SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tentou tornar mais claras nesta terça-feira (1º) falas suas anteriores de que os juros futuros estão exageradamente altos em relação à situação atual das contas públicas.
Os juros futuros expõem as expectativas do mercado para a inflação e para a taxa básica de juros, Selic.
Segundo ele, o exagero não está na desconfiança do mercado em relação à capacidade do novo arcabouço fiscal de estabilizar a dívida pública do país, mas na comparação do Brasil com outros países, tanto os desenvolvidos como os emergentes.
“Quando eu digo que olho a precificação no Brasil e me parece um pouco exagerada não é em relação à desconfiança, vamos dizer assim, do arcabouço no Brasil. É em relação à comparação com outros países. Porque vários países têm também um primário ruim, com uma situação de endividamento”, disse Campos Neto durante evento da Crescera Capital, em São Paulo.
“A verdade é que todos nós precisamos produzir primários positivos para pagar o gasto da pandemia. Mas isso não acontece em nenhum lugar, não é só no Brasil”, afirmou em outro momento.
O presidente do BC brasileiro reafirmou a importância de haver um “choque fiscal positivo” para que o país consiga conviver com taxas de juros mais baixas.
Ele exibiu um gráfico que mostrou, historicamente, o comportamento dos juros futuros frente a decisões políticas que resultaram em uma maior organização das contas públicas ou em um maior relaxamento fiscal.
No período mais recente, a mudança da meta fiscal de 2025 pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) levou a uma alta das taxas.
Segundo Campos Neto, apesar da aprovação do novo arcabouço no início do governo, o Brasil ainda carece de um programa fiscal que gere resultados primários positivos, capazes de levar o Brasil a ter juros mais baixos.
Sem citar as críticas do presidente Lula à forma como sua gestão tem conduzido a política monetária, ele afirmou que um ajuste artificial da taxa básica, sem fundamento na realidade, pode produzir mais inflação, que, por sua vez, corrói o poder de compra dos mais pobres.
“Optar por juros artificialmente mais baixos sem ter a âncora fiscal é equivalente a produzir ajuste via inflação no médio prazo”, afirmou. “E é sempre bom lembrar que esse ajuste é via transferência de renda de quem não consegue se proteger da inflação para quem consegue. Ou seja, uma transferência de renda dos pobres para os ricos”, emendou.
A pauta fiscal tem aparecido com mais frequência não apenas nas falas públicas de Campos Neto como nas comunicações oficiais do Banco Central.
Na ata da última reunião de juros do Copom (Comitê de Política Monetária), divulgada na semana passada, o colegiado trouxe uma avaliação mais dura sobre a trajetória das contas públicas do país e disse monitorar “com atenção” os desdobramentos da política fiscal.
“Uma política fiscal crível, embasada em regras previsíveis e transparência em seus resultados, em conjunto com a persecução de estratégias fiscais que sinalizem e reforcem o compromisso com o arcabouço fiscal nos próximos anos são importantes elementos para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de riscos dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”, afirmou o comitê.
“O esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade”, disse o colegiado em outro trecho.
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress