Espécies da Terra diminuíram de tamanho e humanos podem ser responsáveis

Foto: Jornal da USP

É como se grande parte dos animais e plantas da Terra tivesse sido atingida por um raio miniaturizador: dos anos 1960 para cá, milhares de espécies diminuíram de tamanho, indica um estudo feito por uma equipe internacional de pesquisadores. O efeito não é universal, mas há boas razões para acreditar que está ligado a diferentes impactos da ação humana, com consequências difíceis de prever sobre o funcionamento dos ecossistemas do planeta.

Detalhes da descoberta estão descritos num artigo da última edição do periódico especializado Science, um dos mais importantes do mundo. O estudo, que tem como primeira autora a cientista portuguesa Inês Martins, da Universidade de St. Andrews (Escócia), trabalhou com informações coletadas a respeito de 4.292 espécies, pertencentes a seis grupos diferentes de seres vivos: peixes, vegetais, invertebrados, mamíferos, herpetofauna (répteis e anfíbios) e organismos marinhos bentônicos (os que vivem no substrato do oceano, como corais, estrelas-do-mar etc.), com distribuição em diferentes regiões do globo.

Os mais bem representados da lista são os peixes, com quase 2.000 espécies monitoradas. Os períodos estudados também variam, com levantamentos que abrangem de 5 a quase 60 anos. Além de analisar o que aconteceu com o tamanho médio dos indivíduos de cada espécie, Martins e seus colegas também ficaram atentos aos efeitos sobre conjuntos de espécies que vivem no mesmo habitat.

“Podemos olhar para o efeito da substituição de espécies presentes e as alterações no tamanho médio do conjunto de espécies porque algumas desapareceram ou apareceram ao longo do tempo”, explicou a pesquisadora portuguesa à reportagem.

Esse aspecto é importante por causa da trama de interações entre as diferentes espécies. Em muitas áreas remanescentes da mata atlântica, por exemplo, praticamente não há mais onças-pintadas, o maior carnívoro brasileiro. Sem ter de competir com o grande felino, predadores de porte médio podem muito bem se multiplicar e até ficar maiores com a abundância de recursos.

Esse seria um efeito indireto da ação humana sobre o tamanho de determinadas espécies. Há também efeitos mais diretos. No caso da caça e da pesca, por exemplo, sabemos que é comum a captura dos indivíduos de maior porte, já que esses podem servir de fonte mais abundante de carne ou outros recursos (como o marfim dos elefantes).

Intervenções humanas como essa tendem a fazer com que o tamanho médio da espécie caçada ou pescada diminua com o tempo. E isso não só porque os indivíduos com tendência natural a crescer menos ganham uma chance maior de ter filhotes (os quais, por sua vez, também tenderão a ter porte mais modesto). Há também o fato de que a pressão da captura acaba favorecendo os indivíduos que conseguirem se reproduzir mais cedo, gastando menos tempo para crescer antes de chegar à maturidade reprodutiva, o que também diminui o tamanho médio da população.

Esses e outros fatores, como o impacto das mudanças climáticas, provavelmente ajudam a explicar os resultados do levantamento feito para o estudo na Science. Dois terços dos conjuntos de espécies analisados revelaram uma diminuição do tamanho médio dos indivíduos. Em quase 60% dos casos, também há uma diminuição geral do tamanho dentro de cada espécie.

Mas também são comuns as situações nas quais a “miniaturização” se explica pela mudança de composição dos grupos de espécies –ou seja, sumiram as espécies de maior porte e ficaram as mais modestas, o que produz um tamanho médio menor para todos. Seria o caso de florestas que perdem suas onças-pintadas e ficam só com jaguatiricas e gatos-do-mato, por exemplo.

A situação dos peixes é a mais clara de todos os grupos, enquanto há mais variabilidade dos efeitos (diminuição de tamanho, aumento ou estabilidade) nos outros grupos de organismo.

“Devido a outros trabalhos, a gente sabe que as forças de seleção que atuam no tamanho do corpo dos organismos variam no espaço e no tempo”, explica a pesquisadora portuguesa. “No caso dos peixes marinhos, essas mudanças estão frequentemente ligadas à exploração seletiva de indivíduos de grande porte pelos seres humanos, ao aquecimento e/ou à diminuição da disponibilidade de recursos. Ainda estamos pesquisando os fatores que impulsionam a mudança, mas é provável que uma combinação desses fatores resulte na alta variabilidade nas tendências de mudança e na prevalência de diminuições de tamanho que observamos em nosso estudo.”

REINALDO JOSÉ LOPES / Folhapress

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