PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Nem a chuva afastou centenas de gaúchos das arquibancadas montadas ao lado da orla do lago Guaíba, em Porto Alegre, para o Desfile Farroupilha na manhã desta sexta-feira (20), feriado estadual e data mais importante do folclore gaúcho.
Mesmo com o clima instável, o encerramento dos festejos do mês farroupilha contou com emoção do público nas homenagens feitas à história do Rio Grande do Sul e de agentes que atuaram em resgates e missões de apoio durante as chuvas e enchentes históricas que devastaram o estado em maio.
“O povo está querendo ver o Rio Grande do Sul renascendo”, disse Francielle Zampieri, 34, uma das integrantes do grupo de dança do CTG Tiarayu, que apresentou uma coreografia dedicada ao centenário do músico Jayme Caetano Braun, temática oficial dos festejos de 2024.
Ela e a família foram atingidos pela inundação na zona norte de Porto Alegre, que tomou conta do primeiro andar inteiro de casa. O mesmo aconteceu com outros integrantes do CTG.
“Afetou qualquer pessoa, direta ou indiretamente, e este momento aqui demonstra que a gente está forte, unido, e que cada um vai apoiar quem está do lado”, afirmou Francielle. “Isso é gratificante, e é um orgulho para o gaúcho ver que, mesmo com chuva, o público estava aqui querendo ver.”
O fotógrafo gaúcho André Castro, morador de São Paulo há mais de 50 anos, disse estar emocionado. Ele foi com a esposa Cleide Maria Monteiro para retomar uma visita que planejavam para maio.
“Chorei do começo a fim”, disse Cleide logo após o desfile de agentes do Corpo de Bombeiros envolvidos nos resgates durante as cheias. “Como aconteceu essa tragédia toda, a gente achava que não teria como vir para cá, porque não teria condições de receber. Fiquei surpresa de ver como estão as coisas e como tem tanta vida já por aqui.”
André diz que a situação no Rio Grande do Sul é semelhante à do começo da pandemia de Covid-19, e torce que o fim não seja também o mesmo. “Diziam ‘temos de continuar com o mesmo espírito de solidariedade’, mas boa parte das pessoas voltou a ser o que era antes da pandemia. Que todos nós, aqui do Rio Grande, de São Paulo e de onde quer que seja, nos voltemos para ajudar uns aos outros.”
“O gaúcho é um povo tão maravilhoso, são resilientes, são corajosos. Eu vi Deus aqui, eu vi o amor das pessoas aqui”, acrescentou Cleide.
Também desfilaram as forças policiais civis e militares, incluindo agentes, viaturas e helicópteros, cavalarianos de CTGs (Centros de Tradições Gaúchas) e membros de piquetes do Acampamento Farroupilha, para onde parte do público das arquibancadas seguiu após o encerramento. Participando como convidados, bombeiros do Paraná e de Santa Catarina, dois estados que enviaram suporte ao Rio Grande do Sul, foram bastante aplaudidos pelo público.
Uma atração esperada era o retorno dos carros temáticos ao evento, o que não acontecia desde 2013. Nos seis veículos que cruzaram a avenida Edvaldo Pereira Paiva foram feitas homenagens à obra de Jayme Caetano Braun e à região das Missões e ao bicentenário da imigração germânica ao Brasil em São Leopoldo. Também havia um carro dedicado ao povo gaúcho unido na reconstrução.
O cantor Pedro Ortaça, um dos artistas mais prestigiados do Rio Grande do Sul, foi a principal atração do carro missioneiro.
Aberto no dia 7 de setembro, o Acampamento Farroupilha simbolizou o retorno das atividades públicas no parque da Harmonia, que sedia o evento. Exatos quatro meses antes a área estava sob cerca de dois metros de água depois que o sistema de proteção contra cheias falhou e as águas do Guaíba inundaram a cidade.
As chuvas que assolaram o estado deixaram 183 mortos e mais de 600 mil pessoas precisaram deixar suas casas. Somente em Porto Alegre, 160 mil pessoas foram diretamente atingidas, e os abrigos chegaram a receber 14,2 mil pessoas.
CARLOS VILLELA / Folhapress