SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após atingir o seu recorde nominal na segunda-feira (16), o dólar voltou a disparar nesta terça-feira (17) e chegou a R$ 6,208, na máxima do dia. Às 13h17, a moeda norte-americana disparava 1,20%, cotada a R$ 6,164, com investidores avaliando a ata do Copom (Comitê de Política Monetária), que indica alta dos juros para 2025.
Com a disparada da moeda, o BC (Banco Central) realizou, nesta terça, mais duas intervenções no câmbio, totalizando sete em menos de uma semana. Mais cedo, a autoridade vendeu US$ 1,272 bilhão em leilão extraordinário. Já no segundo leilão do dia, vendeu um total de US$ 2,015 bilhões, totalizando US$ 3,287 bilhões apenas nesta terça, mas a moeda norte-americana seguia em patamares recorde mesmo após as atuações do BC.
Com os dois novos leilões, o BC já injetou US$ 12,76 bilhões no mercado de câmbio desde a última quinta-feira (12).
Trata-se de uma intervenção da autoridade monetária no mercado de câmbio. Na prática, é uma injeção de dólares no mercado como forma de atenuar disfuncionalidades nas negociações e diminuir a cotação, seguindo a lei da oferta e demanda.
O BC já havia realizado cinco leilões de câmbio desde a semana passada. Foram vendidos US$ 2,48 bilhões de dólares em operações à vista e outros US$ 7 bilhões na modalidade em linha, com o compromisso de recompra em prazo determinado.
No entanto, as intervenções da autoridade monetária não conseguiram conter alta da divisa americana. O real foi a moeda que mais se desvalorizou entre as moedas dos países emergentes e entre as principais moedas do mundo nesta segunda.
Já a Bolsa avançava, com variação positiva de 0,55%, aos 124.257 pontos, às 13h17.
Os juros futuros voltaram a saltar nesta terça. A taxa para outubro de 2027 subiu 0,36 ponto percentual, de 15,33% para 15,69%. O contrato para janeiro de 2033 estava em 14,85%, ante 14,55% no ajuste anterior, com variação de 0,29 ponto percentual.
Analistas consultados pela reportagem avaliam que a alta do dólar persiste devido às incertezas fiscais e à falta de confiança dos investidores na condução econômica do governo brasileiro.
No cenário interno, os investidores avaliam a ata do Copom do BC, divulgada nesta manhã, que aponta que a piora da inflação de curto e médio prazo exigiu postura mais tempestiva e o cenário se tornou mais adverso com a materialização de riscos.
Na última quarta (11), em seu último encontro de 2024, o Copom elevou, em decisão unânime, a taxa básica de juros (Selic) em 1 ponto percentual, de 11,25% para 12,25% ao ano.
O comitê prevê um aumento de juros de mesma intensidade nas duas próximas reuniões, em janeiro e março de 2025.
Se o cenário se concretizar, a Selic chegará ao patamar de 14,25% ao ano pico da taxa básica na crise do governo de Dilma Rousseff (PT), entre 2015 e 2016.
No mercado exterior, os investidores aguardam a decisão do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) sobre a taxa de juros do país, que será divulgada nesta quarta-feira (18). Os mercados esperando uma redução de 0,25 ponto percentual na taxa de juros.
Na segunda, o dólar fechou no maior valor nominal da história, encerrando o pregão com disparada de 1,03%, cotado a R$ 6,09. Já a Bolsa fechou com forte queda de 0,84%, aos 123.560 pontos.
Ainda que o valor de R$ 6,09 seja recorde na base nominal -a que desconsidera a inflação do cálculo-, a maior cotação real foi atingida em setembro de 2002, na esteira da primeira eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Corrigido pela inflação, o valor do dólar naquela ocasião seria hoje o correspondente a R$ 8,75.
A conta, feito pela consultoria Elos Ayta, considera a cotação da Ptax -a taxa de câmbio calculada pelo BC (Banco Central)- e ajustes pela inflação brasileira (IPCA) e norte-americana (CPI) até novembro de 2024.
Apesar das intervenções do BC com leilões, para os especialistas, os problemas estruturais, como a ausência de um plano fiscal robusto e consistente, continuam alimentando a pressão sobre o câmbio.
“Essas intervenções têm apenas um efeito paliativo. Elas amenizam a alta, mas não resolvem o problema”, afirma Lucélia Freitas, especialista em câmbio da Manchester Investimentos.
Freitas explica que o problema central está na questão fiscal e na ausência de medidas efetivas para reduzir as incertezas.
“Sem um pacote eficiente para lidar com essas questões, não há consistência que permita a redução da incerteza. Como resultado, o dólar sobe, a taxa de juros aumenta e a confiança do mercado diminui, criando um ciclo preocupante que afeta diversos setores e traz apreensão para o futuro”, diz.
Entre os principais obstáculos na tramitação do pacote fiscal estão a ausência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) das articulações, à medida que se recupera de uma cirurgia em São Paulo, e a questão do pagamento de emendas parlamentares, com investidores apostando que ambos devem travar as medidas.
“Atualmente, o que fortalece tendência de valorização da moeda norte-americana frente ao real é a grande expectativa do mercado para a votação do pacote de corte de gastos”, disse João Duarte, sócio da One Investimentos.
Apesar de o BC não ter dito o motivo dos leilões, eles ocorrem em meio à crescente desvalorização do real, com o dólar fechando acima de R$ 6 na maior parte das sessões deste mês em meio à reação negativa do mercado ao duplo anúncio do governo de um pacote fiscal e de uma reforma do Imposto de Renda.
“O Brasil conta com reservas cambiais adequadas ao seu nível de risco, mas utilizá-las de forma indiscriminada para conter o câmbio pode gerar um efeito artificial e temporário. Sem ajustes estruturais, como uma política fiscal consistente, as intervenções no mercado cambial serão ineficazes e o dólar continuará pressionado”, afirma Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.
Ao fim de novembro, o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse que o BC interviria apenas se houvesse disfuncionalidades no mercado cambial.
“O câmbio flutuante é uma ferramenta muito importante dentro do que é a matriz da política econômica brasileira para poder absorver choques como esse que estamos assistindo. O Banco Central está sempre acompanhando para entender se existe algum tipo de disfuncionalidade, mas não mira qualquer tipo de nível de câmbio”, disse à época.
Operadores afirmam que o leilão foi necessário para driblar a falta de dólares no país, comum nesta época do ano devido a remessas de dinheiro de empresas estrangeiras para as matrizes.
Os bancos estão com aproximadamente US$ 30 bilhões em caixa, segundo dados da Bloomberg, um valor relativamente baixo. Em setembro, por exemplo, o saldo era de US$ 50,6 bilhões.
Geralmente, com o dólar alto e poucos recursos em caixa, bancos relatam a dificuldade ao Banco Central, que faz a venda de dólares à vista.
VITOR HUGO BATISTA / Folhapress