Tom Burke
Produção Austrália, Estados Unidos, 2024
Direção George Miller
ISABELLA FARIA / Folhapress