SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A inclusão de baterias de armazenamento de energia no leilão de reserva de capacidade programado para agosto tem gerado ruídos no setor entre grupos que defendem que a nova tecnologia esteja no certame e instituições que apontam falta de regulamentação e problemas operacionais.
Há queixas de que o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, foi categórico ao confirmar em março que o leilão incluiria essa nova tecnologia, sem que haja certezas, inclusive dentro do ministério, de que haja viabilidade para isso.
Já usadas em países desenvolvidos, as baterias armazenam energia elétrica e servem como auxílio à rede. Quando acopladas a usinas solar e eólica, por exemplo, elas estocam a energia produzida em momentos em que a demanda é inferior à produção e a liberam quando acontece o inverso.
Nesta quinta-feira (18), associações que reúnem geradores de energia solar e eólica divulgaram uma nota defendendo a inclusão de baterias no leilão.
Fabricantes estavam empolgados com a medida, mas na consulta pública que antecede o edital do leilão algumas instituições se posicionaram contrárias à inclusão, apontando falta de regulamentação e problemas operacionais do sistema de armazenamento de energia de bateria (BESS, na sigla em inglês).
Uma delas é a Anace, a Associação Nacional dos Consumidores de Energia, que ao citar a falta de regulamentação dessa tecnologia disse se preocupar com “as afirmações recentes de líderes governamentais sobre a inclusão dessa solução nesse leilão”, em referência a Silveira. A Anace retirou a manifestação do sistema após ser questionada pela Folha.
A portaria que convida entidades e empresas a participarem da consulta pública cita apenas a inclusão de termelétricas e hidrelétricas no leilão. Inicialmente, o processo ia até o final de março, mas seu término foi adiado para a semana que vem após uma reunião de produtores de bateria com Silveira em março e a posterior frase do ministro sobre o tema.
Em evento nos EUA, no final de março, Silveira disse que o governo contemplaria as baterias “para poder ajudar e impulsionar o investimento nas baterias que possam cada vez mais se modernizar e fazer com que as energias intermitentes se tornem energias estáveis”.
Mas nem os próprios técnicos do ministério corroboram o anúncio de Silveira. A nota técnica do MME que embasa a consulta pública, feita antes dessa discussão, diz que os sistemas de armazenamento em baterias não seriam incluídos no leilão por falta de regulamentação.
A nota também afirma que “as baterias apresentam ciclo de operação limitado em algumas horas, precisando ser recarregadas e, portanto, impossibilitando, por vezes, seu acionamento em períodos em que o recurso precisa estar disponível para atender as necessidades de potência do sistema”.
Os produtores de bateria contestam as críticas e defendem que a tecnologia supre exatamente a demanda do MME. Leilões de reserva visam garantir que haja geração suficiente de energia durante picos de consumo, além de atender a uma demanda futura.
“Antigamente a reserva de capacidade era realmente para momentos quando faltava energia, mas esses momentos são cada vez menos frequentes. Hoje temos mais momentos de desequilíbrio entre a oferta e a demanda e [problemas com] otimização e flexibilidade. E nós somos uma ferramenta de flexibilidade”, diz Markus Vlasits, presidente da Absae (Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia).
Para contornar a falta de regulamentação do uso de baterias no SIN (Sistema Interligado Nacional), a Absae defende que, no leilão de agosto, as baterias sejam ofertadas dentro de parques eólicos e solares. Assim, quem participaria do certame seriam os donos das usinas de geração de energia e não os donos de baterias nesse formato, então, as baterias seriam apenas coadjuvantes.
“Se você permite a participação de eólicas ou solares com bateria, você contrata mais uma usina. E, para a contratação de uma usina, não existe incerteza regulatória”, diz Vlasits.
A Folha de S.Paulo apurou que a Casa dos Ventos, uma das maiores geradoras de energia eólica do país, e a EDP, importante grupo de energia, estariam interessadas nesse formato.
Além de acopladas às usinas, as baterias também poderiam estar ligadas à rede de transmissão de energia, como já ocorre hoje em Registro (SP), onde a ISA CTEEP, uma das maiores empresas de transmissão de energia elétrica do país, opera desde o ano passado baterias com capacidade de entregar até 60 MWh durante duas horas. O exemplo de Registro, porém, foi feito em parceria com a Aneel, e esse modelo ainda carece de regulamentação.
Na consulta pública, a associação que representa as empresas de transmissão de energia defendeu o uso de baterias, mas pediu para que haja um leilão específico para elas descartando o de agosto.
A Coalizão Energia Limpa e o Instituto E+ também se posicionaram contrários à inclusão de baterias neste leilão.
Pessoas a par das discussões levantam ainda a possibilidade de as baterias serem incluídas no edital em condições financeiras impossíveis de serem viabilizadas.
PEDRO LOVISI / Folhapress