RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Em secretarias estaduais de Saúde, Gestão e Educação, lideranças são escolhidas em processos seletivos pouco transparentes, com falta de capacitação e sem ter o desempenho avaliado enquanto ocupam os cargos.
Entre as pastas, 77% têm maior carência de métodos para gestão de pessoas em cargos de chefia, sobretudo pela influência da política na escolha dos dirigentes.
Os resultados são do Mapa de Gestão de Lideranças, estudo do Insper e da parceria Vamos, voltada a desenvolver líderes no setor público.
Estados também pecam pela falta de diversidade entre chefias, de acordo com a pesquisa. Pessoas negras são apenas 12% do segundo escalão em pastas de Gestão, 17% em Saúde e 20% em Educação. Nessas mesmas secretarias, mulheres compõem 38%, 45% e 65% dos dirigentes, respectivamente.
Minas Gerais é o único estado a alcançar um nível avançado na gestão de lideranças, com destaque para programas como o Transforma Minas, que oferece processos seletivos para cargos de alto escalão. São Paulo e Rio Grande do Sul vem em seguida, no nível intermediário.
No Brasil, aspectos políticos se sobressaem aos técnicos na escolha de líderes, segundo especialistas. Chefias são selecionadas principalmente para formar governos de coalizão, e não por ter experiência na área, o que interfere na gestão de pessoas.
“Governos devem responder ao que os cidadãos manifestaram nas urnas, mas isso não quer dizer que não é necessário trazer critérios, desenvolvimento de competências e líderes com perfil mais adequado”, afirma Daniel de Bonis, diretor de Conhecimento, Dados e Pesquisa da Fundação Lemann que, junto ao Instituto República.org e o Instituto humanize, compõem a parceria Vamos.
Ele diz que essas três secretarias foram selecionadas porque, no caso de Saúde e Educação, há um amplo número de servidores, além de alto impacto orçamentário. No caso das pastas de gestão, por estar voltada ao planejamento de políticas dos estados.
Os resultados negativos observados devem se refletir nas demais áreas da gestão do estado, de acordo com especialistas.
Segundo de Bonis, o modelo ideal de gestão de lideranças é o Sistema de Alta Direção Pública, que estabelece padrões para a nomeação de chefias no setor, mas sem abdicar da autonomia política dos dirigentes eleitos. Essa escolha deve abarcar apenas o segundo escalão, e não secretários estaduais ou ministros, que são cargos políticos.
O sistema inclui, por exemplo, táticas para atrair candidatos, avaliação de desempenho para líderes e estratégias para sucessão quando o mandato de um gestor se encerrar. O modelo é adotado em outros países, incluindo Chile e Estados Unidos.
Os pesquisadores se basearam no Sistema de Alta Direção Pública para construir o referencial usado no mapa, com o objetivo de avaliar o quão próximas as secretarias estaduais estão desse modelo.
O estudo avaliou cinco itens relacionados à gestão de lideranças: pré-seleção, gestão do desempenho, desenvolvimento, diversidade e atuação sistêmica do órgão central, exclusiva em pastas de administração e planejamento que visa avaliar normas relacionadas à gestão de pessoas.
A falta de políticas eficazes na pré-seleção vai afetar todo o ciclo de gestão de pessoas, segundo especialistas. Se não há critérios para selecionar líderes, não haverá medidas para melhorar o desempenho ou o desenvolvimento dessas chefias, que ocupam o cargo apenas por fatores políticos.
O desenvolvimento também é um desafio para o setor, sobretudo pela ausência de estrutura nas escolas de governo, segundo Gustavo Tavares, professor de gestão de lideranças no Insper e um dos autores do estudo.
Ele diz que as práticas dessa área são mais fáceis de implementar, já que não encontram tanta resistência na gestão se comparado aos processos seletivos para cargos de chefia ou à avaliação de desempenho. No entanto, nem todos os estados têm estrutura ou recursos para financiar esse pilar.
“É um tema que ninguém é contra, mas a barreira é da capacidade dos órgãos de oferecerem os treinamentos. Escolas de governo têm um papel importante para assumir esse protagonismo na gestão.”
Além disso, estados investem pouco na capacitação de lideranças por se tratar de um investimento de longo prazo, cujos resultados não devem aparecer logo no mandato atual, segundo Fernando Coelho, professor de administração pública da USP. Isso vai de encontro à lógica dos governos, que buscam resultados rápidos para angariar eleitores.
“As pessoas escolhidas têm foco nas entregas no período do mandato, além de uma crença de que elas já estão prontas e não requerem desenvolvimento”, afirma.
Segundo ele, saúde e educação são mais meritocráticas por serem tradicionalmente mais técnicas, além de contarem com um amplo contingente de servidores. Já as de gestão costumam ser mais burocráticas, responsáveis, por exemplo, por folhas de pagamento e, por isso, são mais associadas à indicação política.
A escolha por fatores políticos interfere ainda nos resultados de diversidade. De acordo com Daniel de Bonis, da Fundação Lemann, dirigentes indicam pessoas de seu convívio, o que acaba levando à gestão pública profissionais com um mesmo perfil.
“Se for mantido o sistema baseado apenas em questões de confiança pessoal, só as mesmas redes de contato existentes vão ser acionadas. É criado um muro em torno de pessoas que podem ter qualificações e competências, mas não pertencem a essas redes de relacionamento.”
LUANY GALDEANO / Folhapress