RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) rejeitou nesta terça-feira (26) propostas de acordos para encerrar investigações contra os ex-executivos da Americanas Sergio Rial e João Guerra Duarte Neto por falhas na divulgação do escândalo contábil que deu início à crise da varejista.
Em outra frente, aceitou R$ 2,4 milhões para encerar processo contra a ex-diretora de Relações com Investidores da Americanas Camille Loyo Faria, também por falhas em divulgações, mas do aumento de capital anunciado pela empresa após o estouro da crise.
Ex-presidente da Americanas responsável pela conturbada comunicação do rombo contábil ao mercado, Rial propôs pagar R$ 1,3 milhão para se livrar de processos por não ter observado os deveres de sigilo e de informar corretamente as informações ao mercado.
Duarte Neto queria pagar R$ 600 mil para encerrar a acusação de não ter cumprido o papel de divulgar tempestivamente fato relevante com as informações que Rial havia passado a analistas.
As primeiras informações sobre a situação financeira da companhia foram informadas ao mercado no fim do dia 11 de janeiro de 2023, mas ainda sem maiores detalhes, que foram repassados por Rial em conferência promovida pelo banco BTG na manhã seguinte.
O parecer do comitê da CVM que avaliou os acordos lembra que, durante a fala de Rial que foi destinada a um público restrito diante dos 146 mil investidores que a companhia tinha à época as ações da Americanas derreteram na B3, com queda de até 90%.
“Uma reunião ou conferência realizada com a presença de analistas e agentes de mercado não poderia tratar de informações relevantes não divulgadas ao mercado”, diz o texto, lembrando que Rial nem mesmo era mais presidente da Americanas, pois havia anunciado renúncia na noite anterior.
Ele teria falhado ao dever de guardar sigilo, ao apresentar a um público determinado informações relevantes que não haviam sido divulgadas previamente pela companhia, prossegue o parecer. Além disso, diz a CVM, passou informações incorretas sobre impactos da crise em garantias de dívidas da empresa.
O parecer defende que a quantia oferecida por um termo de compromisso (o instrumento que suspende processos mediante pagamento de multa) tem que ser “proporcional e suficiente o bastante para corrigir o suposto ilícito”, além de inibir a prática de infrações semelhantes.
Assim, disse a CVM, sua área técnica propôs a rejeição do acordo diante “da gravidade, em tese, do caso, e da existência de outros processos/procedimentos em curso na CVM envolvendo o tema de fundo do presente processo”.
Os dois executivos continuarão sendo investigados por falhas ocorridas durante a divulgação da crise. Uma eventual punição não tem implicações penais, mas pode ter impacto na carreira dos executivos em empresas de capital aberto Rial, por exemplo, é conselheiro da distribuidora de combustíveis Vibra.
O advogado David Rechulski, que representa Sergio Rial, afirmou em nota que a decisão “não surpreende minimamente ante a repercussão do caso” e que a possibilidade de acordo se renova nessa nova fase do processo.
“Ao final, será oportuno e conveniente que eventuais tecnicalidades formais sejam superadas pela postura de denunciante de boa-fé, que revelou uma das maiores fraudes da história corporativa do país”, afirma a nota.
No processo contra Camille Loyo Faria, a CVM entendeu que o valor proposto é “conveniente e oportuno, eis que ensejaria desfecho adequado e suficiente, inclusive à luz do tratamento do assunto na apreciação de casos semelhantes anteriores, para desestimular práticas semelhantes”.
Seu processo envolvia proposta de aumento de capital de R$ 7 bilhões da Americanas feita no fim de fevereiro pelos acionistas de referência da empresa, que começaram a ser divulgadas na imprensa em meados de fevereiro mas só confirmadas pela companhia em março.
“No intervalo de tempo entre o vazamento da informação (antes mesmo da divulgação da matéria jornalística) e a divulgação pela companhia das informações pelo meio apropriado, os participantes do mercado passaram a negociar os valores mobiliários em situação de assimetria de informação”, diz a CVM.
Faria argumento que atuou da maneira mais diligente e célere possível, que a companhia passava por um dos momentos mais conturbados e desafiadores da sua história e que divulgou fatos relevantes em um intervalo de tempo razoável.
Em um primeiro momento, propôs pagar R$ 900 mil em multa, mas depois de negociações, acatou a proposta final da CVM.
NICOLA PAMPLONA / Folhapress