SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Hugo Montan, 19, já foi analista de criptoativos em empresas de investimentos, mas deixou o mercado de trabalho neste ano para se dedicar ao vestibular para economia. Na semana passada, ele colocou os livros de lado por alguns momentos para entrar na onda de memes que satirizam o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
“Sou uma pessoa inteirada politicamente e também gosto de humor”, diz o morador de São José dos Campos (SP), que se classifica como de direita liberal e critica a estratégia do governo de fazer o ajuste das contas públicas pelo lado da arrecadação, com resistências a cortes de gastos.
Em vez de publicar algo no X (antigo Twitter), como milhares de pessoas fizeram nos últimos dias, decidiu ir mais longe: mirou a Times Square, cartão-postal de Nova York repleto de letreiros digitais.
Usou um aplicativo da empresa TSX que permite, remotamente, enviar imagens para um outdoor na região (esse tipo de ação tem se tornado comum entre influenciadores digitais, músicos e até políticos) e pagou o equivalente a R$ 265,13 (incluindo R$ 11,13 de IOF, o Imposto sobre Operações Financeiras).
Não demorou muito até que o ministro aparecesse como “Taxa Humana”, uma sátira do Tocha Humana, do Quarteto Fantástico, no outdoor da Times Square. Apesar de a imagem ali ser do ministro, Montan diz que o protesto é contra o governo como um todo.
“O Haddad fica como um fiador junto ao mercado, mas essa agenda não é necessariamente dele, é do governo inteiro”, diz.
A repercussão do protesto do estudante foi imediata e ajudou a dar força à enxurrada de memes sobre o ministro no X. A terça-feira (19), data da publicação do vídeo, foi o ápice do movimento sobre o tema na rede social de Elon Musk, segundo medição da plataforma Buzzmonitor , com 15.012 menções a “Taxadd”, como o ministro foi apelidado.
Como a Folha mostrou, o fluxo de mensagens sobre o assunto no WhatsApp e no X indicam que o movimento cresceu de modo orgânico nos últimos dias, sem indícios de uma coordenação maior.
“O que aconteceu com esse movimento do Haddad foi mais ou menos isso: pequenos atos políticos que vão se somando e se transformam em uma verdadeira bola de neve. E aí, quando você vê, de repente, você tem um movimento político viral”, diz João Victor Archegas, coordenador do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.
Montan diz que inicialmente “deu muita risada” quando viu a velocidade com que os vídeos da “Taxa Humana” se espalharam nas redes. Depois, “ficou um pouco assustado” com a proporção que a história tomou -até que achou seguro divulgar sua identidade. “Fiquei com medo de alguma represália, mas aí conversei com meus pais e acho que não tem nenhum problema.”
Diante da repercussão dos memes, integrantes do governo e do PT saíram em defesa de Haddad. “Se pegarmos a carga tributária de 2022 para 2023, ela não aumentou, até que caiu um pouquinho”, afirmou o vice-presidente Geraldo Akcmin (PSB).
A presidente do partido, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), falou em “ataques mentirosos da rede bolsonarista” que provam que “a economia do país está melhorando”, o que deixa “a oposição apavorada”.
Em meio a esse cenário, o próprio Haddad anunciou, na quinta-feira (25), um congelamento de R$ 15 bilhões em despesas neste ano, medida necessária para cumprir as regras do arcabouço fiscal. Economistas ouvidos pela Folha classificaram a decisão como positiva, apesar de parte deles não descartar que será preciso fazer novos congelamentos nos próximos meses.
O governo já havia anunciado para 2025 um corte de R$ 25,9 bilhões, após dias de turbulência nos mercados diante da desconfiança crescente dos agentes econômicos quanto ao compromisso do governo em cumprir as regras fiscais.
Para o estudante Montan, o governo deveria mirar em “coisas mais perpétuas”. “Uma reforma administrativa, algo para enxugar a máquina. Dá para fazer isso com uma agenda de esquerda.”
FELIPE MACHADO MAIA / Folhapress