Esgoto não tratado no Amapá é desafio de nova sócia da Sabesp

RIO DE JANEIRO, RJ, E MACAPÁ, AP (FOLHAPRESS) – Entre montes de lixo misturado ao esgoto doméstico e aterro irregular, é possível encontrar até restos de sofás e baterias. Irá da Luz, 41, reclama do despejo dejetos e da falta de esgoto doméstico em Passarela Piauí, comunidade de palafitas no bairro Pacoval, zona norte de Macapá.

A cidade, que tem a terceira pior cobertura de serviços de água e esgoto entre as 27 capitais brasileiras, passou neste ano a ter seus serviços de água e esgoto operados pela Equatorial -empresa que se tornou neste mês sócia estratégica da Sabesp, a companhia de saneamento do estado de São Paulo.

A concessão no Amapá foi a primeira no setor de água e esgoto do grupo. Chamada de CSA (Companhia de Saneamento do Amapá), foi arrematada por R$ 930 milhões, com a meta de universalizar o fornecimento de água e esgoto nas áreas urbanas dos 16 municípios do estado -áreas rurais permanecem sob responsabilidade da estatal Caesa.

É uma experiência diferente da que a Equatorial terá em São Paulo, estado com a melhor cobertura de serviços de saneamento do país, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

No Amapá, quando a concessão foi transferida, apenas 38% da população tinha acesso a água, ainda assim de baixa qualidade, e a rede de esgoto chegava a 15% das residências, mas sem tratamento adequado antes do despejo nos rios que cortam a cidade.

Nesses dois primeiros anos, a empresa diz ter priorizado obras de revitalização de instalações de tratamento de água e esgoto deterioradas e a expansão da rede de abastecimento de água, com investimentos acumulados de R$ 150 milhões.

Ainda não há dados do Snis para comprovar o avanço -a edição com dados de 2023 está em fase de coleta- mas a Equatorial afirma que ampliou o acesso à rede de água para perto de 60% e que o tratamento de esgoto, antes quase inexistente, hoje atende cerca de 12% da população.

Três municípios do interior já estariam com o atendimento de água universalizado: Amapá, Calçoene e Pracuúba, ainda segundo a companhia.

A água chegou para a aposentada Andreza da Silva, 72, que mora há três décadas no bairro do Muca. Nos primeiros anos, ela ela precisava “pelejar” para captar água. “Tinha que pedir para quem tinha poço em casa. Depois disso chegou a água tratada aqui no lago, mas ainda era suja e tinha muita interrupção. De uns dois anos para cá que o serviço melhorou e nunca mais faltou água na torneira.”

Já quanto ao tratamento do esgoto doméstico, que é inexistente na comunidade, ela diz que “é cada um por si”. “Cada morador tem seu banheiro, sanitário e pia, mas todo o despejo vai para água. Onde é aterrado tem gente que faz fossa mesmo.”

Com o aumento da rede, a concessionária quase dobrou o número de clientes, que hoje passa de 90 mil, e ampliou sua receita de R$ 92 milhões para R$ 150 milhões em 2023, seu primeiro ano completo de operação.

A melhora no resultado também tem efeito de aumento de tarifa. Logo após a concessão, as tarifas foram elevadas em 50%, uma alta prevista no edital sob o argumento de que a universalização demandaria elevados investimentos.

“A privatização requer, primeiro, que o empresário não perca”, diz o diretor do Sindicato dos Urbanitários do Amapá, Francinaldo Flexa, que reclama de constantes interrupções no abastecimento e da qualidade da água fornecida pela companhia.

Mas o prejuízo da concessionária também subiu, de R$ 146 milhões para R$ 234 milhões, nos dois primeiros anos de operação. A companhia diz no relatório que “os resultados apurados foram melhores do que o esperado, frente ao desafio para construção e entrada em operação da empresa”.

Neste início de gestão, continua, decidiu priorizar investimentos com impacto em geração de receita, aumento da arrecadação e combate às perdas para melhorar o fluxo de caixa, saneamento do cadastro de clientes e fortalecimento de ações de cobrança e combate a fraudes.

Estratégia diferente do que deve adotar em São Paulo, segundo fontes próximas. Com elevado nível de cobertura da rede de água, o desafio principal é chegar com esgoto a comunidades e despoluir o rio Tietê, projeto no qual a Sabesp espera gastar R$ 5,6 bilhões.

A nova sócia espera que, livre das amarras da lei de licitações, a maior empresa de saneamento do Brasil tenha mais agilidade para contratar obras. Sem controle estatal, ganha maior liberdade também para demitir e contratar, como se viu no caso da privatização da Eletrobras.

Entre os planos apresentados a investidores para a concessão paulista estão programas de demissão voluntária, reestruturação de times e estabelecimento de uma cultura voltada a resultados. A empresa quer ainda em otimizar benefícios e políticas de remuneração.

Fundada há 20 anos, a Equatorial tem atuação majoritária no segmento de distribuição de energia, mas atua também em transmissão, comercialização, energias renováveis e telecomunicações.

RAIO-X DA EQUATORIAL

Fundação: 2004

Lucro líquido no 1º trimestre de 2024: R$ 384 milhões

Valor de mercado: R$ 38 bilhões

Funcionários: 11.124

Municípios atendidos: 1.046

População atendida: 14,1 milhões

Composição acionária: Opportunity (6,3%), Atmos (5,5%), Capital World Investors (5,2%), Squadra Investimentos (5,0%), Canada Pension Plan (5,0%) e BlackRock (5,0%); Outros (67,9%); Tesouraria (0,1%)

NICOLA PAMPLONA E CAIO COUTINHO / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS