SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar apresenta queda nesta sexta-feira (27), com investidores digerindo os dados de inflação dos Estados Unidos medidos pelo PCE (índice de preços de despesas de consumo pessoal, na sigla em inglês).
O mercado analisa também a divulgação da taxa de desemprego no Brasil, que ficou em 6,6% entre junho e agosto, e novas medidas de estímulos anunciadas pela China.
Às 15h18, o dólar caía 0,23%, cotado a R$ 5,431, em movimento global de desvalorização. Já a Bolsa perdia fôlego e subia 0,07%, aos 133.107 pontos.
Indicador de inflação mais monitorado pelo Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), o PCE teve alta de 0,1% em agosto uma desaceleração em relação ao resultado de julho, de 0,2%.
No acumulado de 12 meses, o índice ficou em 2,2%, após marcar 2,5% no mês anterior. Já no núcleo do PCE, que exclui os componentes voláteis de alimentos e energia, a alta foi de 0,1%, ante projeção de 0,2%.
O BC americano trabalha com um mandato duplo, isto é, olha de perto os dados de inflação e do mercado de trabalho para decidir sobre juros. Enquanto os índices inflacionários têm mostrado uma convergência gradual à meta anual de 2%, os números de emprego têm desacelerado a cada nova leitura e chegaram até a instalar temores de que a economia estaria a caminho de uma recessão.
Na quarta-feira da semana passada, a autoridade americana fez o primeiro corte nos juros em mais de quatro anos, com uma redução de 0,50 ponto percentual. A taxa agora está na faixa de 4,75% e 5% e a expectativa do mercado é que o ciclo de alívio se sustente pelas próximas reuniões.
“O comitê ganhou maior confiança de que a inflação está se movendo de forma sustentável em direção a [meta de] 2% e julga que os riscos para alcançar metas de emprego e inflação estão aproximadamente equilibrados”, disseram os diretores do Fed no comunicado da decisão.
O ritmo dos próximos cortes, porém, está dependente dos números da economia americana. “Não há nada que sugira pressa”, disse em entrevista coletiva Jerome Powell, presidente do Fed, em referência à velocidade e a intensidade das reduções.
Com o PCE de agosto, as apostas de um afrouxmaneto maior, de 0,50 ponto, passaram a reunir 52,1% dos operadores na ferramenta CME Fed Watch. As de um corte menor, de 0,25 ponto, concentram os 47,9% restantes.
O dólar costuma se depreciar à medida que os juros nos Estados Unidos caem, conforme o rendimento dos ativos ligados à renda fixa americana se depreciam. Isso leva operadores a investimentos de maior risco, como moedas emergentes e mercados acionários, pela possibilidade de rentabilidade maior.
A cena externa ainda penalizava o dólar por outro motivo: o pacote de estímulos anunciado pela China nesta semana.
Nesta sexta, o Banco Central chinês a reduziu a taxa de compulsório de bancos em 0,50 ponto percentual, o que deve liberar 1 trilhão de iuanes (R$ 775,94 bilhões) em liquidez para o sistema bancário.
A medida segue a esteira de outros anúncios feitos pelo governo e pela autoridade monetária nos últimos dias. Na quinta, o Partido Comunista chinês prometeu “gastar o necessário” para que o país cumpra a promessa de terminar o ano com um PIB (Produto Interno Bruto) em 5%.
As falas incluíram orientações para sustentar o consumo das famílias e estabilizar o conturbado mercado imobiliário e sucederam o pacote de estímulo à economia mais agressivo desde o início da pandemia de Covid-19, em 2020, divulgado na terça-feira.
Desde que os anúncios começaram, os mercados globais têm experimentado ganhos devido à expectativa de uma demanda maior por commodities da China, o país que mais importa matérias-primas do mundo.
“Um pacote de estímulos econômicos vultoso como o chinês tem melhorado as expectativas de investidores em relação ao desempenho econômico do país, o que ajuda a elevar as expectativas de demandas por commodities”, disse Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX.
O efeito do estímulo chinês era mais evidente em mercados emergentes, cujas moedas dependem diretamente do desempenho dos preços das matérias-primas. Com isso, o dólar recuava ante o peso mexicano, o peso chileno e o rand sul-africano.
O real, porém, tinha dificuldades de acompanhar a força das outras moedas no exterior. Aqui, o mercado voltava a elevar os prêmios de risco para o país, em meio a indícios de aceleração da inflação e preocupações com as contas públicas.
O IGP-M (Índice Geral de Preços-Mercado), conhecido como a “inflação do aluguel”, acelerou a 0,62% em setembro, depois de ter avançado 0,29% no mês anterior, informou a FGV (Fundação Getulio Vargas).
A expectativa de analistas era de que a alta fosse de 0,47%. Com o resultado, o acumulado de 12 meses bateu 4,53%.
Ao mesmo tempo, a taxa de desemprego brasileira continuou em trajetória de baixa e recuou a 6,6% no trimestre encerrado em agosto, mostrou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Analistas consultados pela agência Bloomberg esperavam o dado em 6,7%.
“Os dados mostram que a economia brasileira está aquecida e, ao mesmo tempo, que teremos mais pressão na inflação. Será inevitável o Banco Central subir os juros”, avalia João Kepler, CEO da Equity Fund Group.
A bateria de divulgações chega em um momento de preocupações renovadas do mercado em relação ao compromisso do governo com o ajuste das contas públicas. A agência de classificação de risco, Fitch Ratings, afirmou na quinta-feira que a política fiscal atual do Brasil e seus efeitos não estão acompanhando o forte desempenho da economia nacional e que os desafios para o governo federal devem persistir e crescer no próximo ano.
“Vejo muita cautela ainda com o cenário fiscal, e isso está nitidamente limitando a recuperação de nossos ativos locais”, afirma Fernando Bergallo, diretor de operações da FB Capital.
Em evento nesta sexta, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, condicionou uma taxa de juros mais baixa à política fiscal.
“Em todos os momentos na história recente brasileira, você ser capaz de cair os juros e conviver com os juros mais baixos está associado a um choque positivo no fiscal. Não existe harmonia monetária sem ter harmonia fiscal. Isso é importante”, disse, durante o 1618 Spring Investment Meeting, em São Paulo.
“Essa história de achar que eu vou fazer um monetário [juros] um pouco mais apertado e o fiscal um pouco mais frouxo acaba gerando uma ineficiência que atrapalha o canal da política monetária, e que faz com que a gente tenha que conviver com juros mais altos.”
Redação / Folhapress