SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Como o Brasil virou o país das bets (e por que isso é preocupante), investidores que ganharam com a queda da Americanas e outros destaques do mercado nesta segunda-feira (11).
**O PAÍS DAS BETS**
O crescimento das apostas esportivas online fez do Brasil o país das bets. Pelo menos 15% do total de visitas a sites do tipo são feitas aqui.
Nenhum outro país tem percentual maior, segundo a provedora de análises SimilarWeb.
ENTENDA
Liberadas há seis anos, as bets tiveram crescimento exponencial desde então. Pelo menos 15% dos brasileiros dizem fazer ou já ter feito apostas online, segundo o Datafolha.
– R$ 263 é o gasto médio mensal de quem joga, de acordo com a pesquisa;
– 24 milhões de apostadores mais de 10% da população foram registrados pelo Banco Central em agosto;
– R$ 20 bilhões foi a soma do que eles gastaram em um único mês, de acordo com o BC.
O Brasil é o sétimo país com maior valor destinado para apostas online. EUA, Japão e Reino Unido lideram o ranking.
PEDALA
As bets estão liberadas por lei desde 2018. A legislação da época previa a regulamentação da atividade em até dois anos, o que não foi feito. Apenas em 2023, o governo enviou uma medida provisória criando regras e obrigações para as empresas.
– 12% é a taxa para os sites sobre o rendimento bruto das apostas;
– 15% é a alíquota cobrada nos prêmios ganhos;
– R$ 30 milhões é o valor pago pelas empresas ao governo para operar no país.
A previsão do Ministério da Fazenda era arrecadar cerca de R$ 12 bilhões por ano com impostos.
DONA DA BOLA
As empresas apostaram no mercado promissor para elas no país e investiram em publicidade na internet, televisão e em patrocínios. Pelo menos 80% das equipes das séries A e B do Brasileiro têm bets estampadas na camisa, o que soma R$ 1 bilhão.
AZAR
O boom gerou uma série de contestações sobre os efeitos nocivos dos jogos de azar na saúde mental e nas finanças das pessoas e, por consequência, do país. Pesquisas mostraram que
Apostas freiam compra de arroz e feijão na população de baixa renda.
Pessoas deixam de comer pizza e adiam compra de cama para jogar.
Brasileiros perderam R$ 23,9 bi com apostas em 12 meses
**O PAÍS DA ESTABILIDADE**
Com menos funcionários públicos em relação à sua população e às pessoas ocupadas que muitos países, o Brasil é um dos que mais gastam com servidores como proporção do PIB e que dá mais plena estabilidade à categoria.
Cerca 65% dos 12,1 milhões de funcionários públicos no país são concursados e estão sob regime estável.
LÁ FORA
Alemanha, Reino Unido e Suécia têm menos servidores com estabilidade. Nesses países, grande parte do funcionalismo é regida por normas mais parecidas às do setor privado, mas com algumas vantagens e segurança no cargo.
Lá a plena estabilidade é garantida apenas a carreiras específicas, como do Judiciário.
NO BRASIL
Aqui estão protegidos desde juízes e policiais federais (carreiras consideradas típicas do Estado) a professores, enfermeiros e pessoal administrativo, posições amplamente encontradas no setor privado.
No governo federal, três quartos dos servidores (a maioria com estabilidade) atuam nas áreas social (como professores e médicos) e administrativa (secretárias, por exemplo).
Nas áreas jurídica, policial e de regulação, auditoria e controle, sem equivalentes no setor privado e típicas do setor público (com “poder de Estado”), são 11,2%.
O Brasil também apresenta uma série de distorções e privilégios salariais no serviço público. Os maiores rendimentos estão concentrados nos Poderes Judiciário e Legislativo federais.
Os menores salários estão na ponta do serviço público, que atende diretamente a população no dia a dia.
Nos municípios, a grande maioria dos servidores recebe menos de R$ 5.000 ao mês; nos estados, R$ 7.500. Na máquina dos servidores públicos do Executivo federal, os salários variam de R$ 5.000 a mais de R$ 15 mil.
**QUEM LUCROU COM AMERICANAS**
Uma reportagem da Folha revelou que não foram apenas ex-executivos da Americanas acusados por usos de informação privilegiadas que lucraram com a queda nas ações da empresa após escândalo contábil, descoberto em janeiro de 2023.
O inquérito da investigação mostra casos de uma confeiteira, um designer e um agrônomo que lucraram ao apostarem que os papéis cairiam.
LUCROS…
Uma das investidoras citadas, por exemplo, ganhou R$ 649,4 mil com uma operação conhecida como venda a descoberto, considerada uma das mais arriscadas no mercado financeiro.
Venda a descoberto consiste em apostar na queda das ações. O investidor faz uma operação que lhe permite vender um ativo que não tem em sua carteira. Se o preço cai, ele lucra. Se o preço sobe, ele perde.
Ex-funcionária de uma confeitaria no Espírito Santo, ela tem hoje 23 anos. Em setembro de 2023, processou o antigo empregador, fechando acordo para receber cerca de R$ 10 mil.
Procurada pela reportagem, disse ter aprendido a operar com um amigo que a orientou a colocar um pequeno valor na conta e começar a negociar.
“Fazia isso constantemente e, às vezes, dava certo, tanto que depois perdi tudo fazendo a mesma operação na Light Energia”, disse por mensagem de WhatsApp. “Só fui uma curiosa e perdi tudo”, disse.
Lembra? A crise na Americanas foi deflagrada em 11 de janeiro de 2023, quando o CEO Sergio Rial renunciou ao cargo e revelou inconsistências contábeis. Isso levou ao pedido de recuperação judicial com uma dívida de mais de R$ 42,5 bilhões.
↳ A companhia tem negociado com credores um plano de reestruturação para para evitar a falência.
INVESTIGAÇÕES
A Polícia Federal apura se houve manipulação deliberada nas demonstrações financeiras da empresa. Já a Comissão de Valores Imobiliários acusou oito ex-executivos de insider trading, o uso indevido de informação privilegiada no mercado de capitais.
O ex-CEO Miguel Gutierrez e os ex-diretores Anna Saicali, Marcio Cruz e José Timotheo de Barros estão entre os acusados.
**O QUE MAIS VOCÊ PRECISA SABER**
MERCADO
‘Trump trade’ favorece investimento em renda fixa nos EUA, dizem analistas; veja como aplicar dinheiro. Medidas como tarifação de importados devem gerar inflação e tendem a elevar juros.
PARTIDO REPUBLICANO
Dez impactos esperados na economia após a eleição de Trump nos EUA, da inflação ao emprego. Presidente americano eleito promete taxar importados e outras políticas protecionistas.
VICTOR SENA / Folhapress