SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O apagão provocado pela tempestade na Grande São Paulo na última sexta-feira (11) aflorou uma série de problemas dos órgãos públicos na fiscalização da Enel, a concessionária de energia elétrica da região, que está sendo pressionada pela demora no atendimento e na restauração da energia das residências e comércios.
Todos os envolvidos aproveitaram para criticar a concessionária após o novo apagão, mas eles próprios também têm, em algum grau, responsabilidades e erros nesse processo, como afirmam especialistas ouvidos pela Folha. Entenda o que cabe a agências, prefeitura e governos estadual e federal, segundo esses especialistas.
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O PAPEL DE CADA ENTE PÚBLICO
ANEEL, AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA
– Responsabilidade É o regulador. Possui autonomia e foi criado para aplicar a lei do setor fazendo a mediação de interesses de empresas e consumidores. Deve fiscalizar o cumprimento do contrato de concessão e avaliar os reajustes na conta de luz. Pode fazer intervenção nas distribuidoras e levantar argumentos para a caducidade, mas não tem poder de tirar a concessão. No caso da Enel SP, deve atuar na fiscalização e cobrar a adoção das mudanças que agilizem a religação da luz em caso temporal
– Erro Não ter adotado medidas mais drásticas e feito marcação cerrada na Enel SP, colocando um ou dois fiscais dentro da empresa para vistoriar as mudanças que evitariam lentidão na retomada do fornecimento em caso de novo evento climático extremo
– O que diz a Aneel A agência aplicou multa, acompanhou a elaboração do plano e manteve a fiscalização, por meio de convênio com a Arsesp (agência estadual). A agência opera com déficit de 248 servidores, 30% do quadro, e opera neste ano com um corte de 42% no seu orçamento
ARSESP, AGÊNCIA REGULADORA DE SERVIÇOS PÚBLICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO
– Responsabilidade Fiscalizar as concessionárias do setor por delegação de Aneel, de forma programada e sob demanda. Os tipos de fiscalização e os locais de verificação são definidos pela Aneel, por meio da metodologia de fiscalização estratégica
– Erro Não divulgar imediatamente para a população que a verba da Aneel era insuficiente e que isso poderia comprometer o acompanhamento da Enel
– O que diz a Arsesp Solicitou à Aneel, em março, autorização para utilizar recursos próprios e realizar mais fiscalizações em São Paulo, e o aditivo contratual só foi assinado em setembro. Mesmo, assim, intensificou a fiscalização da Enel SP e propôs aperfeiçoamentos regulatórios. Desde o último sábado (12), seus técnicos estão no centro de operações da Enel, fiscalizando a volta da energia
PREFEITURA DE SÃO PAULO
– Responsabilidade Manter política pública eficiente para fazer a gestão da arborização
– Erro Como ficou demonstrado, não conseguiu organizar ação coordenada com a Enel SP para gestão das árvores, nem para a poda ao longo do ano, nem para a sua remoção após evento climático extremo
– O que diz a prefeitura Responde pelo manejo das árvores fora da zona de risco das instalações elétricas, pois desde 2020 a Enel tem um convênio com a cidade de São Paulo para fazer o plano anual de manejo de árvores em zona controlada e de risco de instalações elétricas. A Secretaria Municipal de Subprefeituras mantém reuniões mensais com a concessionária para tratar do tema
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
– Responsabilidade Acompanhar e sugerir providências que podem ser ignoradas pelos demais entes porque a gestão estadual não tem ingerência regulatória sobre a distribuição de energia desde a privatização da Eletropaulo em 1998
– Erro Como tem instrumentos para ação local, dentro do cenário de mudanças climáticas, pode incluir na política pública ações conjuntas, com a Prefeitura de São Paulo, para gestão das árvores, e com o governo federal, na regulamentação da fiação, medidas que poderiam ser replicadas em todo o estado
– O que diz o governo do estado A atual gestão mobilizou seus organismos ligados ao estado para agilizar o atendimento à população, como Defesa Civil e Corpo de Bombeiros, Procon e até a Sabesp, e pediu urgência de ações à Arsesp
UNIÃO, REPRESENTADA PELO MME – MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA
– Responsabilidade É quem concede a prestação do serviço de distribuição e tem poder de decretar a caducidade. Deve se manter informado sobre a atuação da Aneel. Especificamente no caso da Enel SP, é importante reconhecer que a falha é um alerta para que reformule políticas públicas de longo prazo e prepare o setor de energia para as mudanças climáticas
– Erro Emitir sinais dúbios sobre Enel SP, se aproximando da empresa e indicando que poderia renovar a concessão, já que a empresa tinha a intenção de elevar investimentos. Atacar publicamente a Aneel, enquanto o governo deixa a agência sem dinheiro e pessoal para exercer a fiscalização
– O que diz União e MME A Aneel trata sobre recursos com o Ministério do Planejamento e Orçamento. O governo federal não foi responsável pela concessão da Enel, pela indicação dos diretores da agência, muito menos pela agência estadual, que faz a fiscalização. Além disso, a poda de árvores, apontada como parte do problema, não é atribuição federal, mas municipal
ALEXA SALOMÃO / Folhapress