Falta de perspectiva na carreira é principal reclamação entre estagiários

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Falta de perspectiva de crescimento, remuneração insuficiente e carga excessiva de tarefas são as principais dificuldades enfrentadas por estagiários brasileiros, segundo o Censo do Estagiário 2023, feito pela WallJobs, plataforma de gestão de estágio.

A pesquisa é feita para entender as perspectivas de estudantes matriculados em uma instituição de ensino em busca de oportunidades no mercado de trabalho.

O estágio é regulado pela lei nº 11.788 de 2008. Especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo explicam como funciona a legislação e quais são os direitos dessa categoria que, muitas vezes, “leva a culpa”.

O levantamento aponta para as principais dificuldades enfrentadas por estagiários em seu relacionamento com a empresa contratante.

Do total de estudantes do país, 37,5% estagiam no momento. Segundo a pesquisa, 7,8% deles afirmam que a maior dificuldade em seu atual estágio está a falta de perspectiva ou possibilidade de efetivação.

Para 7,2%, a remuneração ou os benefícios insuficientes são os fatores que mais dificultam a estabilidade. Já para 6,2%, a sobrecarga de trabalho e responsabilidade são as principais dificuldades enfrentadas.

No que diz respeito à contratação, 32% dos estudantes entrevistados afirmam que conseguiram uma vaga de estágio em cerca de um mês de procura. Por outro lado, 26% dizem que a busca por vagas supera seis meses.

Alexandre Sande, CEO do WallJobs, afirma que isso indica uma alta competitividade nos processos seletivos, agravado pela ausência de feedback após as entrevistas.

“O retorno é fundamental para desenvolvimento de futuros profissionais, proporciona oportunidade de aprendizado e que os candidatos possam entender melhor habilidades e pontos a serem melhorados para futuras oportunidades.”

Mesmo após a contratação, 77,5% relatam dificuldades com a documentação, afirmando a necessidade de processos mais eficientes entre envolvidos —universidade, empresa ou gestora.

Apesar do cenário, a pesquisa indica que 28% dos estagiários estão satisfeitos e querem permanecer em suas empresas atuais, enquanto 9% consideram sair porque não gostam da posição atual ou não se identificam com a empresa.

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QUAL A DIFERENÇA ENTRE ESTÁGIO, JOVEM APRENDIZ E REGIME CLT?

O estágio é uma modalidade criada e regulamentada pela Lei do Estágio, de 2008, e visa que estudantes possam desenvolver as habilidades aprendidas em sala de aula no contexto profissional.

Larissa Maschio Escuder, advogada trabalhista do escritório Jorge Advogados, afirma que as principais diferenças entre jovens aprendizes e estagiários estão na natureza do vínculo com a empresa.

“O estagiário não possui vínculo de emprego, sendo o único requisito a matrícula em instituição de ensino. É uma experiência educacional supervisionada, visando aplicar e aprimorar conhecimentos acadêmicos em um ambiente de trabalho real.”

Segundo Escuder, o jovem aprendiz difere por ser um programa de formação profissional voltado a jovens entre 14 e 24 anos. O contrato de trabalho é formal e com vínculo empregatício e regido pela CLT (Consolidação das Leis de Trabalho).

Já a diferença entre o estágio e o regime CLT segue na mesma linha de formalização, mas não se trata de formação profissional.

Rodrigo Mattos, advogado trabalhista do Almeida Advogados, afirma que a empresa não pode cobrar do estagiário capacidades profissionais para atender as competências de um funcionário pleno.

“A empresa não pode esperar ou cobrar do estagiário a capacidade e responsabilidade de um profissional pleno, pois vai contra o intuito do estágio.”

QUEM É RESPONSÁVEL PELA DOCUMENTAÇÃO: O ESTAGIÁRIO OU A EMPRESA?

O contrato de estágio deve ser elaborado pela empresa, porém, a documentação comprobatória de matrícula e frequência na instituição de ensino, bem como os documentos pessoais são de responsabilidade do estagiário.

A empresa deve orientar o estagiário sobre o procedimento a ser realizado com o contrato assinado e, se necessário, fornecer uma via para entrega na instituição de ensino.

COMO FUNCIONA A REMUNERAÇÃO E BENEFÍCIOS PARA ESTAGIÁRIOS?

Antes de mais nada, o estagiário não recebe salário nem tem direito a benefícios. Algumas vagas da modalidade podem oferecer uma bolsa-auxílio pelas funções desempenhadas. Vale-transporte é obrigatório.

Mattos afirma que a Lei do Estágio não estabelece um teto mínimo para a bolsa-auxílio oferecida por empresas ou tipos de benefícios.

“A lei determina que vale-transporte, férias remuneradas e seguro contra acidentes pessoais é obrigatório, mas os demais benefícios se tornam opcionais, uma vez que a ausência não desvirtua o intuito da lei. Empresas acabam usando benefícios para aumentar sua atratividade para potenciais profissionais em formação.”

POR QUANTO TEMPO UM ESTAGIÁRIO PODE FICAR NA EMPRESA?

O sonho de todo estagiário é ser efetivado, no entanto, a Lei de Estágio determina que o estudante poderá estagiar em uma empresa por, no máximo, dois anos —exceto quando se tratar de estagiário portador de deficiência, cujo prazo-limite não precisa ser aplicado.

Passado esse prazo, caso a empresa julgue que o estagiário teve um bom desempenho, pode optar por continuar a prestação de serviços, através do vínculo regido pela CLT.

Mattos diz que o limite é feito para garantir que o estagiário possa ter diversas experiências durante seu período como estudante.

“O limite é feito para garantir que o estagiário possa ir atrás de várias empresas para se aperfeiçoar, ganhar experiência e possa se desenvolver para melhor se adequar ao mercado.”

COMO FUNCIONAM OS HORÁRIOS DE TRABALHO PARA UM ESTAGIÁRIO?

A carga horária de um estágio é estabelecida por lei e deve ser de quatro a seis horas diárias. O limite de horas é feito como forma de garantir que as funções desempenhadas na empresa não interfiram nos estudos.

Mattos afirma que o ideal em casos que excedam o horário definido por lei é a empresa compensar as horas a mais para não desvirtuar a natureza do vínculo.

“Se for normalizado o excedente de horas trabalhadas fora do horário de estágio, a empresa corre o risco de ser multada pela fiscalização e dá abertura para que o estagiário possa judicializar a questão, alegando exercício pleno das funções, convertendo o estágio em um emprego real.”

De acordo com ele, a cobrança retroativa de horas extras e benefícios trabalhistas sob vínculo de estágio estão entre as demandas mais comuns na Justiça.

Em relação ao trabalho aos finais de semana ou em horários extremos, como de madrugada, Mattos recomenda que as empresas evitem, por desvirtuar a natureza da lei e abre brecha para que o estagiário alegue vínculo real de emprego.

“O estágio é para ser uma extensão da instituição de ensino, horários malucos podem ferir o espírito da legislação e atrapalhar a formação do estudante. No entanto, não há proibição na lei.”

A empresa é obrigada a liberar ou se adaptar aos horários do estagiário para que a formação dele não seja atrapalhada, como, por exemplo, reduzir sua carga horária em semana de provas.

PATRICK FUENTES / Folhapress

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