BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados adotou na quarta-feira (28), no caso de Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), uma postura contrária à que chancelou no caso de André Janones (Avante-MG), absolvido da suspeita de prática de ‘rachadinha’.
No caso do parlamentar mineiro, o órgão deu aval, por maioria, à tese do relator do processo, Guilherme Boulos (PSOL), de que não há que como falar em quebra de decoro parlamentar por supostos atos cometidos antes da assunção do mandato.
Candidato a Prefeito de São Paulo e aliado de Janones, Boulos chegou a afirmar que essa era uma jurisprudência do conselho, o órgão responsável por analisar condutas disciplinares dos parlamentares.
A defesa de Brazão chegou inclusive a recorrer ao caso de Janones para pedir o arquivamento do caso. Mas, por unanimidade, o conselho rejeitou a tese e aprovou por 15 votos a 1 o relatório pela cassação do mandato do parlamentar.
Brazão está preso desde março sob a acusação de ser um dos mandantes do assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. O crime foi cometido em março de 2018, quando o hoje deputado federal era vereador no Rio de Janeiro. Ele nega.
A aprovação do relatório foi chancelada pelo PSOL, partido de Boulos e ao qual Marielle pertencia.
Relatora do caso de Brazão, a deputada Jack Rocha (PT-ES) afirmou que o mandato não pode servir de salvo-conduto para atos criminosos.
No final do ano passado, foram revelados pelo site Metrópoles áudios de 2019 em que Janones pedia a assessores a devolução de parte de seus salários, esquema conhecido como “rachadinha”. À Folha, dois ex-assessores do deputado afirmaram que o parlamentar embolsou parte dos salários pagos a auxiliares.
Janones confirmou, na época, que os áudios eram verdadeiros, mas disse que se referiam a período em que ainda não era deputado e negou ter cometido qualquer ilegalidade.
Depois de reveladas as gravações, Boulos foi sorteado para ser o relator de processo disciplinar aberto no Conselho de Ética e votou pelo arquivamento da representação.
“Não há justa causa, pois não havia decoro parlamentar se não havia mandato à época, o que foge do escopo, portanto, do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar”, disse, em seu voto.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, porém, não há no regimento da Câmara ou no Código de Ética nada nesse sentido, nem jurisprudência.
Além disso, todas as evidências apontam para o fato de que Janones já tinha tomado posse de seu primeiro mandato (2019-2023) quando pediu devolução de parte dos salários de assessores, em reunião gravada possivelmente em fevereiro de 2019.
Se a argumentação defendida por Boulos prevalecesse, teria que ser extinta na origem a representação do PSOL contra Chiquinho Brazão.
Também seriam desconsiderados os pedidos contra Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que foi investigado por suspeita de “rachadinha”, e quatro deputados do PL que teriam estimulado as depredações de 8 de janeiro.
Em todos esses casos, os crimes dos quais eles são ou eram acusados dizem respeito a período anterior ao exercício do atual mandato no Congresso Nacional.
RANIER BRAGON / Folhapress