BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Escolhido nesta quarta-feira (13) para presidir a CME (Comissão de Minas e Energia) da Câmara dos Deputados, Júnior Ferrari (PSD-PA) já defendeu publicamente a exploração de petróleo na Foz do Amazonas e votou a favor da liberação de garimpo em terras indígenas.
Ferrari, que é natural de Oriximiná (PA), região de forte mineração de bauxita, foi indicado pela bancada do PSD, que, pelo acordo firmado na Casa, escolhe quem presidirá o grupo.
O primeiro vice-presidente, também apontado pela sigla, é Hugo Leal (PSD-RJ), que, como mostrou a Folha de S.Paulo, integra a lista de parlamentares ligados à exploração mineral ele detém ações em uma mineradora e também votou a favor da regulamentação do garimpo em terra indígena.
Samuel Viana (Republicanos-MG) e Carlos Veras (PT-PE) serão, respectivamente, os segundo e terceiro vice-presidentes da colegiado.
Procurado, Ferrari disse que, como presidente da CME, vai “atuar de forma imparcial” e respeitando a Constituição Federal quando o assunto for garimpo a carta magna proíbe a exploração nos territórios.
Quanto à exploração de petróleo, afirmou que “precisamos garantir a sustentabilidade ambiental, mas também a sustentabilidade social”.”Já está provado que a Petrobras possui a tecnologia e a expertise na exploração de petróleo em alto-mar”, completou.
Leal confirmou que integra o quadro social de uma mineradora desde 2015. “Não tenho defesa neste sentido”, disse, sobre o garimpo, mas afirmou que é contrário à atuação ilegal de garimpeiros.
Em 2022, nas eleições, a Folha de S.Paulo também o questionou sobre a participação na área. “Defendo uma regulamentação efetiva, para que o produto encontrado fique no país regularizado e gerando divisas. Garimpo não é uma atividade que tenha condições ideais para uma efetiva fiscalização”, afirmou à época.
Ferrari e Leal são do mesmo partido do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Sob reserva, parlamentares afirmaram à Folha de S.Paulo que a escolha, no entanto, foi feita pela bancada de deputados e já havia sido pré-acordada no ano passado.
Ferrari defendeu a exploração do petróleo na Foz do Amazonas em 2023, durante uma audiência realizada pela própria CME, com a presença da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
“Defendemos com muita veemência, com muita firmeza, a exploração do petróleo na Foz do Amazonas, como uma forma de desenvolvimento econômico da nossa região”, afirmou o deputado na ocasião.
Em 2023, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) negou à Petrobras a licença prévia para perfurar o bloco 59 de petróleo na bacia Foz do Amazonas, na chamada margem equatorial da costa brasileira
A decisão causou atrito interno no governo Lula (PT). A decisão dos técnicos do Ibama foi criticada por nomes como o ministro Alexandre Silveira ou o próprio líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).
Na mesma audiência, Ferrari defendeu ainda “agilizar” o processo de licenciamento ambiental do empreendimento.
Em 2022, o deputado foi um dos que votaram a favor da liberação do garimpo em territórios indígenas assim como Hugo Leal.
Ferrari também é autor de um projeto que libera a criação de gado e búfalos dentro de reservas extrativistas sua família declara ser dona de terrenos e cabeças de boi.
Parlamentares avaliam que pesou positivamente para que o deputado assumisse o posto na CME o fato de ele ser do Pará e aliado do governador Helder Barbalho (MDB).
O estado sediará, em 2025, a COP30, conferência do clima da ONU (Organização das Nações Unidas). Nesta cúpula devem ser revistas as metas do Acordo de Paris e, por isso, a edição é considerada um evento-chave para que se consiga reduzir os efeitos do aquecimento global.
“Pela importância do estado do Pará na produção de energia limpa e na produção de minério, o governador Helder me apoiou e ficou muito feliz com a minha indicação e, principalmente, pela amizade pessoal que temos e pela importância da CME ser presidida por um paraense”, disse Ferrari.
“Em relação ao ministro Alexandre Silveira, após a confirmação do meu nome por unanimidade na bancada, ele também ratificou o meu nome”, afirmou também.
Ferrari nasceu em Oriximiná, no oeste paraense, município que tem dezenas de quilombos e onde há quase 40 anos a MRN (Mineração Rio do Norte) atua na exploração de bauxita.
A Folha de S.Paulo visitou a região do rio Trombetas, na cidade, em 2023. O beneficiamento e o carregamento do mineral acontecem ao lado de um quilombo, o Boa Vista, histórica comunidade e a primeira do país a ter conquistado seu título.
Moradores e pesquisadores afirmaram que a atuação da MRN vem matando os rios eles perdem fluxo de água, ficam poluídos e inviabilizados para a pesca.
Também dizem que a mineradora utiliza irregularmente áreas de preservação (como a Floresta Nacional de Saracá-Taquera) e espaços que quilombolas usavam para plantação.
Há relatos de que os habitantes locais não conseguem utilizar o hospital da empresa, o que seria uma das compensações socioambientais previstas para o empreendimento.
A Prefeitura de Oriximiná afirma que o valor repassado pela mineradora como contrapartida pela exploração não é suficiente para custear melhorias para as comunidades tradicionais e que a mineradora atrasa os repasses com frequência.
“Defendo a exploração da bauxita e de qualquer outro tipo de minério não só em Oriximiná mas também em qualquer outra região do país, desde que respeitada a legislação ambiental […] e que sejam assegurados os direitos dos quilombolas”, disse Ferrari.
A Folha de S.Paulo procurou novamente a empresa MRN para comentar as críticas das comunidades quilombolas, mas não teve resposta.
Em 2023, a empresa afirmou à reportagem que estudos apontam para a restauração ecológica da região, que as amostras de água estão em conformidade com a legislação, assim como os níveis de poeira.
Disse também que os limites da comunidade foram delimitados e reconhecidos anos após o início de suas operações e que nunca interrompeu atendimentos médicos a quilombolas. Por fim, alegou que o atraso dos repasses se deu por questões operacionais da Agência Nacional de Mineração.
JOÃO GABRIEL / Folhapress