Como Tiago Abravanel, no musical ‘Hairspray’, discute gordofobia nos palcos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Se é preciso ter peito para discutir gordofobia com leveza, Tiago Abravanel pode ficar tranquilo. Para encarnar sua personagem no musical “Hairspray”, que também dirige, o ator carrega um par de seios enormes, garantidos por um bojo que ele veste para o espetáculo.

O ator vive Edna Turnblad, mãe da protagonista Tracy Turnblad, jovem gorda que disputa um lugar num programa da televisão local de Baltimore, em Maryland, nos Estados Unidos, com seus passos de dança, desafiando ideias sobre os limites dos corpos maiores e conquistando um galã no processo -além de acabar lutando em defesa a população negra da cidade, que a ensina sobre ter confiança.

Diferente da filha, que não é insegura com sua aparência e chega a ser ingênua quanto à violência do mundo, Edna podou seus sonhos por acreditar que, por ser uma mulher gorda, não poderia realizá-los. Cabe a Tracy mostrar à mãe que elas podem, sim, ir atrás do que querem. Como a garota aprende com a cantora negra Motormouth Maybelle, se não é possível passar despercebida, o melhor é se fazer presente.

A personagem de Abravanel costuma ser interpretada por homens e já foi vivida nos cinemas por John Travolta, numa adaptação de 2007, e pela drag queen Divine, na primeira versão do musical para as telas, em 1988. Vânia Canto, amiga de faculdade do ator, foi escalada para viver a filha.

“Ela ainda é uma menina, mas estamos vendo a juventude de uma futura líder”, diz a atriz sobre a personagem. “A minha tese é que uns anos depois ela vai estar queimando sutiã no movimento hippie.”

Abravanel diz que fazer “Hairspray” é um sonho antigo, cultivado desde que ele viu os vídeos da primeira montagem do espetáculo, que estreou na Broadway em 2002 e continuou em cartaz por seis anos. Ele chegou a interpretar Edna num curso da Teen Broadway e a participar da última versão do musical no Brasil, em 2009, mas continuava com a sensação de que faltava alguma coisa.

Para a nova montagem, algumas passagens e piadas foram alteradas para adequar o material aos dias de hoje. O visual da protagonista também foi repensado para que ela não esteja mais na posição de alívio cômico e tenha sua elegância ressaltada.

“A gente decidiu remontar com a perspectiva de um momento em que a gente já fala muito de gordofobia na mídia, uma discussão que em 2009 não era tão aberta”, diz Abravanel. “O enredo está inteiro lá, nada é passado de maneira branda. A ideia foi só tirar momentos em que a ofensa é normalizada. Quando é para denunciar, está tudo lá”, acrescenta Vânia Canto.

Quando fez parte da versão de 2009, Abravanel chegou a convidar Canto para participar, mas ela não passou na audição, que foi a sua primeira da vida. A experiência, no entanto, serviu para alimentar seu interesse pelo teatro musical, que hoje é seu ganha-pão.

“‘Hairspray’ tem tudo a ver com a minha história, nesse lugar de ocupar o meio artístico como um corpo gordo. Muitas vezes, a gente tem que ser muito mais do que os corpos magros para conseguir esse espaço, principalmente para dançar num musical”, ela afirma.

“Para a gente, não é surpreendente fazer o que a gente faz. Estudamos bastante para isso”, acrescenta Abravanel. “Mas é um choque para outras pessoas, que não conseguem compreender que isso pode acontecer. Quem inventou essa chatice de padrão? Qual é a referência?”

Ele afirma ter recebido com espanto elogios do elenco e de profissionais que compareceram às audições e se surpreenderam com a forma como foram bem tratados, que ele e Canto dizem nem sempre ser a realidade para as pessoas gordas no mundo dos musicais.

O diretor defende a importância de entender que a peça, tal qual o movimento contra a gordofobia, não discutem saúde, mas respeito. “Não estamos levantando a bandeira ‘seja gordo você também!’. Estamos dizendo que somos pessoas que merecem viver na mesma condição que todo mundo.”

“Obviamente uma pessoa gorda tem propensões a ter várias questões, mas por que você tem o direito de ser visto como uma pessoa saudável, mesmo que tenha um monte de problema, e eu, com meus exames que estão ótimos, sou visto como uma pessoa doente?”, ele questiona.

HAIRSPRAY EM SÃO PAULO

Quando Qui. e sex., às 20h; sáb. e dom., às 15h e 20h. De 5 a 29 de setembro

Onde Teatro Renault – av. Brigadeiro Luís Antônio, 411, São Paulo

Preço De R$ 39,6 a R$ 350

Direção Tiago Abravanel

Link https://sales.ticketsforfun.com.br/#/event/hairspray-tr-2024-09

DIOGO BACHEGA / Folhapress

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