Deputada suspeita de ligação com milícia foi chamada de ‘analfabeta política’ e decidiu eleição no Rio

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Afastada sob suspeita de envolvimento com a milícia, a deputada Lucinha (PSD-RJ) tem uma longa trajetória política e foi pivô de um episódio que definiu a eleição mais disputada da história para a Prefeitura do Rio de Janeiro.

Ela foi alvo de comentários do então deputado Fernando Gabeira (PV), que a chamou de “analfabeta política” com uma “visão suburbana” durante a eleição municipal de 2008. Os termos foram usados por Eduardo Paes (PSD) para apontar elitismo do adversário e são considerados até hoje decisivos para garantir o primeiro dos três mandatos exercidos pelo atual prefeito.

Se foram adversários no passado, Lucinha e Paes atualmente são aliados. Além de correligionários, o filho da deputada, Tadeu Junior, o Junior da Lucinha, atualmente é secretário municipal de Envelhecimento Saudável.

Lucinha foi afastada do cargo nesta segunda-feira (18) sob suspeita de atuar como braço político da maior milícia do estado, comandada por Luiz Antônio Braga, o Zinho, que atua nos bairros de Campo Grande, Santa Cruz e Inhoaíba. Ela ainda não se manifestou sobre as investigações.

A atuação política de Lucinha começou na década de 1980, com seu pai Alberto Ferreira Pinto, conhecido como Ferreirinha. Ele foi administrador regional da prefeitura em Campo Grande e tem atualmente uma praça e um escola em seu nome no bairro.

Lucinha sempre participou de associações de moradores da zona oeste, tendo como lideranças políticas os ex-governadores Marcello Alencar e Leonel Brizola e o ex-vice-governador Luiz Paulo Corrêa da Rocha, atualmente deputado estadual pelo PSD.

“Estou perplexo e surpreso. Ela exerce mandato há alguns anos e a luta dela sempre foi pelos interesses comunitários, saneamento, saúde, enchentes, dragagem. Essas lutas comunitárias. É líder comunitária há décadas e conhece a zona oeste como a palma da sua mão. Espero que seja investigado e esclarecido”, disse Luiz Paulo.

Ela foi eleita vereadora pela primeira vez em 1996 pelo PSDB e exerceu quatro mandatos na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. A última eleição para o cargo foi em 2008, quando foi a mais votada.

Neste ano o PSDB estava na coligação de Gabeira, que havia chegado ao segundo turno contra Eduardo Paes, à época ex-deputado do MDB apoiado pelo então governador Sérgio Cabral. Apesar do forte apoio político, o atual prefeito viu o adversário à frente nas pesquisas de intenção de voto.

Ao fim de uma agenda de campanha, no estacionamento do Bangu Shopping, Gabeira atendeu a um telefonema do ator e então vereador Stephan Nercessian, para tratar sobre a proposta de criação de um aterro sanitário em Paciência, bairro da zona oeste.

O projeto sofria forte rejeição de moradores, tendo Lucinha como uma de suas principais críticas. Gabeira mostrou contrariedade pela posição da aliada, que não participou de sua agenda naquele dia na zona oeste. Disse que ela agia como uma “analfabeta política”, tinha uma “visão suburbana” do assunto e que estaria de “salto alto” após ser a vereadora mais votada.

A conversa foi ouvida pela Folha de S.Paulo e pelo jornal O Globo, que publicaram reportagem sobre o tema. Gabeira à época criticou a imprensa, afirmando que fora vítima de “invasão de privacidade”. Disse que o repórter ultrapassou a sua função, “entrando na de detetive policial”. No dia seguinte, pediu desculpas à vereadora.

“Não é racional afirmar que a vereadora mais votada do Rio e a líder estimada na zona oeste seja uma analfabeta política. Pelo contrário, é uma liderança de peso”, disse Gabeira, em nota divulgada pela campanha.

O episódio foi usado à exaustão pela campanha de Paes no subúrbio, apontando elitismo na fala do adversário. O atual prefeito venceu sua primeira eleição para o cargo com uma diferença de 56 mil votos, ou 1,7% dos votos válidos, na disputa mais apertada da história. Até hoje Paes atribui sua primeira vitória ao episódio.

O sucesso em 2008 a fez conseguir, dois anos depois, seu primeiro mandato como deputada em 2010. Ela está em seu quarto mandato na Assembleia.

Ela tem como marca política o grande número de militantes que costuma levar para os seus eventos e dos aliados. O grupo costuma ser animado e gritar palavras de ordem em favor de Lucinha.

A deputada afastada também tem espalhado na zona oeste uma série de centros sociais, nos quais oferece serviços públicos gratuitos a moradores. A prática é alvo de questionamento do Ministério Público Eleitoral) por considerá-lo abuso de poder econômico. Em 2010, três centros dela foram fechados pela Justiça Eleitoral. A reportagem não conseguiu o posicionamento da deputada acerca da investigação da Promotoria.

Em 2017, Lucinha foi denunciada sob acusação de empregar um pedreira que prestava serviço em sua casa no seu gabinete na Assembleia Legislativa. Ele também atuaria num centro social da deputada afastada, segundo o Ministério Público estadual. O caso ainda não foi julgado pelo Tribunal de Justiça. Ela nega as acusações.

ITALO NOGUEIRA / Folhapress

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