‘Destino das Sombras’ se perde em bons clichês do cinema de terror

FOLHAPRESS – “Destino das Sombras” não tem vergonha de recorrer aos clichês do cinema de terror. Lá estão o lugar isolado (não funcionam celulares, claro), de passado tenebroso, a antiga casa rangente, o gato preto, a velha com maus augúrios.

E não se pode dizer que esteja errado, pois são esses clichês que podem, de imediato, engajar o seu público. Afinal, o terror tem algo a ver com adivinhação, e enumerar certos elementos (o gato preto, por exemplo) já coloca o espectador em alerta.

Ao longo do filme esses elementos se acumularão e dialogarão entre si. E o farão a partir de um bom princípio, enunciado antes mesmo que o filme comece -o desaparecimento de crianças. Mais que um princípio, o sumiço de crianças é uma realidade; e, mais que realidade, é um pesadelo recorrente. O filho que se perde do pai é um clássico do gênero (do gênero pesadelo, digo): perfeito, portanto, para o gênero.

Nem tudo são flores, porém. A evolução terá seus problemas. Os diálogos são talvez o pior. O hábito dos atores de reiterarem o que está visto ou entendido trava o desenvolvimento e irrita espectador. Principalmente no início os próprios atores parecem declamar o texto com certa vá vontade, sentindo-os artificiais.

Também por aí prejudica-se a construção da figura do pai, que deveria ganhar toda a nossa simpatia. Mas será que alguém pode gostar de um choramingas como Marcos, que só reclama da mulher que o deixou? É verdade que ela não dava a mínima para o marido, e a entendemos bem, mas antes de ela sair de casa Marcos a espancou bem espancada. Agora só fica ai, com medo de que a mulher fique com a guarda absoluta da filha e nunca mais possa vê-la.

Mal sabe ele que, no lugar ermo em que foram parar, outros perigos ameaçam sua relação com a filha. Mas nós sabemos, e isso nos basta: assim, quando Marcos e seu amigo Sergio saem caminhando pela mata, distraídos conversando sobre não importa o quê (na real é sobre a mulher, assunto permanente), será que esses dois nem percebem que a menina ficou para trás, ficou perdida?

São esses os momentos bons do filme: esses em que o espectador pode bem perguntar “por que fazem isso e não aquilo?”, “por que deixaram a menina sozinha?”. Quanto mais uma menina que fica toda amiguinha do gato preto. Não tem ninguém para explicar que gato preto dá azar em qualquer filme de terror?

É pena que, embora esses detalhes funcionem ao estabelecer um elo com o espectador, a menina se revele tão tolamente manhosa. Já compreendemos que ela persegue o perigo, o que não engaja o espectador com seu destino. Essa manha vem da direção de atores incerta ou de como o personagem foi concebido? Talvez ambos.

O que joga a favor do final é que o destino de Sergio, o amigo de Marcos, reserva uma renovação do interesse.

Entre mortos e feridos (é o que se espera do horror, afinal), eis um horror digno, um pouco castigado pela modéstia da produção, com enquadramentos por vezes bem frouxos, mas que raramente apela a malabarismos de roteiro, algo comum no gênero, para chegar aos seus fins.

A propósito, é possível notar que pelo menos uma parte dos problemas visíveis (ou audíveis) em “Destino das Sombras” parece vir muito mais da falta de experiência (e também de algum diálogo capaz de suprimir certos defeitos óbvios) de seu diretor, Klaus’Berg, do que de falta de aplicação ou talento.

É outro estreante de que se pode esperar o que virá a propor no futuro. Sobretudo se o renascido Ministério da Cultura começar a cuidar da cota de tela, isto é, se houver futuro nesse interminável filme de terror que é a política cinematográfica brasileira.

DESTINO DAS SOMBRAS

Onde Em cartaz nos cinemas

Classificação 14 anos

Elenco Othoniel Cibien, Thelma Lopes, Raphael Teixeira

Produção Brasil, 2018

Direção Klaus’Berg

Avaliação Regular

INÁCIO ARAUJO / Folhapress

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