Empreendedora de Israel relaciona sucesso do país em inovação com a criação de filhos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há décadas se estuda o que fez um país pequeno como Israel se transformar em uma potência de inovação. A empresária Inbal Arieli, uma das pessoas maisinfluentes no setor israelense de alta tecnologia, tem a tese de que o segredo está na criação das crianças.

Ela desenvolve esse pensamento no livro “Chutzpah: Por que Israel é um hub de inovação e empreendedorismo”. O termo em iídiche -pronunciado rutspa- significa ousadia em tradução literal. Mas para Arieli é algo mais: ele abarca características como o questionamento, honestidade e liberdade presentes desde cedo na vida das crianças israelenses e que faz parte da veia empreendedora do país.

Chutzpah é apresentado com alguns princípios. São eles: abraçar a incerteza; atrever-se a falhar e não ter medo de cometer erros; desafiar o óbvio; fazer perguntas -pois quanto mais questionar, melhor você entende; colaborar com as pessoas e, por último, fazer acontecer.

Mãe de três meninos, a autora utilizou as próprias experiências e observou suas crianças para elaborar o cerne do livro. Arieli esteve no Brasil em setembro para o lançamento da edição em português pela editora Bookman.

Ela é sócia-gerente de uma empresa de investimento em tecnologia sediada em Tel Aviv, tendo assumido outros cargos executivos na comunidade de tecnologia de Israel. Ou seja, ela entende desse ecossistema.

Arieli alavancou suas habilidades como empreendedora no Exército –regime obrigatório para todos em Israel–, onde foi tenente na Unidade de Inteligência 8200, grupo de elite mais tecnológico da Força de Defesa de Israel. De lá saíram nomes como Avishai Abrahami, cofundador da Wix, uma das principais plataformas desenvolvedoras de websites.

O setor de tecnologia e inovação é uma grande força econômica de Israel, que investe em diversas áreas. O Índice de Inovação Global de 2022 mostrou que o país está em terceiro lugar no ranking de indicadores de inovação –sendo o que mais investe em pesquisa e desenvolvimento. Ele empata com China e Hong Kong e fica atrás dos Estados Unidos e Singapura. Tudo isso com o país vivendo crise do governo de Binyamin Netanyahu e conflitos geopolíticos.

Para deixar a explicação sobre a relação entre a criação de crianças israelenses e o desenvolvimento de Israel mais concreta, a empresária usa de exemplo um parquinho. Ela analisou playgrounds em países da Europa a partir das placas de orientações. Uma diz, por exemplo, que é proibido subir no escorregador sem ser pela escada. Outra veta tomar sorvete enquanto brinca.

Já nos parquinhos de Israel, as únicas restrições nem são direcionadas às crianças: é proibido fazer churrasco e menores de quatro anos devem estar acompanhados.

Isso deixa um ambiente livre para as crianças resolverem os próprios conflitos, segundo Arieli. “Elas vão saber o que fazer quando uma delas estiver subindo num escorregador enquanto outra está descendo”, diz, em entrevista a jornalistas no Consulado Geral de Israel em São Paulo, enquanto mostra uma imagem de um parquinho cheio de crianças brincando de tudo quanto é jeito, em todos os cantos.

Esse caos organizado é chamado no livro de “balagan”. A palavra, que vem do russo, é usada por israelenses para designar bagunça, ambiente desordenado que causa conflitos. Para Arieli, quem está nessa situação é forçado a encontrar soluções imediatas e específicas.

“O balagan promove em crianças e adultos a criatividade, a solução de problemas e a independência -três características altamente eficazes dos empreendedores”, diz.

Arieli reconhece, porém, que criar filhos com essa liberdade, estimulando-os a explorar o mundo, pode aumentar a preocupação dos pais. “Quando tive meu primeiro filho, Yonatan, percebi que, embora fosse difícil não me preocupar com ele, o que eu podia fazer era não passar essa ansiedade e medo para meu filho”, escreve ela no livro. “Sou protetora, mas dou muita liberdade. Tento equilibrar os dois”, diz.

De sua experiência no Exército, a empresária também cita como Israel prepara os jovens para estarem sempre inovando. Segundo ela, cada soldado tem que pensar por si mesmo, tomar decisões e arcar com as consequências. Lá, eles são desafiados com problemas que na prática não poderiam saber. Assim, treinam o emocional, se arriscam e ficam diante do desconhecido.

“Às vezes não saber é a chave para saber mais”, afirma ela, que tem uma tatuagem de um ponto de interrogação.

Quando questionada sobre a representação das mulheres no setor de empreendedorismo e tecnologia, Inbal reconhece que o número vem aumentando, mas que elas ainda são minoria.

Um relatório do Banco Mundial mostrou que as mulheres representam menos de um terço da força de trabalho mundial em áreas relacionadas à tecnologia.

“A boa notícia é que estamos cada vez mais presentes nesses espaços, mas a má notícia é que precisamos ser pacientes”, diz. “O que temos que fazer é ser um exemplo para as meninas mais jovens.”

Por isso, Inbal participa do projeto Woman to Woman, uma rede de apoio e capacitação de mulheres israelenses da área da tecnologia, saúde, direito e política.

E para quem está começando a empreender, o conselho que Arieli dá é: seja flexível. “Como empresária, você se apaixona pela sua ideia, mas isso é perigoso porque vai querer estar sempre certa. É importante escutar e ter feedbacks.”

VITÓRIA MACEDO / Folhapress

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