SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Eletrobras e a União protocolaram no STF (Supremo Tribunal Federal) na terça-feira (17) uma petição conjunta solicitando a prorrogação, por mais 60 dias, do prazo para negociação de um acordo consensual no âmbito da ação que pede poder de voto para o governo proporcional à sua participação na empresa após a privatização. O governo detém mais de 40% das ações ordinárias, mas o limite de direito de voto na companhia é de 10%.
Segundo apuração da reportagem, os grandes termos do acordo já foram acertados e há uma corrida contra o tempo para afinar pormenores.
Na mesa de negociação já é dado como certo que a Eletrobras vai sair da Eletronuclear, holding que controla usinas nucleares brasileiras. Na prática, significaria que a ex-estatal terá atendido o pleito para também não assumir novos custos com investimento e garantidas da obra de Angra 3 –caso o governo prossiga com o projeto, que está em banho-maria.
Pelo acertado até agora, o governo, em troca, ficará com cadeiras no conselho de administração da Eletrobras. Falam-se em três posições no colegiado. Também se discute o mecanismo de ressarcimento pelas ações da Eletronucelar para que a Eletrobras se retire da sociedade.
O valor que circulava no mercado nesta quarta-feira (18) era da ordem R$ 1 bilhão. A dimensão depende de pente-fino nos ativos e nos cenários. A Fazenda já está no grupo de trabalho que trata da negociação há uns dois meses, e uma das missões é estimar os custos das mudanças.
É uma conta com muitas variáveis, como a perspectiva da obra de Angra 3. A Eletrobras e a União, desde 2019, já aportaram, respectivamente, R$ 4,3 bilhões e R$ 3,5 bilhões. Pelo plano proposto, os acionistas fariam aportes adicionais de R$ 4,3 bilhões na proporção do capital votante, sendo de 64% da União e 36% da Eletrobras. Também está prevista uma captação no mercado financeiro que pode chegar a R$ 30 bilhões e exigirá garantias dos acionistas, também na proporção do capital votante.
Como o governo ainda não bateu o martelo sobre a obra, também está previsto que o acordo final vai incluir que a Eletrobras se comprometerá a ajudar o governo a encontrar um acionista para ficar no seu lugar na Eletronuclear.
Segundo a reportagem, a Casa Civil concordou com saída da Eletrobras da Eletronuclear. Quem acompanha o processo afirma que o ministro Rui Costa foi convencido pelo MME (Ministério de Minas Energia). Mudanças nos termos pesaram. Numa proposta anterior, em que ocorria o inverso –o governo pagava para a Eletrobras sair da Eletronucelar– a Fazenda endureceu o debate e o ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira ficou isolado nessa alternativa.
Procurada pela reportagem, a assessoria da Casa Civil disse que a pasta não comentaria e afirmou que o processo de discussão do acordo com a Eletrobras conta com envolvimento da AGU, e não depende do convencimento de um ministro com outro. Fazenda, MME, AGU e Eletrobras não se manifestaram até a publicação deste texto.
Na petição encaminhada ao ministro Nunes Marques, relator do processo no STF, Eletrobras e AGU (Advocacia-Geral da União) já sinalizam o estágio final das discussões na CCAF (Câmara de Mediação e Conciliação da Administração Pública Federal).
O compromisso é protocolar o termo final de conciliação no STF até o início de fevereiro de 2025 porque é preciso ter tudo concluído antes da AGO (Assembleia Geral Ordinária) da Eletrobras que elegerá a nova composição dos seus conselhos de administração e fiscal.
Analistas e gestores do mercado financeiro, ouvidos pela reportagem com a condição de não terem o nome citado, dizem que o cronograma é apertado, mas factível se as negociações estiverem tão avançadas como as partes dão a entender. Demanda também boa vontade de todos os envolvidos.
O termo de conciliação precisa chegar ao STF até o final de janeiro, e ser aprovado no plenário da Corte antes do final março. Só assim a Eletrobras poderá cumprir o trâmites para submeter os termos do acordo à avaliação dos acionistas em uma AGE (Assembleia Geral Extraordinária) e, na sequência, cumprir os trâmites para apresentar os novos ocupantes do conselho para serem validados, em 29 de abril, na AGO.
A indicação de que o governo está prestes a encerrar a discussão em troca de cadeiras no conselho da Eletrobras e sem fazer valer uma oferta mais ambiciosa, decepcionou os eletricitários. Em boletins divulgados nos últimos dias, o Coletivo Nacional dos Eletricitários tem feito duras críticas ao andamento das discussões.
Já chamou os negociadores do governo de “traidores da pátria” por aceitarem trocar o direito de voto da União na Eletrobras por cadeiras no conselho. Também disse que a Eletrobras “quer pagar fiança” para integrantes do governo, sem garantir nenhum benefício.
Um dos textos lembra que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia classificado a privatização da Eletrobras como “crime de lesa-pátria”, “bandidagem” e escárnio”. Vários sindicalistas se sentem esquecidos e alguns segmentos da categoria já sinalizaram a intenção de até romper com o governo Lula.
ALEXA SALOMÃO / Folhapress