Entenda como ficam eleições no Equador após assassinato de Villavicencio

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O assassinato do candidato à Presidência do Equador Fernando Villavicencio, nesta quarta (9), mergulhou as iminentes eleições no país em incerteza. Ao menos três candidatos suspenderam suas campanhas —um deles, Jan Topic, foi ameaçado publicamente pela facção que reivindicou a autoria do crime.

Mesmo assim, o governo de Guillermo Lasso anunciou que manterá a data do pleito para 20 de agosto.

“A data permanece inalterada […], em cumprimento às exigências constitucionais e legais”, afirmou Diana Atamaint, titular do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), em vídeo publicado no YouTube após uma reunião do gabinete de Segurança e outros altos funcionários em que ela aparece ao lado de Lasso.

Atamaint acrescentou que Forças Armadas e polícia “redobrarão a segurança em todas as seções eleitorais” de modo a garantir que o pleito ocorra de forma “livre, em paz e com segurança”. O país está sob estado de exceção em decorrência do crime. Assim, o Exército foi mobilizado para ocupar as ruas.

Thiago Vidal, diretor de análise política para a América Latina da consultoria Prospectiva, explica que o governo não tinha escolha legal que não manter a data das eleições. Afinal, este não é um pleito qualquer, tendo sido convocado por Lasso depois que ele, sob ameaça de impeachment, dissolver o Congresso.

Ao mesmo tempo, observa o analista, a opção por decretar estado de exceção acrescenta ainda mais complexidade ao panorama. Sob essa circunstância, forças de segurança pública têm o poder de dissolver manifestações populares, que não são raras após tragédias como as que o país testemunhou nesta quarta. “Há uma incerteza em termos do que se pode ou não fazer”, diz Vidal.

Também não está claro que rumos as eleições tomarão. Villavicencio era um dos cinco principais candidatos à Presidência, e suas chances no pleito variavam bastante a depender da pesquisa analisada.

Levantamento do instituto Cedatos de 20 de julho indicava, por exemplo, que o representante do partido Movimiento Construye estava em segundo lugar na corrida, com 13,2% das intenções de voto, atrás apenas de Luisa González, candidata apoiada pelo ex-presidente Rafael Correa, com 26,6%. Já um estudo da agência ClickReport em 5 e 6 de agosto mostrava Villavicencio em quinto, com 7,5% da preferência.

Gonzáles ainda manteria a dianteira, com 29,3% das intenções, seguida por Yaku Pérez, líder indígena de esquerda, com 14,4%; Otto Sonnenholzner, vice-presidente na gestão do direitista Lenín Moreno (2017-2021), com 12,7%; e o ex-empresário da área de segurança Jan Topic, com 9,6%. Na pesquisa do Cedatos, eles apareciam com 12,5%, 7,5% e 4,4% das intenções de voto, respectivamente.

Os três últimos suspenderam suas campanhas após o crime e pediram união. “O mínimo que posso fazer é expressar minha solidariedade a seus familiares e apoiadores”, afirmou Pérez. “Convido os candidatos a deixarem todas as bandeiras políticas de lado e fazerem um pacto social pela segurança.”

Ainda nesta quinta-feira, Pérez afirmou que conversou com Sonnenholzner e deixou mensagens para González e Topic, além de ter falado com os outros três presidenciáveis da corrida, Xavier Hervas, Bolívar Armijos e Daniel Noboa, que juntos somavam intenções de voto em torno dos 10%.

O líder indígena afirmou que pretendia realizar um encontro entre candidatos e a Igreja Católica para discutir um “acordo de segurança nacional”, de acordo com a agência de notícias Reuters.

Já González interrompeu um comício que fazia na mesma hora do assassinato para falar sobre o caso. “Diferenças políticas são resolvidas nas urnas. Quando atingem um, atingem todos”, afirmou ela. Ao contrário de seus principais rivais, porém, ela foi a única que não afirmou se pretende suspender a agenda.

Villavicencio era um grande opositor de Correa. Conhecido por denunciar casos de corrupção enquanto era jornalista e deputado, ele chegou a ser condenado a 18 meses de prisão por difamação devido a declarações feitas contra o líder esquerdista. Ele buscou asilo no Peru, país vizinho, em 2017.

Na visão de Vidal, se González seguir com a campanha nessa situação, poderia no limite diminuir sua vantagem em relação aos demais candidatos. Já seus rivais podem, de certa forma, ganhar impulso caso consigam conquistar o eleitorado de Villavicencio, naturalmente contra o correísmo. Como os três têm índices de intenção de voto semelhantes, isso poderia inclusive levá-los a um segundo turno.

Ainda há a possibilidade de que a coligação da qual o candidato assassinado fazia parte o substitua pela sua companheira de chapa, a ativista Andrea González. Segundo o jornal El Universo, o Código Eleitoral permite a mudança tanto em caso de morte quanto de incapacitação física, mental ou legal comprovada.

Em entrevista coletiva nesta quinta, Andrea, usando um colete à prova de balas, disse que Villavicencio é insubstituível. Um advogado da família do político levantou a hipótese de que um tio da vítima, Galo Valencia Gavilanes, poderia assumir a candidatura, mas nada está decidido oficialmente.

Andrea Gonzalez, companheira de chapa de Fernando Villavicencio, durante entrevista coletiva em Quito, no Equador – Karen Toro – 10.ago.23/Reuters

A norma também estipula que, se a morte acontecer antes da impressão das cédulas correspondentes, novas versões serão impressas com a fotografia e o nome do substituto. Do contrário, aquelas já impressas serão utilizadas, e os votos no candidato anterior serão contabilizados para o seu substituto.

Não seria a primeira vez que isso ocorreria no país. Omar Menéndez, candidato à prefeitura de Puerto López, em Manabí, pelo partido correísta, foi assassinado em 4 de fevereiro, um dia antes das eleições. Sua aliança ganhou o pleito, e Verónica Lucas, da mesma legenda, então assumiu o cargo.

O tema da segurança é central nestas eleições no Equador. Nos últimos anos, a população do país latino-americano passou a ver no noticiário cenas com as quais não estavam acostumados, como chacinas em prisões, cadáveres pendurados em pontes, sicários abrindo fogo em restaurantes e sequestros-relâmpago.

Há uma semana, Villavicencio denunciou ameaças contra ele e sua equipe de campanha, supostamente procedentes do líder de um grupo criminoso ligado ao narcotráfico que está detido.

CLARA BALBI / Folhapress

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