SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Lançada em 5 de julho, a série “Pedaço de Mim”, da Netflix, conta o drama de Liana, personagem interpretada por Juliana Paes, que engravida de gêmeos de pais diferentes.
O tema inusitado, no entanto, trouxe diversas dúvidas. Afinal, é possível engravidar ao mesmo tempo de parceiros diferentes? A resposta é sim e o nome desse fenômeno raríssimo é superfecundação heteropaternal.
O QUE É SUPERFECUNDAÇÃO HETEROPATERNAL?
A superfecundação heteropateral ocorre quando a mulher ovula mais de uma vez no mesmo ciclo e estes óvulos são fecundados por espermatozoides de parceiros diferentes, explica a obstetra Daniela Maeyama, da Maternidade São Luiz Star, da Rede D’Or.
Trata-se de um fenômeno bastante raro, com apenas cerca de 20 casos conhecidos pela literatura médica, segundo a especialista. No Brasil, uma jovem de 19 anos no interior de Goiás ficou conhecida por dar à luz gêmeos de pais diferentes em 2022. Outros casos foram registrados na Colômbia, Estados Unidos, Vietnã e China, dentre outros.
O motivo de ser um fenômeno raro é que, tradicionalmente, as mulheres ovulam apenas uma vez por ciclo e para a fecundação dupla é necessária a liberação atípica de dois óvulos no período.
Além disso, o óvulo só está apto para ser fecundado em até cerca de três dias após a ovulação, por isso, nesses casos, a mulher precisa ter relações sexuais com parceiros diferentes nessa janela de tempo o que torna o processo ainda mais difícil.
Vale destacar, também, que espermatozoides podem durar até 72 horas no canal vaginal, o que significa que, mesmo se as relações ocorrerem três dias antes das ovulações, por exemplo, esse fenômeno pode acontecer. “De qualquer maneira, trata-se de algo muito incomum”, diz a médica.
QUAIS FATORES CONTRIBUEM PARA UMA SUPERFECUNDAÇÃO HETEROPATERNAL?
Embora seja um evento raro e sem grandes preocupações às mulheres, existem alguns fatores que aumentam as chances de ovulação mais de uma vez no mesmo ciclo, como o uso de medicamentos indutores de ovulação (como no caso da personagem de Juliana Paes na série) ou a proximidade com a menopausa, afirma o ginecologista e obstetra Newton Busso, chefe do departamento de ginecologia do centro de estudos do Grupo Santa Joana.
No primeiro caso, os medicamentos indutores são frequentemente usados no processo de reprodução assistida. Já a proximidade com a menopausa provoca alterações hormonais que aumentam as chances de liberação de dois óvulos por ciclo de maneira natural. De forma geral, mulheres mais velhas ou que fazem reprodução assistida têm maior chance de ter uma gestação de gêmeos.
QUAL A DIFERENÇA ENTRE GÊMEOS DE PAIS DIFERENTES E DO MESMO PAI?
Tanto para a superfecundação heteropaternal, quanto para os gêmeos bivitelinos (de um mesmo pai), é preciso que a mulher libere mais de um óvulo no mesmo ciclo, explica Maeyama.
No caso dos gêmeos univitelinos (formados a partir do mesmo óvulo), apenas um óvulo é fecundado e se divide em dois.
A SUPERFECUNDAÇÃO HETEROPATERNAL AUMENTA OS RISCOS DA GESTAÇÃO?
Não. O fato de ser uma superfecundação heteropaternal exclusivamente não aumenta os perigos da gestação. Há riscos, no entanto, por se tratar de uma gestação de mais de um feto, segundo a especialista.
“Isso acontece, porque o útero é preparado para abrigar apenas um feto, por isso, quando há mais, ele pode ficar sobrecarregado, o que pode aumentar os riscos de prematuridade, diabetes gestacional e sangramento uterino durante ou após o parto”, diz a médica. “Por isso, é fundamental que as gestações de gêmeos tenham um acompanhamento próximo de um especialista”, orienta.
Nesse sentido, Busso reforça que não há, por exemplo, a possibilidade de um feto crescer sobre o outro ou algo do tipo, sejam dois, três ou até mais, já que eles se acomodam perfeitamente à cavidade uterina. “A única diferença entre gestações de gêmeos bivitelinos de mesmo pai e as que são fruto de superfecundação heteropaternal é a origem dos fetos”, afirma.
Omédico ressalta que só dá para saber se é uma superfecundação heteropaternal por exame genético dos fetos e comparação com o DNA dos possíveis pais.
LARA CASTELO / Folhapress