MANAUS, AM (FOLHAPRESS) – Integrantes do Exército brasileiro consideram improvável uma invasão da Guiana pela Venezuela, o que demandaria uma incursão de militares do regime do ditador Nicolás Maduro pelo Brasil.
A via terrestre, no caso de uma ocupação venezuelana em larga escala, passaria obrigatoriamente pelo território brasileiro, em especial três cidades de Roraima estratégicas para a vigilância militar de áreas de fronteira: Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, e Bonfim e Normandia, na região da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, na fronteira com a Guiana.
As Forças Armadas promoveram nesta semana um reforço de militares em Pacaraima. Segundo integrantes do Exército ouvidos pela reportagem na condição de anonimato, o reforço tem o objetivo de equipar o que seria um combate por terra, em caso de uma invasão. A ação militar seria uma “fase zero”, de “dissuasão”, diante da ofensiva verbal de Maduro.
O Ministério da Defesa confirmou a maior presença militar na região em razão da crise entre Venezuela e Guiana. Conforme as pessoas ouvidas pela reportagem, houve deslocamento de cerca de 200 militares e de blindados sobre rodas para o pelotão de fronteira em Pacaraima. Houve também transporte de munição, por via área, com foco no que seria um combate por terra.
Apesar da ação, o entendimento hoje no Exército é de que a atitude de Maduro em relação a uma anexação de parte da Guiana -a região de Essequibo, equivalente a quase 70% do território guianês- se trata de uma bravata política, de olho nas eleições presidenciais de 2024.
Integrantes do Exército dizem que a invasão de um país amigo seria um erro impensável por parte de Maduro, levando em conta as boas relações de Brasil e Venezuela após a eleição do presidente Lula (PT).
A fronteira de Venezuela e Guiana tem poucos moradores e é marcada por área de floresta densa, o que torna quase impossível um deslocamento de tropas numerosas de um país a outro, na visão do Exército brasileiro. Por isso, uma ação teria de ocorrer pelo território brasileiro.
Isso significaria um deslocamento de tropas venezuelanas a partir de Pacaraima, a cidade que é há anos a porta de entrada para refugiados venezuelanos, via BR-174.
Para alcançarem a Guiana, esses militares deveriam se deslocar até Bonfim e Normandia, cidades que ficam na região da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Lethem é a cidade mais próxima na Guiana.
Análises feitas no Exército brasileiro apontam um problema de efetivo por parte do Exército venezuelano, com condições de trabalho ruins entre as patentes de base. Essas mesmas avaliações consideram que Exército e Aeronáutica têm, porém, bons equipamentos militares.
O mesmo não ocorre com a Marinha, considerada a Força mais sucateada na Venezuela. Por isso, uma ocupação por mar é considerada mais improvável do ponto de vista militar. Além disso, o litoral da Guiana é considerado de difícil acesso.
No próximo domingo (3), o regime de Maduro fará um plebiscito sobre a anexação de Essequibo, uma disputa que remonta ao período da colonização na América Latina. A costa da Guiana é rica em petróleo, com exploração intensa a partir de 2019. A prospecção coube à empresa norte-americana ExxonMobil.
Nesta sexta (1º), juízes da Corte Internacional de Justiça, em Haia, na Holanda, decidiram que a Venezuela deve se abster de qualquer ação que altere a situação da região de Essequibo.
O tribunal não recomendou a suspensão da consulta popular, como desejava a Guiana. Segundo a decisão, porém, não deve ocorrer nenhuma alteração em relação ao território em disputa.
Na visão do Itamaraty, a realização do plebiscito é um assunto interno da Venezuela. O Ministério das Relações Exteriores do Brasil disse acompanhar com preocupação a crise entre Venezuela e Guiana.
“Qualquer país tem condições de realizar um referendo, cumpridas as suas normas internas. A gente não opina”, afirmou na última quinta (30) a secretária de América Latina e Caribe do ministério, Gisela Maria Figueiredo Padovan.
“No entanto, a gente sabe que o resultado provavelmente será favorável, porque esse é um tema que une sabidamente governo e oposição [venezuelanas], talvez o único tema em que os dois lados estão de acordo. Então acho que não há nenhuma surpresa se as pessoas responderem sim às perguntas”, disse a diplomata.
VINICIUS SASSINE / Folhapress