SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Inaugurado em 1961, o Teatro Oficina se impôs como um dos pontos turísticos de São Paulo graças a dois pontos a arquitetura pensada por Lina Bo Bardi, que transformou o espaço em uma espécie de continuação da rua Jaceguay, no bairro do Bexiga, e a programação histórica que abrigou, ao longo de mais de 40 anos, encenações assinadas e produzidas pelo diretor José Celso Martinez Corrêa, o Zé Celso.
De 1967 a 1972, Zé Celso, morto nesta quinta-feira (6) vítima de um incêndio em seu apartamento, foi o principal líder da rebelião cultural do Teatro Oficina na arte brasileira. O ciclo transgressor engloba as montagens de “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade, “Roda Viva”, de Chico Buarque, “Galileu Galilei” e “Na Selva das Cidades”, de Bertolt Brecht, “Gracias, Señor”, uma criação coletiva, e “As Três Irmãs”, de Anton Tchekhov.
O edifício de Lina Bo Bardi foi inaugurado no início da década de 1990, poucos após o espaço ser tombado como patrimônio cultural. O projeto fez com que o Oficina se tornasse também uma espécie de point arquitetônico estudado em universidades e celebrado ao redor do mundo. Em 2015, o jornal britânico The Guardian considerou o prédio como o melhor projeto arquitetônico do mundo.
O edifício fincou o espaço cênico como uma parte da cidade, projetando o palco como uma passagem da rua, que dá acesso à Japurá, também no Bexiga.
Um dos poucos teatros de grupo, responsável por abrigar quase que exclusivamente espetáculos da companhia Oficina Uzyna Uzona, o espaço tem uma longa história com a capital paulista como um ativo cultural a partir dos anos 1960.
Quando Zé Celso e Renato Borghi se conheceram na Faculdade de Direito São Francisco, fundando o Oficina ao lado de nomes como Etty Fraser, Amir Haddad, Fauzi Arap e Ronaldo Daniel, o espaço rapidamente se tornou um point da classe teatral, com encenações como “Um Bonde Chamado Desejo”, “Pequenos Burgueses” e Quatro Num Quarto”.
O espaço começou mesmo a ganhar destaque na cidade após se recuperar de um incêndio com a histórica montagem de “O Rei da Vela”, que, em 1967, fez do Oficina não apenas um dos teatros mais importantes da cidade, mas também um ponto obrigatório a ser visitado por aqueles ligados à cultura, à luta contra a ditadura ou por detratores que tentavam vandalizá-lo.
No mesmo ano, após invadir o Teatro Ruth Escobar e agredir o elenco do musical “Roda Viva”, também dirigido por Zé Celso, o CCC, Comando de Caça aos Comunistas, tentou invadir também o Oficina, sem sucesso, pixando os muros do espaço contra a montagem de “O Rei da Vela”.
Com montagens recorrentes, o espaço passou a levar um público massivo ao bairro e se transformou em um ponto turístico do guia cultural de São Paulo. Encenações estreladas por nomes como Raul Cortez, Bete Coelho e Leona Cavalli, além do próprio Zé Celso, fizeram com que o Bexiga ganhasse um novo rosto ao longo das décadas de 1990 e 2000.
Tombado como patrimônio da cidade e do Estado de São Paulo, o Teatro Oficina ganhou também a simpatia e a torcida do público, sempre apto a participar de vaquinhas para manter o espaço vivo.
A mobilização da opinião pública é tamanha que vem atrasando continuamente o sucesso do grupo do apresentador Silvio Santos na Justiça. O empresário pretende construir prédios de até cem metros de altura no entorno, mas as obras poderiam danificar as estruturas do espaço, além de inutilizar o janelão de 100 metros quadrados que ilumina o teatro.
Isso se dá pelo fato de o Oficina fazer parte de uma espécie de grupo de espaços que mantém ao menos um trecho do centro de São Paulo vivo, com pessoas circulando sem o m edo do deslocamento após as ações fracassadas do governo de João Dória, que pulverizou a Cracolândia em outros pontos da cidade.
Até o momento, as negociações seguem paralisadas na Justiça, mas devem ganhar um novo capítulo com a morte do diretor. Isso porque, meses atrás, Zé Celso oficializou sua união com o ator e também diretor Marcelo Drummond, fazendo do artista seu único herdeiro e, portanto, o novo detentor do Teatro Oficina.
BRUNO CAVALCANTI / Folhapress