Entenda por que quilombolas foram incluídos na Lei de Cotas

SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) – Os quilombolas passaram a ser contemplados pela Lei de Cotas, mudança aprovada pelo Senado na última terça-feira (24) e prevista para estar em vigor até 2033. O texto segue para a Presidência da República para análise de sanção.

A criação de uma categoria específica para pessoas dessas comunidades era considerada necessária, de acordo com especialistas, que apontam que somente a existência de pretos e pardos como beneficiários não era suficiente para abarcar essa parcela da população.

“O processo histórico da formação dos quilombos é complexo, e não pode ser reduzido à discriminação racial, como é o caso das cotas raciais”, explica o cientista político da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), João Feres Júnior, 58.

“O denominador comum é a marginalização e segregação espacial sofrida por grupos da população ao longo da nossa história, o que gerou um tipo de identidade comunitária, que inclusive, muitas vezes, sobrevive à mudança das pessoas para outros espaços urbanos ou rurais.”

Givânia Maria da Silva, coordenadora do coletivo nacional de educação da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos), diz que especificar na lei garante que o grupo seja contemplado.

“Qual a diferença da legislação agora? Os quilombolas não eram mencionados nas cotas, eles estavam no meio, entre os pretos e pardos. Agora, eles são mencionados como uma das categorias. Os quilombolas concorrem entre eles, aí tem uma proporcionalidade”, explica.

O texto estabelece que os candidatos concorrerão às vagas reservadas para cotas apenas se não alcançarem, inicialmente, as notas para ampla concorrência.

A Lei de Cotas, de 2012, previa a revisão do sistema em 2022, uma década após a sanção, mas a política só foi aprovada pela Câmara dos Deputados em agosto deste ano.

Além da avaliação daqui a dez anos, o texto aprovado na terça estabelece o acompanhamento anual da política pública.

“Acho que, à medida que a legislação for aplicada nesse novo formato, certamente desafios já começam a surgir, mas o mais importante é que agora a Lei de Cotas não pode mais se isentar de reconhecer a existência dos quilombolas como sujeitos dessa política, acho que aí é o grande ganho”, diz ela.

Na perspectiva da educação, Dandara Oliveira, especialista em Juventude e Raça da ActionAid e em Articulação e Advocay no Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista), afirma que essa inclusão se vincula a um avanço no aumento da representatividade quilombola para espaços além das instituições de ensino.

“O Brasil é composto numa cama multiétnica e, quando a gente incluiu os quilombolas nas cotas, a gente está dizendo que entende essa diversidade étnico-racial e que o território também é importante. E com isso valorizar o território e as pessoas que estão ali produzindo este conhecimento.”

Apesar da conquista, a coordenadora da Conaq afirma que ainda há pontos a serem desenvolvidos pela Lei de Cotas.

“A gente tem consciência de que na versão anterior, como nessa, a gente têm lacunas, porque o cálculo é feito em cima de uma proporcionalidade. Mas, ao mesmo tempo, a gente ter a categoria quilombola, é uma forma também de reconhecimento desses grupos, das comunidades, como sujeitos de direito dessa política”, pontua Givânia.

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VEJA QUAIS AS MUDANÇAS NA LEI DE COTAS:

– Inclusão expressa de quilombolas entre os beneficiados na reserva de vagas em instituições federais de educação superior e de ensino técnico de nível médio. Atualmente, metade das vagas é reservada para alunos que frequentaram a rede pública de ensino durante todo o Ensino Médio. Também já eram contemplados estudantes de baixa renda, negros, indígenas e pessoas com deficiência.

– Redução do rendimento familiar mensal máximo para estudantes que cursaram todo o Ensino Médio em escolas públicas (e tentam as vagas destinadas a pessoas de baixa renda).

– No mecanismo de ingresso, primeiro serão observadas as notas pela ampla concorrência e, posteriormente, as reservas de vagas para cotas;

– Metade das vagas será reservada a candidatos que comprovem renda familiar de até um salário mínimo (R$ 1.320) por pessoa. Hoje, esse limite é de um salário mínimo e meio (R$ 1.980).

– Avaliação a cada 10 anos, com ciclos anuais de monitoramento;

– Atualização da nomenclatura e inclusão de ministérios responsáveis pelo acompanhamento da política;

– Estabelecimento de prioridade para os cotistas no recebimento de auxílio estudantil;

– Redução da renda familiar per capita para 1 salário mínimo na reserva de vagas de 50% das cotas;

– Ampliação das políticas afirmativas para a pós graduação;

– Inclusão dos quilombolas nas cotas das instituições federais de ensino;

– Institui que as vagas reservadas para subcotas não usadas serão repassadas, primeiramente para outras subcotas e, depois, aos estudantes de escolas públicas;

– Permite o uso de outras pesquisas do IBGE, além do Censo, para o cálculo da proporção de cotistas nas unidades da federação.

Metade das vagas será reservada a candidatos que comprovem renda familiar de até um salário mínimo (R$ 1.320) por pessoa. Hoje, esse limite é de um salário mínimo e meio (R$ 1.980).

MARIANA BRASIL / Folhapress

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