Ex-diretora da Americanas alvo de mandado de prisão saiu do Brasil no dia 15

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Procurada pela Polícia Federal após ter mandado de prisão expedido contra ela, a ex-diretora da Americanas S.A. Anna Christina Ramos Saicali saiu do Brasil no dia 15 deste mês, segundo apuração da Folha. A executiva é um dos alvos da operação batizada de “Disclosure”, deflagrada pela PF nesta quinta-feira (27), ou seja, 12 dias após ela deixar o país.

Procurada, a assessoria de Saicali não se manifestou até a publicação da reportagem.

Além da executiva, o ex-diretor presidente da Americanas Miguel Gutierrez, que tem cidadania espanhola e brasileira, também foi alvo de mandado de prisão preventiva. Ambos saíram do Brasil em meio às investigações sobre a fraude que resultou em um rombo contábil de R$ 25,2 bilhões nos balanços financeiros da varejista.

Os nomes dos dois foram incluídos na difusão vermelha da Interpol, sistema utilizado para que a ordem de prisão de pessoas que se encontram no exterior seja publicizada e para que os países que integram a Interpol possam cumprir o mandado em caso de deslocamento dos alvos.

Segundo relatório com o parecer do MPF (Ministério Público Federal), a ex-diretora é uma das principais responsáveis pelos números falsos da Americanas, tendo “pleno conhecimento” e “ciência inequívoca da construção de resultados fraudulentos” da companhia.

Saicali foi diretora-presidente da B2W, braço digital da varejista, que surgiu a partir da fusão entre a Americanas.com e a Submarino, de 2013 a 2018, além de ter ocupado cadeira no conselho de administração dessa mesma empresa, de 2018 a 2021.

No momento em que as suspeitas de fraude foram reveladas pela primeira vez, em janeiro do ano passado, ela ocupava o cargo de CEO da AME (plataforma de inovação e fintech da Americanas), posição na qual atuou de junho de 2021 a fevereiro de 2023.

Com base em e-mails a que o MPF teve acesso, o relatório expõe que Saicali recebeu junto de outros diretores, em abril de 2022, e-mail com o título “Consumo de Caixa Real”, no qual estavam expostas referências expressas à situação de caixa da empresa e à existência de uma dívida em risco sacado no valor de R$ 16,236 bilhões.

Essa situação real da empresa e o tamanho da dívida com risco sacado, porém, não apareceram no balanço divulgado ao mercado financeiro, segundo o MPF.

“O valor de dezesseis bilhões em dívida de risco sacado era aproximadamente 50% superior ao valor total do endividamento e dezesseis vezes superior ao endividamento de curto prazo anunciado pelos investigados ao mercado”, diz o relatório.

Risco sacado é um tipo de operação corriqueira no mundo do varejo, na qual a empresa consegue antecipar o pagamento a fornecedores por meio de empréstimo junto aos bancos. A instituição financeira, portanto, adianta o pagamento direto para o fornecedor e quem paga o banco é a varejista.

O juro do empréstimo pode ser cobrado tanto do fornecedor como da varejista, dependendo de como a operação é estruturada.

Mas, no caso da Americanas, o risco sacado era usado para maquiar a real situação da empresa para o mercado. Segundo o Ministério Público, Saicali e outros ex-diretores da Americanas assinaram como emitentes, em 2017, carta de representação com informações “sabidamente falsas” sobre o risco sacado.

“As provas deixam claro que Anna Saicali possuía uma forte ascendência de comando nas fraudes praticadas. Era a principal responsável por comandar as fraudes na empresa B2W (sendo comunicadas pelos escalões inferiores dos diversos crimes praticados), enquanto chefiou a referida empresa, porém sempre cientificando Miguel Gutierrez sobre o esquema criminoso”, diz o MPF.

Além do risco sacado, também foram fraudados por diretores da Americanas contratos de concessão de créditos por parte dos fornecedores em troca de publicidade e outros interesses comerciais e operações com cartão de crédito, com a finalidade de inflar os números da varejista, segundo o MPF.

A “bola de neve” nas fraudes teve duração de ao menos 15 anos, segundo delação premiada feita no âmbito das investigações. Quando foi anunciada a troca de presidente da companhia, em 2022, “surgiu a grande preocupação de como lidar com a fraude bilionária que vinha sendo praticada há muitos anos”, segundo relatório do MPF.

Nesse contexto de transição de diretoria, Saicali vendeu, a partir de julho de 2022, R$ 57.836.192,00 em ações da Americanas, movimentação essa vista como atípica pelo MPF. O auge das vendas ocorreu em setembro de 2022 (R$ 40.691.375,00). Para comparação, até julho daquele ano, ela tinha vendido apenas R$ 1.777.798,47 em ações.

Ela foi a segunda investigada que mais vendeu ações da Americanas nesse período, atrás apenas do ex-CEO Miguel Gutierrez, que levantou R$ 158.552.404,40 com a venda das ações.

Além dos dois, foram alvos de mandados de busca e apreensão na operação deflagrada nesta quinta-feira os ex-diretores Carlos Eduardo Padilha, Fabien Picavet, Fabio Abrate, Jean Pierre Ferreira, João Guerra Duarte Neto, José Timotheo de Barros, Luiz Augusto Henriques, Marcio Cruz Meirelles, Maria Christina Do Nascimento, Murilo dos Santos Correa e Raoni Lapagesse Franco.

Muitos deles também venderam um alto volume de ações a partir de julho de 2022.

São investigados os crimes de manipulação de mercado, uso de informação privilegiada e associação criminosa. Em caso de condenação, as penas chegam a até 26 anos de reclusão. As medidas da operação policial foram autorizadas pela 10ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.

STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress

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