SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em um fim de semana ensolarado, o parque Ibirapuera recebia a costumeira multidão de visitantes em busca de algumas horas de lazer e descanso. Entre eles, estava a empresária Rosângela Pereira, 33, que, fazendo uma pausa em seu treino matinal, teve os olhos atraídos por uma árvore bem próxima ao Planetário.
“Que beleza exuberante!”, disse ela, sem notar que, mesmo sem perder a altivez, a amoreira trazia camuflado em seu troco um inimigo silencioso que assola a cidade: a erva-de-passarinho. Aos poucos, caso não seja removida, essa planta parasita se nutre de seu hospedeiro, podendo até levá-lo à morte.
No parque Ibirapuera, um dos cartões-postais de São Paulo, estima-se que cerca de 100 das 16 mil árvores estejam afetadas por esse parasita. Esses números são apenas uma prévia do inventário arbóreo do parque, cuja conclusão está prevista para outubro deste ano.
“Parece que estão falando como se fosse uma espécie de Covid entre as árvores”, compartilha Samuel Lloyd, 41, diretor da Urbia, empresa concessionária responsável pela administração do parque. “No Ibirapuera, estamos lidando com um ambiente natural que favorece a propagação desse parasita, porém, temos a situação sob controle.”
Cerca de 60 especialistas em campo biólogos e agrônomos estão em ação, realizando podas estratégicas para conter a disseminação da erva-de-passarinho. O diretor, porém, faz uma ressalva importante: “Não adianta apenas nós fazermos o controle se a cidade não colaborar. Este é um trabalho coletivo”.
Os especialistas dizem acreditar que a disseminação desse parasita tenha ocorrido durante o processo de aceleração urbanística de São Paulo há pelo menos 60 anos.
Com características parasíticas e presença dominante em relação a outras espécies de plantas e árvores, a erva-de-passarinho se aloja no tronco, sugando todos os nutrientes vitais e a seiva da planta hospedeira. Essa ação, digamos, implacável, pode levar à morte do hospedeiro, que definha devido à escassez de nutrientes. Para evitar esse desfecho, é preciso que seja prontamente combatida.
Diante da limitação de diversidade natural plantada em ruas, avenidas e até mesmo em residências, bem como nos terrenos abandonados, a erva-daninha encontrou um ambiente fértil para proliferar.
Uma das regiões mais afetadas pela disseminação da erva-de-passarinho é o bairro de Higienópolis, na zona oeste da capital, conta a bióloga Juliana Summa, 48, coordenadora de gestão de parques e biodiversidade da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. A área, que é bastante arborizada, já foi alvo de ações do poder público para tentar frear a disseminação do parasita.
Não é de hoje que essa erva-daninha, também conhecida como passarinheira, visto ou esterco-de-jurema, vem escalando as árvores da capital paulista. No começo deste mês, o assunto veio à tona em uma reunião a respeito da concessão do parque Ibirapuera entre representantes do TCM (Tribunal de Contas do Município), da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente e da concessionária Urbia.
No Ibirapuera, o controle dessa planta é realizado estrategicamente nesta estação, a fim de evitar perturbações no período de acasalamento e criação de filhotes das aves. Estima-se que esse oásis verde no coração da maior cidade do país abrigue pelo menos 120 espécies de pássaros.
Durante os meses de setembro a abril, as atividades de combate ao parasita são suspensas. A equipe técnica de manejo do parque, composta de agrônomos e biólogos, evita a intervenção para não afetar o processo de reprodução dos pássaros.
“Aqui, damos prioridade à reprodução das aves, especialmente porque o parque serve de lugar de passagem e reprodução de espécies migratórias”, explica Lloyd. Essa abordagem tenta respeitar o ciclo natural de vida e reprodução das aves, contribuindo para preservar e promover a diversidade de espécies no ambiente do parque.
Os pássaros, sobretudo algumas espécies de pequeno porte, têm o hábito de utilizar os ramos robustos da erva-daninha como base para a construção de ninhos. No Ibirapuera, onde mais de 500 espécies de árvores podem ser encontradas, as plantas mais visadas pelo parasita são principalmente as amoreiras, as murtas, certos tipos de palmeira, os resedás e os ligustros.
“Realizamos podas manuais e raramente ocorrem casos de supressão”, explica o diretor da Urbia, acrescentando que “os frequentadores do parque possuem um vínculo afetivo com as árvores”. Ele explica que o trabalho é muito minucioso: “Até mesmo o destino dos resíduos resultantes da poda requer cuidado especial para evitar a disseminação do parasita”.
Toda a operação é realizada com base em laudos que são enviados à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, conforme informado pela Urbia. “O processo é monitorado e conduzido de acordo com os critérios estabelecidos pela concessão”, acrescenta Llyod. É importante ressaltar que as diretrizes de manejo estão previstas no plano diretor dos parques públicos paulistanos.
De acordo com a avaliação do diretor da Urbia, a questão do parasita requer o envolvimento de diversos atores, incluindo os setores público e privado, ONGs, população, universidades e centros de pesquisa. É necessário unir esforços em uma tentativa coletiva de controlar a disseminação da erva-daninha e impedir que ela se espalhe ainda mais pela cidade.
“Realizamos podas manuais e raramente ocorrem casos de supressão. Até mesmo o destino dos resíduos resultantes da poda requer cuidado especial para evitar a disseminação do parasita”, disse Samuel Lloyd, diretor da Urbia.
Segundo a bióloga Juliana Summa, não há dúvida de que a falta de diversidade natural desempenha um papel crucial na disseminação do parasita, o que evidencia a importância de preservar a biodiversidade nos parques, proporcionando um ambiente equilibrado e propício para a vida de plantas e animais.
Ela ressalta, todavia, que o controle não deve se limitar aos parques públicos. Também precisa ser estendido às áreas residenciais. “É essencial realizar medidas de controle tanto em áreas públicas quanto em residências e terrenos”, adverte Juliana.
Sabe-se que é impossível erradicar completamente a erva-de-passarinho, devido ao seu rápido crescimento e à dispersão feita pelos pássaros. No entanto, medidas de acompanhamento contínuo, podas e, em situações mais graves, a remoção da árvore são ações necessárias para evitar que ela se torne, de fato, uma praga descontrolada.
A Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, em conjunto com a qual Juliana Summa trabalha, vem realizando uma iniciativa para conscientizar os cidadãos de São Paulo sobre a presença da erva-de-passarinho. Essa ação inclui o compartilhamento de informações e de alertas sobre o parasita por meio das redes sociais.
Para acabar com a erva-daninha, porém, tudo indica que precisamos de muito mais.
ROBERTO DE OLIVEIRA / Folhapress