Esther Dweck ganha confiança de Lula com perfil discreto e sem pretensões políticas

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A ministra Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos) ganhou a confiança do presidente Lula (PT) e trânsito no governo federal, com um perfil discreto e sem pretensões políticas.

Em um exemplo recente dessa confiança, ela foi escolhida pelo presidente no calor da crise envolvendo o ex-ministro Silvio Almeida, demitido por acusações de assédio sexual, para chefiar interinamente o Ministério dos Direitos Humanos.

A ministra também já havia ganhado o reconhecimento de Lula pela execução do CNU (Concurso Nacional Unificado), o chamado Enem dos Concursos, e pelas negociações com os servidores por reajuste salarial. Nesse último caso, porém, acabou se tornando alvo de críticas no funcionalismo e mesmo dentro do PT.

Dweck chegou da Universidade Federal do Rio de Janeiro a Brasília, inicialmente no governo de Dilma Rousseff (PT), para trabalhar no Planejamento com a então chefe da pasta Miriam Belchior. Depois, foi indicada para ser secretária de Orçamento Federal no final da gestão Dilma.

No governo de transição, integrou os principais debates para o planejamento do governo Lula e acabou ficando com um dos três ministérios do núcleo duro da política econômica. Já ministra da Gestão, foi nomeada interinamente como chefe dos Direitos Humanos na noite do dia 6 de setembro, poucas horas após a ruidosa demissão de Silvio Almeida. Uma das vítimas seria a também ministra Anielle Franco (Igualdade Racial), de quem Dweck é amiga.

A ministra da Gestão já estava a par do funcionamento dos Direitos Humanos, porque geria os contratos da pasta -que haviam sido objeto de disputa com Mulheres e Igualdade Racial, após a divisão em três do ministério do governo passado.

Seu nome surgiu na conversa de ministros na antessala de Lula, como sugestão de Vinícius Carvalho (CGU). O presidente de pronto topou. A interinidade de Dweck foi breve, uma vez que a sucessora, Macaé Evaristo, foi indicada no dia 9, mas ilustra que a ministra ganhou peso no Planalto.

Em outro episódio, em maio, ganhou queda de braço contra ministros palacianos que foram contra o adiamento do CNU em meio às enchentes no Rio Grande do Sul.

O governo, inicialmente, foi contra a posição dos técnicos da Gestão e decidiu manter a prova. O argumento do Planalto era de que haveria um desgaste muito forte com o adiamento.

A ministra então recorreu ao próprio presidente. Argumentou que a manutenção da prova abria a possibilidade de uma avalanche de ações judiciais. E acrescentou que poderia colocar no governo a imagem de insensibilidade, por ter deixado os candidatos gaúchos em segundo plano.

Lula então respaldou a posição de sua ministra. Ela ainda sentiu sua posição reforçada com um telefonema de Cármen Lúcia. A ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) dizia ligar como uma “professora de direito” e não membro da Corte, para afirmar que a decisão estava “respaldada pelo direito”.

Quando o exame aconteceu, em um domingo de agosto, o presidente Lula esteve com a sua ministra na sala de situação criada para monitorar a sua execução, em Brasília.

O caráter técnico, longe de uma carreira eleitoral, permite que a economista fique longe dos embates públicos, mesmo participando de discussões centrais, como o Orçamento. A Folha falou com oito integrantes do governo, de primeiro e segundo escalão, além de assessores.

Segundo relatos, as discordâncias de Dweck com colegas de Esplanada se dão em dois setores: em discussões de Orçamento, com Fazenda e Planejamento, e nos debates com servidores públicos.

Quanto às questões macroeconômicas, integrantes do governo apontam que seu perfil desenvolvimentista leva a discordâncias com outras áreas do governo, embora nenhuma delas tenha escalado para desavenças mais pessoais. No Planalto, é classificada como desenvolvimentista, mas não irresponsável.

Inicialmente, a ministra atuou em defesa da proposta do novo arcabouço fiscal, num trabalho de convencimento de parlamentares do próprio PT. Considerava um grande avanço em relação ao teto de gastos, do governo Michel Temer. Depois passou a considerar a proposta aprovada no Congresso Nacional, com mudanças em relação ao texto original, muito dura.

Também é apontado que inicialmente ela defendeu uma mudança na meta fiscal no ano passado.

Uma vez que sua posição foi derrotada internamente, não levou o tema a público e, segundo um integrante da Fazenda, ajudou a convencer petistas da importância de se respeitar o arcabouço.

Quanto às negociações de reajuste salarial de servidores, a ministra tem sido alvo de fogo amigo. Os próprios deputados e senadores das bancadas aliadas de esquerda, como PT e PSOL, ligam diretamente para ela para pressionar em defesa das categorias.

Na última reunião ministerial, no mês passado, ela fez uma dura fala sobre o assunto. Mencionou as greves de servidores e pediu que ministros não ficassem encabeçando reivindicações de carreiras, porque isso enfraquecia a posição do governo. Pediu que não fossem “ministros sindicalistas”, de acordo com relatos.

A ministra teve o respaldo do Planalto, que se incomodou com a postura de alguns ministros. Um auxiliar de Lula disse que ministro não pode ser presidente de sindicato.

Muitos ministros interpelaram Dweck e negociaram por seus servidores. Jorge Messias (AGU), por exemplo, falou num evento interno do ministério no ano passado que eles não se preocupassem com questões remuneratórias, que teriam uma boa surpresa.

Os professores de universidades neste ano chegaram a ficar dois meses de greve, assim como outros órgãos, como o Ibama.

O governo concluiu negociação com 98% do funcionalismo público. Apesar do reajuste para as categorias acima da inflação, depois de anos de congelamento no governo Bolsonaro, ainda houve um clima de insatisfação.

Rudinei Marques, presidente do Fonacate (Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado), chamou o processo de caótico. “Foi assim, do ponto de vista da negociação, sem calendário, sem gente, sem um planejamento consistente, foi um desastre”, disse, queixando-se das mesas específicas de negociação.

“Todo mundo ficou com os salários congelados [nos anos Bolsonaro] e agora você vai ter o dobro da inflação. Só que vai sair todo mundo revoltado. Então alguma coisa muito grave aconteceu na condução desse processo”, diz.

MARIANNA HOLANDA E RENATO MACHADO / Folhapress

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