BARRA MANSA, RJ (FOLHAPRESS) – Em um estudo clínico realizado com o canabigerol (CBG), pacientes relataram uma redução dos sintomas de ansiedade e estresse e até apresentaram um ligeiro ganho de memória. Além disso, os resultados mostram que esse medicamento não levou aos sintomas de intoxicação típicos do uso de canabinoides, o que pode dar novo impulso a pesquisas sobre sua aplicação farmacêutica.
Segundo as observações, o uso de 20 mg de CBG reduziu os sintomas de ansiedade em 20, 45 e 60 minutos após a ingestão. Para garantir a credibilidade dos resultados, o estudo foi conduzido com uso de placebo em pacientes randomizados e com controle duplo cego. Esse é o primeiro ensaio clínico conduzido com o canabigerol investigando os efeitos agudos desses sintomas psiquiátricos em humanos.
O combate ao estresse também pode ser favorecido pelo uso dessa substância. Em comparação com os pacientes que receberam placebo, aqueles que fizeram uso do CBG apresentaram diminuição nos níveis desse sintoma ainda nos primeiros 20 minutos.
O canabigerol é um ente os diversos canabinoides encontrados na maconha. Apesar disso, não é um dos componentes majoritários da planta, e sim um precursor dos abundantes canabidiol (CBD) e tetrahidrocanabinol (THC).
Na pesquisa, o canabigerol não produziu deficiências cognitivas ou motoras, efeitos adversos que são comuns no uso do THC. Além disso, os participantes não relataram uma melhora significativa do humor. Combinadas, essas observações indicam que o CBG pode não levar ao mesmo efeito de intoxicação que o tetrahidrocanabinol.
Outro resultado do uso do CBG que surpreendeu os pesquisadores foram seus efeitos na memória. Ao contrário do que se observa com o uso de THC, por exemplo, o canabigerol aumentou a capacidade dos participantes de se lembrarem de uma lista de palavras ditadas a eles, em um dos testes feitos pelos pesquisadores.
O estudo foi conduzido entre 34 usuários saudáveis de cânabis. Os sintomas de ansiedade e estresse foram avaliados por meio de entrevistas e relatos pessoais dos participantes antes e depois do uso do medicamento. Foi usada uma dose de 20 mg de CBG derivado de cânhamo, quando não o placebo.
Eles também tiveram que relatar possíveis efeitos colaterais, como olhos e boca secos, aumento do apetite, palpitações cardíacas e sonolência. Todo o processo foi repetido uma semana depois. A pesquisa foi publicada na revista científica Scientific Reports.
Ela, entretanto, deve ser interpretada com ressalvas e possui limitações importantes. Wilson Lessa Júnior, pesquisador da Universidade Federal da Paraíba, diz que, em primeiro lugar, o número de participantes é muito reduzido e os resultados observados podem não ser tão generalizados assim.
Além disso, as doses usadas foram baixas e as condições de saúde não foram complementadas por exames fisiológicos, mas apenas com base nos relatos individuais. Essa, entretanto, é a fase seguinte dos trabalhos, segundo os autores.
A pesquisa foi motivada por um estudo preliminar, do mesmo grupo de especialistas, que indicou que 51% dos usuários de CBG estão em busca de controlar a ansiedade. A maioria deles (74%) atesta, com base na própria experiência, que esses medicamentos trazem mais efeitos do que os convencionais. Os dados foram obtidos a partir de um questionário online com 127 voluntários.
Todos os participantes relataram ter usado majoritariamente o canabigerol nos últimos seis meses prévios à pesquisa. Apenas oito deles disseram usar a substância para fins recreativos, tendo a maioria buscado tratamento com vistas à melhoria da saúde. Além da ansiedade e do estresse, a depressão, dor crônica e insônia foram outros problemas de saúde que motivaram essa busca.
Para eliminar a subjetividade dessas constatações, a professora e pesquisadora Carrie Cuttler, da Universidade do Estado de Washington, resolveu então conduzir um ensaio clínico randomizado e com duplo cego, chamado de método de pesquisa padrão ouro.
Os canabinoides já são empregados no tratamento de esclerose múltipla e de dor crônica, especialmente de pacientes de câncer, segundo o professor José Luis Vieira, pesquisador da Universidade Federal do Pará. O pesquisador acrescenta que os canabinoides também contribuem para o bem-estar de pacientes em quimioterapia, reduzindo náuseas e vômitos decorrentes do tratamento. Por fim, ele ressalta que os tratamentos devem ser feitos sempre com acompanhamento médico.
Estudos anteriores já haviam mostrado alguns desses efeitos do CBG, em particular, em outros animais, especialmente com camundongos. Um estudo publicado na European Journal of Pain, por exemplo, revelou que essa droga pode ter efeitos no alívio de alguns tipos de dores. Para chegar nessa conclusão, os pesquisadores administraram doses do canabigerol em camundongos submetidos a diferentes testes de dor. Resultados como esse abrem portas para novas oportunidades de estudos sobre os benefícios dessa substância.
ACÁCIO MORAES / Folhapress