SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de autorizar a importação de sementes e o cultivo de cânhamo industrial para fins exclusivamente industriais e medicinais é positiva, mas ainda um pouco acanhada, avaliam especialistas que atuam na defesa da utilização da planta.
Essa variedade de Cannabis na qual a decisão se debruçou é incapaz de gerar efeitos psicotrópicos. Ficou definido pelo tribunal que a regulamentação sobre este tipo de uso ficará a cargo da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e da União.
“Foi uma decisão recuada. A meu ver poderia ampliar a questão do uso industrial, que se encontra em uma zona nebulosa, e não fez. A decisão de hoje reafirma algo que já existia na prática, na importação de insumos…. Mas foi importante reconhecer a ilegalidade da não regulamentação do tema”, afirma Cristiano Maronna, diretor do Justa.
A organização atua no campo da economia política da Justiça e acompanha o debate em torno da descriminalização das drogas para uso próprio.
Existem três usos principais da planta: industrial (construção civil e produção de roupas), medicinal (para tratamento de doenças) e uso recreativo.
Contrário a descriminalização de maconha para fins recreativo, Gustavo Scandelari também elogiou a decisão do STJ.
“Parece um passo na decisão certa porque a decisão de importação da substância para fins medicinais aumenta a oferta desse medicamento para quem realmente precisa”, disse ele, que é coordenador do Núcleo Criminal da Dotti Advogados.
Para ele, isso pode fazer com que no médio prazo esse medicamento seja acessível a um número muito maior de pessoas.
“Tem um baixo teor psicoativo, o que significa que tem um baixo risco relacionado com a drogadição. E espero que após a regulamentação esperamos que seja cumprida para que o cultivo e importação se dê apenas dentro desses usos legais”, diz.
O cânhamo é derivado da mesma planta da maconha, a Cannabis sativa, mas o julgamento não tratou de legalização ou do cultivo de droga para uso recreativo.
“Era uma omissão que gerava a necessidade das pessoas entrarem no judiciário para proteger os seus direitos. O STJ reconheceu a demora de regulamentar este uso e deu seis meses para que ocorra essa regulamentação sobre o tema”, diz Maronna.
Ele lembra que essa discussão se limita as pessoas jurídicas apenas e afirma que é importante ter em mente que ela não afeta o direito de as pessoas procurarem a Justiça para o cultivo artesanal de uma forma lícita.
“Qualquer modelo regulatória precisa contemplar o acesso ao remédio farmacêutico, ligado a decisão de hoje, e de outro lado a produção artesanal. O cultivo individual tem riscos criminais, mas é uma outra forma de acesso para tratar doenças”, afirma.
A causa foi julgada pela Primeira Seção do segundo tribunal mais importante do país. Os processos que tratam do tema da autorização geral para a produção de remédios e produtos à base da Cannabis no país estavam suspensos até a análise da corte.
A corte e instâncias inferiores da Justiça já vinham permitido de maneira isolada o cultivo da planta. Agora, o tribunal decidiu por uma autorização geral para a produção de remédios e produtos.
O processo em questão discutiu a liberação da planta com baixo teor de tetrahidrocanabinol, o THC, que é o princípio ativo com propriedades psicotrópicas.
“A decisão foi positiva. O mais interessante é que a medida não fica voltada com olhar apenas para empresas. Tem as associações também”, avalia o advogado Emílio Figueiredo, que também atua em temas relacionados ao uso da planta.
A ação original sobre o tema foi apresentada por uma empresa que queria autorização para importar sementes ricas em canabinoides para a produção de medicamentos.
Em junho, o STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu a ação que tratou da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e fixou a quantidade de até 40 gramas ou seis plantas fêmeas para diferenciar usuários de traficantes.
Os parâmetros devem servir de critério para as autoridades policiais, que também devem levar em conta outros fatores para decidir se uma pessoa é traficante.
TAYGUARA RIBEIRO / Folhapress