BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O advogado Celso Vilardi, defensor de Jair Bolsonaro (PL), afirmou em julgamento da Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) nesta terça-feira (25) que o ex-presidente não participou de trama golpista e, ao contrário, ajudou na transição do comando das Forças Armadas no final de seu governo.
Ele defendeu a nulidade da delação do tenente-coronel Mauro Cid, dizendo ter havido omissão, mentira e contradição, e cobrou acesso a provas do processo. Também reconheceu a gravidade dos ataques de 8 de janeiro de 2023, mas afirmou não ser possível culpar Bolsonaro.
“Eu entendo a gravidade de tudo o que aconteceu no 8 de janeiro. Mas não é possível que se queria imputar a responsabilidade ao presidente da República o colocando como o líder de uma organização criminosa quando ele não participou do 8 de janeiro. Pelo contrário, ele a repudiou”, afirmou Vilardi.
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Pela manhã, Bolsonaro acompanhou a sessão na corte e ficou na primeira fila. Houve a leitura do relatório de ministro Alexandre de Moraes e a sustentação da denúncia pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, além da manifestação das defesas pela rejeição da peça acusatória.
“Foi o presidente que determinou a transição, que eles [chefes das Forças] atendessem o ministro da Defesa [José Mucio] que assumiria em janeiro. Não é possível dizer que é compatível com uma tentativa de golpe e com o uso do comando militar quando o presidente da República autoriza a transmissão do poderio militar em dezembro [de 2022]”, disse Vilardi.
A defesa de Bolsonaro se aproveita de uma declaração do ministro José Mucio Monteiro no programa Roda Viva, da TV Cultura, em fevereiro. Na ocasião, o atual chefe da Defesa disse que teve dificuldade de conversar com os comandantes das Forças Armadas na transição de governo, em 2022, e pediu ajuda de Bolsonaro para intermediar o contato.
“O fato concreto é que o acusado de liderar uma organização criminosa para dar golpes foi quem socorreu o ministro da Defesa nomeado por Lula porque o comando militar não o atendia”, disse o advogado de Bolsonaro.
Vilardi voltou a criticar a delação de Mauro Cid. De acordo com ele, o tenente-coronel quebrou o acordo no momento em que a revista Veja publicou trechos da colaboração.
“O delator rompeu com o acordo quando vazou a delação e saiu na revista Veja. Diz ele que foi um desabafo. É estranha essa expressão, desabafo, porque, no desabafo, ele diz que não tinha voluntariedade. Isso não é um desabafo. Na versão dele atual, isso teria sido uma mentira”, disse.
Segundo o advogado, a audiência chamada por Moraes em novembro para que Cid tivesse oportunidade de se corrigir seria uma inversão processual. “Não é o Estado que foi buscar as provas de corroboração. O Estado trouxe indícios e ele se adequa aos indícios trazidos pelo Estado.”
São alvos dessa fatia da denúncia, além de Bolsonaro, Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin), Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).
O grupo foi denunciado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado.
O advogado de Braga Netto José Luis Oliveira Lima, também defendeu a derrubada da delação de Cid. O principal, na visão dele, é o fato de o tenente-coronel ter mentido nos depoimentos.
“[Cid] Prestou nove depoimentos e não fala do Braga Netto. Quando estava com risco de perder seu acordo, ele fala um detalhe que era simples: um financiamento do plano. Quer dizer que ele faz nove depoimentos e esqueceu de falar logo disso?”, disse.
A defesa do ex-chefe da Marinha Almir Garnier afirmou que a denúncia contra o militar não apresenta provas concretas de seu suposto apoio aos planos por um golpe de Estado.
O advogado Demóstenes Torres, que é ex-senador, disse ainda que não faz sentido imputar ao militar os crimes do 8 de janeiro. “No caso do crime de dano ao patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado é nonsense. Ele não foi indiciado por isso”, diz.
O advogado Matheus Milanez, que defende Augusto Heleno, comparou a denúncia da PGR com uma série televisiva de cientistas que tentam comprovar que a Terra é plana.
“É o que está acontecendo no presente caso. Por isso que falamos de terraplanismo argumentativo. Se está querendo colocar Augusto Heleno na organização criminosa. O que precisamos produzir de provas? O que nós temos que é possível enquadrar Augusto Heleno aqui? Vamos pegar tudo que for possível para falar que ele fazia parte”, afirma.
Eumar Roberto Novacki, defensor de Anderson Torres, começou reforçando a gravidade dos ataques que depredaram as sedes dos Três Poderes, mas dizendo que a resposta exige serenidade.
“Os atos de 8 de janeiro certamente serão uma mancha na história do Brasil. O STF agiu rapidamente e com a energia necessária para combater os atos gravosos. Passados porém o calor do momento é preciso serenidade para que não venhamos a solapar o devido processo legal”, disse.
A defesa de Ramagem afirmou ao STF que a radicalização do governo Bolsonaro, que incluiu uma trama golpista, ocorreu depois de ele deixar a direção da Abin, quando ele estava focado nas eleições de 2022.
“Durante dois anos e oito meses ele esteve à frente da Abin. A PF fez longa perícia em computadores, telefones usados por ele durante a sua gestão. O que a autoridade policial apresentou foram três arquivos de texto. São indícios extremamente tímidos, singelos, de uma prática muito grave”, acrescentou.
O advogado de Paulo Sérgio Nogueira, Andrew Fernandes Farias, defendeu que a acusação da PGR contra contradiz elementos incluídos ao processo pelas declarações de Cid. O defensor disse que o ex-ministro da Defesa orientava Bolsonaro a não tomar nenhuma atitude sobre discussões golpistas.
Cezar Roberto Bitencourt, defensor de Mauro Cid, se limitou a reforçar o papel do militar para a investigação. “Destaco a sua dignidade, a sua grandeza, a sua participação nos fatos como testemunha, intermediário. As circunstâncias o colocaram nessa situação de delator”, disse.
CÉZAR FEITOZA E ANA POMPEU / Folhapress