Entenda como funcionam as eleições no Reino Unido

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Parlamento do Reino Unido é eleito de forma periódica desde 1689, quando a Declaração de Direitos, a famosa Bill of Rights, foi imposta à monarquia britânica pela nobreza como resultado da Revolução Gloriosa. Nesses mais de três séculos, o Legislativo do país ganhou importância e passou por reformas que permitiram que cada vez mais pessoas tivessem direito ao voto.

Até o início do século 19, apenas proprietários de grandes terras podiam eleger membros do Parlamento. Em um espaço de quase cem anos, de 1832 a 1928, uma série de quatro mudanças na lei estendeu o direito ao voto a homens ricos que morassem em cidades, depois a homens da classe trabalhadora, depois a mulheres ricas e, por fim, em 1928, a todas os cidadãos britânicos com mais de 21 anos.

O Parlamento britânico é composto de duas Casas, como no Brasil: a baixa, a Câmara dos Comuns, e a alta, a Câmara dos Lordes. Entretanto, ao passo que a Câmara dos Deputados e o Senado brasileiros são divididos entre representação por população e por estado, o Legislativo do Reino Unido ainda mantém sua estrutura aristocrática.

Isso significa que, enquanto os comuns são eleitos pela população para mandatos de até cinco anos, os assentos da Câmara dos Lordes, como o nome indica, só podem ser ocupados por membros da nobreza, que permanecem na Casa por toda a vida.

Apesar disso, hoje, após reformas, apenas 92 dos 785 lordes ocupam seus assentos em virtude do nascimento. A maioria chega ao cargo por nomeação direta do rei ou rainha, que obedece a recomendações dos partidos políticos. Por fim, a Igreja Anglicana, que não é separada do Estado no Reino Unido, tem direito a 25 assentos, ocupados pelos chamados lordes espirituais.

Em outra diferença significativa da maior parte dos sistemas bicamerais do mundo, a Câmara dos Lordes tem poder bastante reduzido em comparação com a dos Comuns. Os lordes não participam da equação que determina quem será primeiro-ministro, e, embora possam adiar a promulgação de uma lei aprovada pelos comuns por até um ano, não têm poder de veto sobre a legislação.

Ainda assim, a Câmara dos Lordes é bastante criticada pela esquerda britânica por sua característica aristocrática e antidemocrática, e um dos princípios do Partido Trabalhista é a abolição da Casa e sua substituição por um Senado composto por membros eleitos.

É na Câmara dos Comuns que é feita a política nacional do Reino Unido. Atualmente, os britânicos votam em seus representantes na Casa por meio de um sistema distrital puro, no qual cada um dos 650 distritos eleitorais, demarcados por população, elege um representante em uma corrida eleitoral própria. Além disso, os parlamentares são eleitos por um sistema de maioria simples, sem segundo turno.

As mudanças nos séculos 19 e 20 rumo ao sufrágio universal (que não se aplicaram às muitas colônias do Império Britânico) serviram para consolidar, principalmente no período do pós-guerra, o domínio de duas forças políticas: o Partido Conservador, de direita, e o Partido Trabalhista, de esquerda.

Líderes marcantes do campo conservador durante a segunda metade do século 20 incluem Winston Churchill, que liderou o país no conflito contra a Alemanha nazista, e Margaret Thatcher, primeira mulher a ser premiê e responsável pela liberalização da economia britânica, com a privatização de estatais e o corte de benefícios trabalhistas e sociais.

No lado trabalhista, as principais lideranças foram Clement Attlee, cujo governo conduziu a reconstrução do Reino Unido imediatamente depois da Segunda Guerra e estabeleceu o Estado de bem-estar social britânico, e Harold Wilson, de papel importante na pauta social do país, com a descriminalização da homossexualidade e do aborto e o fim da pena de morte.

Nas últimas décadas, os conservadores se consolidaram em distritos nas zonas rurais, no sul e no norte da Inglaterra; e os trabalhistas, nas grandes cidades e antigas áreas industriais: Londres, Liverpool, Manchester e as regiões de Yorkshire e de Newcastle.

Passada a eleição, é a composição da Câmara dos Comuns que define quem será o primeiro-ministro. Não há uma eleição formal: a legislação britânica estipula que a escolha do primeiro-ministro é prerrogativa do monarca. Entretanto, tradicionalmente, o rei ou rainha torna premiê o líder do partido que obtiver maioria na Câmara dos Comuns –a última vez que um monarca desobedeceu a essa convenção foi em 1834.

Se nenhum partido tiver conquistado maioria nas eleições, a sigla com maior número de votos pode tentar formar um governo de coalizão, como é comum em outros países parlamentaristas. Caso falhe, o partido que terminou em segundo lugar recebe do monarca a chance de constituir um governo. Se tampouco conseguir, novas eleições são convocadas.

O papel constitucional do rei ou rainha nesse sistema, inclusive, é motivo de debate. O Reino Unido não possui Constituição, no sentido de que não há um documento que estabelece o funcionamento do Estado, e sim uma série de leis importantes, como a Bill of Rights, e tradições não codificadas.

Uma dessas tradições é a do processo de escolha do primeiro-ministro. Outra é a do consentimento real, necessário para que qualquer lei aprovada pelo Parlamento entre em vigor, uma prática desrespeitada pela última vez em 1708.

VICTOR LACOMBE / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS