Dólar e juros dificultam pagamento de dívidas de empresas, mostra levantamento

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As companhias brasileiras podem ter mais dificuldades para cumprir suas obrigações financeiras por conta da manutenção da taxa básica de juros, a Selic, em dois dígitos e a elevação do câmbio.

É o que aponta uma simulação feita pelo Cefeb-Fipe (Centro de Estudos do Financiamento das Empresas Brasileiras da Fipe) com base nos saldos da dívida financeira das empresas brasileiras e as projeções da Selic e do dólar apresentados nos relatórios Focus de março a junho deste ano.

O estudo considera os gastos das companhias com despesas bancárias calculados com as projeções de março e junho. No fim do primeiro trimestre, a expectativa era que a Selic fechasse o ano em 9% e o câmbio a R$ 4,95, mas o desenho no fim do segundo trimestre fez com que a expectativa para a taxa básica de juros passasse para os atuais 10,5% e o dólar, a R$ 5,20.

A dívida observada em março deste ano, de R$ 5,864 trilhões, passaria para R$ 6,035 trilhões caso a Selic e o dólar fechassem o ano com as projeções de março. Um aumento de 3,25%. Com o cenário de junho, a dívida pode fechar 2024 em R$ 6,159 trilhões, crescimento de 5%.

A simulação mostra que as despesas financeiras das companhias ao fim de 2024 podem passar de R$ 170 bilhões, no cenário de março, para R$ 295 bilhões, com as projeções de junho. Um aumento de 73%.

“Uma certa proporção de empresas que, no cenário de março, não teriam problemas, eventualmente passam a ter um aumento muito forte de despesa financeira e ocasionalmente pode passar a ter dificuldade de cobrir esse pagamento de juros”, explica Carlos Antonio Rocca, coordenador do Cefeb-Fipe.

O economista aponta que as empresas brasileiras tomaram crédito para gerar caixa em meio à paralisação econômica decorrente da pandemia de covid-19, entre 2020 e 2021. Nesse período a taxa de juros estava na casa dos 2%. Com a retomada das atividades e a alta da inflação, o Banco Central elevou a taxa de juros para conter os preços e a contratação de empréstimo se tornou mais cara.

Somaram-se a esse cenário, segundo Rocca, fatores como a piora na oferta de crédito, resposta do mercado à crise da Americanas, aumentos dos custos e o impacto da inadimplência das empresas. O especialista destaca que algumas companhias locais já enfrentam problemas, vide os índices de inadimplência e recuperação judicial.

Cerca de 6,739 milhões de empresas estão inadimplentes, segundo dados da Serasa. Uma alta de 8% em comparação com janeiro de 2020. Já o número de pedidos de recuperação judicial teve um crescimento de 69,6% entre março e maio de 2024 quando comparado com o mesmo período do ano passado, também de acordo com informações da Serasa.

A simulação feita pelo Cefeb-Fipe compara as dívidas das empresas brasileiras em relação ao PIB (Produto Interno Bruto). Em abril deste ano, as dívidas das companhias locais corresponderam a 53,9% do PIB, sendo 36,7% no mercado doméstico –crédito bancário e mercado de capitais– e 17,2% no mercado internacional.

Rocca diz que a maior parte das empresas brasileiras acessam empréstimos por meio do crédito bancário, pois são negócios menores que não participam do mercado de capitais e do internacional. Grandes corporações têm tamanho para negociar em outras moedas e acionar fatores de mitigação.

“A rolagem da dívida para quem tem acesso ao mercado de capitais está mais favorável, mas as pequenas empresas têm dificuldade de rolagem. Já o impacto do aumento da taxa de câmbio pode ser reduzido ou eventualmente eliminado. É o caso de empresas exportadoras, como as do agronegócios, por exemplo, e aquelas que possuem ativos no exterior, como aplicações, ou que fizeram hedge, convertendo as suas dívidas”, argumenta o coordenador do Cefeb-Fipe.

Ricardo Martins, presidente executivo da APIMEC Brasil e economista-chefe da Planner Investimentos, segue nessa linha e aconselha que empresas que não tenham receitas em dólar façam operações de hedge nos mercados futuros de câmbio.

“As companhias podem buscar otimizar processos e redução constante de custos. Como forma de necessidade de captação de recursos no momento, o crédito subsidiado, via bancos de fomento, ou crédito privado, via emissão de debêntures ou fundos de recebíveis, sempre será a melhor alternativa”, acrescenta Martins.

Rosana Passos de Pádua, conselheira de administração do IBEF-SP (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo), afirma que as companhias locais precisam de retornos acima dos custos para fazer investimentos e retomar o crescimento. Para isso é necessário que o nível de endividamento das empresas esteja alinhado com as margens operacionais, portanto, empresas muito alavancadas terão mais dificuldades de atingir metas operacionais.

“Cada empresa tem sua própria estratégia de liquidez e endividamento, então, não dá para generalizar. O que me preocupa são as empresas que se alavancaram demais nos meses em que a taxa estava muito baixa, fizeram investimentos que não geraram o retorno esperado e que hoje têm que pagar juros 5 ou 6 vezes mais caros”, finaliza.

MATHEUS OLIVEIRA / Folhapress

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