RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Desde a eleição presidencial de 2022, os irmãos Ciro e Cid Gomes (ambos PDT) romperam relações e racharam o partido no Ceará, reduto eleitoral da família.
A briga é marcada por acusações de traições e arbitrariedades.
De um lado, Cid propõe uma aliança do PDT com o PT no Ceará. Do outro, Ciro quer a independência do PDT no estado. Ele também acusa o irmão de tê-lo abandonado na corrida ao Planalto e atuado em prol do presidente Lula (PT).
Hoje, o PDT integra a base do líder petista, com o presidente licenciado da sigla, Carlos Lupi, ministro da Previdência.
Entenda em 6 pontos o racha entre os irmãos.
Como começou a briga
O afastamento entre o ex-presidenciável e o senador começou com a escolha do candidato do PDT ao governo cearense. Cid defendia Izolda Cela, que assumiu o cargo após o então governador Camilo Santana (PT) se licenciar para concorrer ao Senado.
Ciro, por sua vez, via a possível indicação de Izolda como interferência do PT nos planos do PDT. No final, o partido escolheu Roberto Cláudio, ex-prefeito de Fortaleza –rompendo a aliança de quase duas décadas com o PT, que lançou Elmano de Freitas, deputado estadual na época.
Contrariado, Cid se afastou da disputa estadual e presidencial, abdicando da coordenação da campanha do irmão, posto que ocupou em outras vezes que Ciro disputou a Presidência.
A atitude do senador revoltou o ex-ministro, e o sentimento de ter sido traído se agravou durante a campanha do segundo turno.
Cid, até então escondido e dizendo que deixaria a política, passou a ser um cabo eleitoral ativo para Lula. Depois disso, Ciro afirmou que o irmão deu uma facada em suas costas.
O que está em jogo
A briga entre irmãos impacta o PDT em três aspectos cruciais: a postura do partido no Ceará, sua relevância nacional e as estratégias para 2024.
Cid quer retomar a aliança com o PT no Ceará e propõe uma chapa com os petistas para a eleição municipal de 2024. Ciro discorda. Ele defende que a sigla tenha candidato próprio e seja independente em relação ao governador petista.
O Ceará é importante para o PDT, pois é o estado que mais dá votos ao partido para deputado federal. Das 18 cadeiras ocupadas pela sigla na Câmara, 5 são cearenses. É a maior bancada pedetista.
Ao menos 43 prefeitos, 13 deputados estaduais e 4 federais anunciaram que pediriam a desfiliação do partido.
O único parlamentar federal que não pediu desfiliação foi André Figueiredo, líder do partido na Câmara e presidente nacional em exercício do PDT. Com a saída dos deputados, o espaço da sigla na Casa cai para 13.
A disputa também dificulta a definição das estratégias do PDT para 2024, já que a atenção está voltada para o conflito no Ceará. A avaliação da cúpula do partido é a de que o racha no estado está impedindo a escolha de quadros e alianças para as próximas eleições no resto do país.
Por que Ciro e Cid são importantes para o PDT
Ciro e Cid se filiaram ao PDT em 2015 com o objetivo de fazer o partido crescer –o que, de fato, fizeram.
Em 2018, a sigla elegeu 28 deputados, 8 a mais do que na eleição anterior. Eles tornaram o Ceará na maior bancada da sigla: em 2014, o estado só tinha um deputado federal do PDT (André Figueiredo); na eleição seguinte, passaram a ser 6.
Porém, em 2022, o partido perdeu significativamente o espaço na Câmara. A redução é atribuída por pedetistas a uma campanha mal sucedida de Ciro e seus ataques duros contra Lula, que espantou eleitores da esquerda que votavam no PDT. Ainda assim, uma ala da executiva nacional do PDT vê o ex-presidenciável como um ativo político importante para 2026.
Já Cid mantém sua influência na política cearense, sendo apontado como responsável pelos diversos pedidos de saída de membros do partido, incluindo deputados federais, estaduais, prefeitos e vereadores.
Quem tem mais força no estado
A maior influência no Ceará é de Cid. Ele trava uma disputa judicial com Figueiredo pelo diretório estadual. Hoje, uma liminar do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do estado garante a presidência do PDT cearense ao senador.
Cid tem ao seu lado maioria dos pedetistas no estado, incluindo 13 dos 16 deputados estaduais e 50 dos 57 prefeitos, segundo conta dele próprio. Com exceção de Figueiredo, ele também tem o apoio de todos os deputados federais e dos suplentes.
Ciro, por sua vez, perdeu parte de seu capital político na eleição passada. Ele se afastou dos aliados e foi escondido da campanha de Roberto Cláudio ao governo do estado. Em 2022, teve o seu pior resultado eleitoral no estado, conquistando apenas 6,8% dos votos. Comparando com 2018, quando também concorreu ao Planalto, ele tinha sido o candidato mais votado no Ceará, com 40,95%.
Quem tem mais força no partido nacionalmente
A postura de Cid na última eleição também desagradou a Figueiredo e demais líderes do PDT, que consideram que o senador virou as costas à sigla ao não apoiar os candidatos do partido. Além disso, a briga pelo diretório cearense é vista como uma afronta de Cid aos dirigentes nacionais.
Nesse sentido, Ciro tem mais força no PDT nacional do que o irmão. Mas ele também não é unanimidade entre os dirigentes pedetistas.
Apesar de estar do mesmo lado de Ciro, Figueiredo não é cirista. Ele não apoiou a campanha do ex-presidenciável nem concordava com tom agressivo do então candidato contra Lula. Essa posição é compartilhada com demais integrantes da cúpula pedetista.
O que pode acontecer agora
A saída de Cid do PDT já é dada como certa por colegas de partido. Apesar de ainda brigar judicialmente para se manter como presidente no diretório cearense, o senador já admite a possibilidade de se desfiliar, mas ressalta que a decisão será tomada junto com aliados. Figueiredo, por sua vez, já expressou a intenção de expulsar Cid.
Há dois partidos apontados como possível destino de Cid: Podemos e o PSB. No Ceará, as duas siglas têm dirigentes ligados a aliados próximos de Cid. O primeiro é comandado por Bismarck Maia, pai do deputado federal pedetista Eduardo Bismarck. No segundo, quem está à frente é o pai de Camilo Santana, Eudoro Santana.
Quanto ao futuro de Ciro, a ideia do PDT é que ele continue no partido e atue para recuperar as perdas causadas pela briga com o irmão. Uma opção seria sua candidatura a deputado federal na eleição de 2026 para fortalecer a bancada pedetista na Câmara.
Com a saída de Cid se consolidando, será a primeira vez em 33 anos que os irmãos não vão estar no mesmo partido.
CAMILA ZARUR / Folhapress